Os trabalhadores do Centro Dramático de Évora (Cendrev) entram em suspensão laboral, a partir desta quarta-feira, para poderem recorrer ao subsídio de desemprego, com a companhia a responsabilizar o Governo pela situação devido à falta de financiamento.

O Cendrev “não tem dinheiro”, afirmou esta terça-feira à agência Lusa o diretor artístico da companhia teatral, José Russo, anunciando que “os trabalhadores não são despedidos”, mas “a única hipótese é entrarem em suspensão laboral devido à impossibilidade do pagamento de salários”.

“Até aqui fomos tendo algum dinheiro para suportar um quadro de lay-off, mas a partir de julho já não vamos conseguir fazer isso. Os trabalhadores entram em suspensão, que é uma figura legal que permite que recorram ao subsídio de desemprego, porque não há outra forma de ter dinheiro para comprar o pão e pagar a renda da casa”, disse.

Segundo José Russo, o Cendrev paga atualmente “nove salários mensais” e está a receber, além de algum apoio da Câmara de Évora, “pouco mais de 130 mil euros por ano” de financiamento do Ministério da Cultura, o que contrasta com a realidade de “há uns 10 ou 12 anos”.

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Na altura, “antes da crise, recebíamos 350 mil euros de apoio da Direção-Geral das Artes para a nossa atividade, assim como o dinheiro da câmara, e tínhamos uma estrutura com 22 trabalhadores, entre atores, técnicos e administrativos”, comparou.

As dificuldades que a companhia profissional de teatro enfrenta atualmente, não obstante o “quadro de redução de financiamento que se tem verificado nos últimos anos”, decorrem do último concurso de apoio às artes, realizado no final do ano passado e relativo a ajudas para este ano e para 2021.

A candidatura do Cendrev, que rondou os 400 mil euros (cerca de 200 mil euros para cada ano), foi “considerada elegível pelo júri”, mas, tal como aconteceu com as candidaturas de outras estruturas culturais do país, “ficou fora do financiamento, porque o dinheiro foi insuficiente para apoiar todos os projetos”, criticou José Russo.

Desde então, já este ano, têm sido mantidas reuniões com a ministra da Cultura, Graça Fonseca, mas o financiamento ainda não chegou, afirmou o diretor artístico.

“A ministra já disse que este tipo de projetos como o do Cendrev, estruturantes para os territórios onde se inserem e que têm a porta aberta o ano todo”, porque no caso a companhia alentejana gere o Teatro Garcia de Resende, “não são para acabar, mas como é que se resolve o problema? Essa é que é a questão. A solução nunca mais chega”, lamentou.

E este tempo de espera “é incompatível com a vida das pessoas, porque não se pode estar a viver, nem a trabalhar, desde janeiro até esta altura, sem financiamento. Se a ministra não tivesse salário vivia como”, questionou José Russo.

Os elementos do Cendrev “não querem” que a companhia “morra”, mas exigem respostas concretas do Governo: “Continua a não ser anunciado um momento para resolver o problema” da falta de financiamento e “há uma falta de assunção de responsabilidades de quem tem essa obrigação, que é o Governo”.

O Cendrev já entregou aos trabalhadores as cartas em que estabelece que, a partir desta quarta-feira, não tem condições para lhes pagar salários. O passo seguinte é tratarem do subsídio de desemprego junto da Autoridade para as Condições do Trabalho e da Segurança Social, para ver se “ainda o recebem este mês”, afirmou José Russo.

“O Cendrev tem um património muito superior a mim e a todas estas coisas e não o podemos delapidar num processo de fim da companhia. Temos que salvaguardar a ‘casa’ e a sua dignidade e a das muitas pessoas que por aqui passaram nestes 45 anos. Só nós podemos fazer isso. Não queremos que o Cendrev morra, mas, se acontecer, temos que morrer de pé, como as árvores”, argumentou.