O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê uma forte recuperação em 2021 e 2022 para a economia global, o que traduz uma aceleração face à previsão anterior de outubro passado. A riqueza mundial deve crescer 6% este ano (mais 0,8 pontos percentuais) e 4,4% em 2022 (mais 0,2 pontos percentuais). O FMI diz que a recessão em 2020 foi 1,1% pontos percentuais inferior à esperada e realça a dimensão sem precedente dos estímulos e apoios postos em marcha pelos países e, sem os quais, admite, o colapso do ano passado poderia ter sido três vezes pior.

“Graças a uma política de resposta sem precedentes, a recessão provocada pela Covid-19 deverá provavelmente deixar menos cicatrizes do que a crise financeira global de 2008. “

Mas há também alertas para desafios “assustadores” que são a consequência das divergências na rapidez da recuperação entre países e o potenciais danos económicos persistentes. O organismo liderado por Kristalina Giorgieva conclui que os países emergentes e de baixo rendimento foram muito mais duramente atingidos.

Entre as economias desenvolvidas, os Estados Unidos poderão ultrapassar o nível pré-Covid já este ano, enquanto outros países dos mais ricos só deverão conseguir atingir esse patamar em 2022. Portugal está no clube dos que vão demorar mais tempo a recuperar. A dependência do turismo é um dos fatores que o FMI aponta como causa genérica para maiores perdas e recuperações mais lentas.

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Economia portuguesa caiu menos em 2020, mas vai crescer menos em 2021

Para Portugal, as previsões do Fundo apontam para um crescimento de 3,9% em 2021, em linha com a mais recente estimativa do Banco de Portugal. Em outubro e antes do segundo confinamento, a estimativa era muito mais otimista de 6,5%. Esta correção é explicada, em parte pela constatação de que a economia portuguesa caiu menos do que o esperado em 2020 — o FMI chegou a prever uma recessão de 10% para Portugal no ano passado, quando o PIB acabou por contrair 7,6%.

A estimativa para este ano coloca Portugal nas economias da zona euro que menos vão crescer em 2021, a par com a Alemanha, Holanda, Áustria e Grécia. O PIB da zona euro deve progredir 4,4% em 2021, mais puxado pelas retomas em países como a França (mais 5,8%), Espanha (6,4%) e Itália (4,2%), que foram também as economias mais penalizadas no ano passado, em particular devido ao efeito do primeiro confinamento. Para o próximo ano, o PIB português deverá acelerar 4,8%, uma previsão que se mantém face a outubro, e que será uma das subidas mais expressivas na zona euro, a par com a Irlanda, a Grécia e novamente Espanha.

Boletim económico. 4 riscos e uma ideia controversa

No desemprego, o FMI antecipa um aumento da taxa de 7,7% este ano para Portugal e uma redução para 7,3% em 2022, que é menos favorável que a previsão feita em outubro, mas apenas para o próximo ano.

O relatório Economic Outlook, divulgado esta terça-feira, reconhece que ainda existe uma grande incerteza sobre o percurso da pandemia, mas considera que é cada vez mais visível o caminho para sair desta crise de saúde e económica. As múltiplas vacinas podem reduzir a gravidade e o número de infeções. E em paralelo a adaptação à vida em tempos de pandemia permitiu à economia global comportar-se melhor do que era esperado, isto apesar dos constrangimentos à mobilidade, conduzindo a uma retoma mais forte do que antecipado. Os pacotes de apoio financeiro de alguns países, o destaque do FMI vai para o plano Biden, em cima de respostas orçamentais sem precedentes no ano passado contribuem para reforçar as perspetivas económicas.

Países mais pobres perderam quase o dobro dos mais ricos

Nas economias em desenvolvimento, a China lidera a recuperação, tendo já alcançado o patamar em 2020. Mas outros países só vão conseguir lá chegar em 2023. Esta assimetria vai aprofundar as diferenças entre modos de vida. As economias emergentes e em desenvolvimento (sem a China) sofreram uma quebra equivalente a 20% do PIB per capita de 2019, enquanto as economias mais avançadas essa quebra deverá ser de 11%.

Esta assimetria traduz-se num maior número de pessoas atiradas para a pobreza, 95 milhões na estimativa do FMI, invertendo a tendência até 2019. O Fundo destaca ainda que para as perdas médias para a economia global tenderão ser inferiores que as provocadas pela crise financeira d 2008 (2010/11 na zona euro), mas no rescaldo da Covid-19 países emergentes e com baixos rendimentos foram mais atingidos. A grande dependência de fatores como o turismo, mas também de matérias-primas cujos preços caíram de forma acentuada, contribuíram para este cenário. Tal como a falta de capacidade financeira dos Estados para mitigar os efeitos negativos da pandemia.

Estas divergências verificam-se até dentro de países, onde há grupos sociais e etários muito mais afetados: os jovens trabalhadores e os não qualificados, porque foi nos setores que mais empregam estas pessoas que a pandemia teve mais impacto: restauração, turismo, serviços. Por outro lado, o FMI avisa que devido à aceleração da digitalização muitos empregos que desapareceram não vão voltar, o que exigirá um grande esforço de requalificação.

Outro aspeto em que esta crise “é única” passa pela constatação de que em muitos países, as políticas de apoio e a falta de oportunidades de consumo resultaram a um aumento significativo dos níveis de poupança que podem ser libertadas muito rapidamente se a incerteza desaparecer. Mas, ao mesmo tempo, não é claro quantas dessas poupanças serão gastas, dada a degradação financeira de muitas empresas e famílias, e com o impacto do fim das moratórias de crédito que em Portugal terminaram no final de março.

Um “fato à medida” para responder aos desafios da saúde, sem puxar o travão à retoma

Para o FMI, a solidez da retoma vai depender da eficácia da vacinação e da emergência e alastramento de variantes do vírus que ponham em causa a primeira. Para evitar retomas divergentes, a primeira prioridade é resolver a crise de saúde pública em todo o lado, defende o Fundo. Aos governos e às políticas económicas cabe e missão de conter os danos e preparar as economias para a recuperação. O FMI diz que vai ser necessária uma abordagem de fato à medida, com políticas bem calibradas ao estado da pandemia e que permitam ao mesmo tempo suportar a recuperação económica e social.

Para além da prioridade que deve continuar a ser dada aos gastos na saúde e na produção de vacinas, o Fundo alerta que as medidas de apoio em emprego devem ser desativadas de forma gradual à medida que o emprego normalize e para evitar quedas acentuadas. Deve ser dado um maior foco à formação e requalificação, associados a a apoios ao rendimento que permitam sustentar uma transição, e ao mesmo tempo que se incentiva a criação de emprego. A simplificação de procedimentos de falência e uma maior alocação de recursos para reverter as perdas na educação das crianças, são outras sugestões. Também a transição energética é também assinalada.

E uma palavra para as vacinas com o FMI a denunciar os riscos de um acesso profundamente desigual entre países riscos que tendo 16% da população compraram 50% das vacinas e do estrangulamento no acesso às doses necessárias.