O Governo da Madeira autorizou, este ano, o abate do pombo trocaz por caçadores, como medida de proteção dos terrenos agrícolas, onde a ave, endémica e com estatuto de espécie protegida, provoca danos muito elevados.

“Não é caça. É uma ação de correção”, disse à agência Lusa o presidente do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza (IFCN), Manuel Filipe, vincando que o processo é fiscalizado pelo corpo de Polícia Florestal e outras entidades oficias.

O responsável indicou que o objetivo é diminuir os danos causados pelo pombo trocaz na agricultura, pois os métodos de afugentamento disponibilizados aos agricultores têm-se mostrado “insuficientes”, resultando em prejuízos avultados nas culturas.

“Dentro do seu habitat natural, que é a floresta laurissilva [Património Mundial da Humanidade desde 1999], o pombo trocaz continua a ser preservado e não é permitido qualquer tipo de correção ou de abate”, disse Manuel Filipe.

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Os censos indicam que a população de pombo trocaz na laurissilva se situa entre 12.000 e 15.000 exemplares, mas, devido ao estatuto de espécie protegida, extravasou o habitat natural e ocorre agora por toda a ilha da Madeira, nomeadamente em áreas agrícolas próximas da floresta.

“As ações de correção decorrem em vários concelhos e freguesias, onde há registo de danos provocados pelo pombo trocaz, mas não todas ao mesmo tempo”, explicou Manuel Filipe, reforçando que o processo tem “enquadramento legal” e é fiscalizado pelas autoridades regionais, sob coordenação do IFCN, organismo tutelado pela Secretaria Regional de Ambiente, Recursos Naturais e Alterações Climáticas.

“No orçamento da região [para 2021], foi introduzida uma norma que permite e habilita os caçadores a participarem nestas ações de correção”, esclareceu, referindo que o abate da ave está autorizado desde 2012, mas foi efetuado, até agora, exclusivamente pela Polícia Florestal.

De acordo com o IFCN, a espécie é monitorizada e avaliada desde 1996 e atualmente mantém-se “estável”, mas verifica-se o alargamento da área de distribuição, ocorrendo em toda a ilha, o que constitui uma ameaça para os campos agrícolas.

Para minimizar os prejuízos, o Governo Regional facultou aos agricultores três tipos de dispositivos – espanta-pássaros a gás, redes de exclusão e fitas holográficas -, mas revelaram-se insuficientes e, por isso, foi autorizado o abate também por caçadores.

A situação motivou já a intervenção do grupo parlamentar do PAN – Pessoas – Animais – Natureza, na Assembleia da República, que questionou o executivo madeirense, de coligação PSD/CDS-PP, sob as licenças emitidas para a caça do pombo trocaz.

“O PAN considera incompreensível e inaceitável que sejam concedidas licenças especiais para permitir o abate desta espécie por caçadores, quando existem outras soluções alternativas para evitar e minimizar os estragos em produção agrícola”, refere o partido em comunicado, divulgado na quinta-feira.

Por isso, endereçou várias questões ao executivo regional, com vista a apurar, por exemplo, o número total de animais que serão abatidos, os fundamentos da decisão e os locais onde decorrem as ações.

O presidente do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza disse, no entanto, que até sexta-feira não tinha recebido qualquer missiva do PAN, mas vincou que o processo decorre mediante enquadramento legal e com a devida fiscalização.

Em 1986, o pombo trocaz foi considerado “espécie vulnerável” pela IUCN – International Union for Conservation of Nature and Natural Resources e incluído na Diretiva Aves da comunidade europeia, passando a ser proibida a sua caça, que era praticada desde o início da colonização, no século XV.

Em 2009, a espécie passou a “não ameaçada”, mantendo o estatuto de “protegida”, momento a partir do qual cresceu e ultrapassou os limites da floresta laurissilva (cerca de 1/5 da área da Madeira).

É um animal corpulento e de hábitos gregários, sendo uma das três espécies endémicas de pombo da Macaronésia, região que agrupa os arquipélagos da Madeira, Açores, Canárias e Cabo Verde.