Rui Rio é bastante claro na queixa que fez seguir para o Conselho de Jurisdição Nacional (CJN) do PSD e à qual o Observador teve acesso, com um texto rubricado pelo próprio que termina da seguinte forma: “Os deputados mencionados romperam os seus deveres com o Grupo Parlamentar, de forma e por ato de vontade expressamente afirmado“. Os deputados em causa são Margarida Balseiro Lopes, Alexandre Poço, Pedro Rodrigues, Pedro Pinto, Emídio Guerreiro, Álvaro Almeida e Rui Silva que, no dia 23 de julho, votaram contra a indicação da direção da bancada que impunha o fim dos debates quinzenais com o primeiro-ministro. A pena para estes deputados podia ir desde a advertência até à suspensão de eleger e ser eleito em cargos do partido durante dois anos, mas ao que o Observador apurou prevê-se uma derrota para as intenções do presidente do PSD: a maioria dos membros do organismo que funciona como o ‘tribunal’ do PSD é contra a aplicação de sanções aos deputados.

Desde logo, no último congresso do partido, Rui Rio não conseguiu ter uma maioria de apoiantes naquele órgão (venceu Paulo Colaço contra a lista oficial, liderada por Fernando Negrão ) e — mesmo entre aqueles que foram eleitos na lista do líder — há quem discorde que os deputados em causa sejam punidos. Uma dúvida que subsiste — já que para a maioria é claro que o desfecho não pode ser qualquer punição — é que alguns membros defendem que se deve arquivar o caso sem sequer ouvir os deputados (à luz do ponto 2 do artigo 12º do Regulamento de Disciplina) e outros ponderam abrir o processo para depois justificar devidamente o porquê dos deputados não serem punidos. Não há dúvidas que o processo pode morrer antes de nascer, já que esse ponto do artigo 12º dos estatutos diz o seguinte: “Cabe ao Conselho de Jurisdição competente decidir sobre a abertura do processo disciplinar.”

O presidente do Conselho de Jurisdição, Paulo Colaço, não se quis pronunciar sobre esse cenário, quer fazer a discussão internamente, mas acredita que, embora não seja “urgente”, essa decisão será tomada em breve, já que o caso não tem particular complexidade. O Observador sabe que um dos argumentos que leva a maioria dos membros da Jurisdição a darem razão aos deputados é o facto de o grupo parlamentar não ter sido ouvido. Segundo o regulamento interno do grupo parlamentar do PSD, aprovado em março na última reunião presencial da bancada (houve mais uma, mas foi via Zoom), “o sentido de voto nos projetos e propostas de lei (…) é definido pela Direção, ouvido o grupo parlamentar”.

Para tentar antecipar este problema, Rui Rio anexou à queixa que enviou ao Conselho de Jurisdição Nacional um email que foi enviado aos deputados em que ficou claro que a direção do Grupo Parlamentar do PSD — que assina o email — entende que esta “não é matéria que justifique a não aplicação da disciplina de voto“. Problema: nesse mesmo email vê-se que foi enviado no dia 23 de julho às 15h45, horas antes da votação, e sem que a bancada tenha reunido. Assim, pode a Jurisdição considerar que não foi “ouvido o grupo parlamentar”, como diz o regulamento interno.

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Sobre o assunto, Rui Rio disse esta quarta-feira que comunicou a decisão à Jurisdição e que tem “uma opinião pessoal”, mas não a revela “publicamente, até porque isso significava quase estar a dizer ao Conselho de Jurisdição Nacional o que devia fazer. Isso não posso fazer nem devo”.

A pena máxima que o Conselho de Jurisdição Nacional do partido pode aplicar é a expulsão. No entanto, o desrespeito da disciplina de voto não está incluído nos atos que configuram uma “infração grave”. Assim, caso haja um volte-face e o processo avance mesmo, os deputados podem incorrer nas seguintes sanções, por ordem de gravidade: “advertência; repreensão; cessação de funções em órgãos do partido; suspensão do direito de eleger e de ser eleito, até dois anos; e suspensão do direito de eleger e de ser eleito, até dois anos, com cessação de funções em órgãos do partido”;

Deputado acusa Rio de “violência dirigista e autocrática”

A deputada e antiga líder da JSD, uma das visadas pela queixa de Rui Rio, disse esta quarta-feira à Rádio Observador que está “serena e tranquila” relativamente a este processo. O deputado Pedro Rodrigues, numa nota enviada aos jornalistas, utilizou o argumento de que a decisão “não foi precedida de discussão nem no Grupo Parlamentar, nem no Conselho Nacional do PSD”. Para o deputado do PSD, impor a disciplina de voto neste ponto é uma decisão “ilegítima”, “politicamente incompreensível” e contrária à tradição do PSD.

Para Pedro Rodrigues, o facto de não ter existido qualquer discussão interna sobre o tema, bem como a “imposição unilateral da disciplina de voto” e a “interposição de processos disciplinares” só “pode significar justamente a consciência da fragilidade da posição assumida pelo Presidente do PSD”.

Pedro Rodrigues diz que ao ignorar a invocação expressa que comunicou alegando razões de consciência significa, no seu entender uma “violência dirigista, autocrática e centralizada no diretório partidário, que não tem lugar num partido como o PSD“.