Milhares de pessoas manifestaram-se este sábado em Luanda, em defesa do Estado democrático, gritando “fora” ao MPLA, partido no poder desde a independência de Angola, há quase meio século, e defendendo o líder da UNITA deposto, Adalberto da Costa Júnior.

A manifestação juntou militantes do principal partido da oposição UNITA, do movimento PRA JA Servir Angola e do Bloco Democrático, agora congregados na Frente Patriótica Unida, uma plataforma ‘ad hoc’ que pretende derrotar o MPLA nas eleições prevista para 2022, e ativistas de movimentos sociais e membros da sociedade civil.

Cerca das 12:00, no cemitério de Santa Ana, local marcado para a concentração antes do início da marcha, que seguiu depois em direção ao Largo 1.º de Maio, o número de pessoas ainda era escasso, com pouco mais de uma centena de jovens a congregarem-se no local, onde o ambiente já era festivo devido à música hip hop que saia dos altifalantes do carro onde seguiram os organizadores do protesto.

Ali, enquanto se organizavam para o desfile, apoiantes de Adalberto da Costa Júnior (ACJ), o líder da UNITA eleito no XIII Congresso e destituído na semana passada por força de uma decisão do Tribunal Constitucional que anulou o ato, gritavam “Samakuva fora”, aludindo ao antigo presidente, que recuperou agora o seu lugar depois do afastamento de ACJ da liderança do partido do Galo Negro.

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Ginga Savimbi, uma das filhas do fundador do partido, Jonas Savimbi, era uma das participantes, afirmando estar ali “para apoiar os jovens e em defesa de ACJ”, garantindo que este será a sua escolha mesmo que apareçam mais candidatos para disputar a presidência no próximo congresso, ainda por agendar.

Sobre a decisão do TC considerou que este “é mais um dos órgãos do Estado que trabalha para um partido político que não tem leis justas”.

Já o ativista Hitler Samussuku, que também participou do protesto “em nome do Estado democrático e de direito” , lamentou que João Lourenço, o Presidente angolano, “esteja a capturar o TC para detonar os seus adversários políticos”, afirmando estar também solidário com a Frente Patriótica Unida.

Sublinhou que mais do que apoiar a UNITA, “o que está em causa é o interesse nacional” e, por isso, as organizações da sociedade civil e simpatizantes dos partidos decidiram “abraçar esta luta”, lamentando que “os juízes do TC sejam juízes do MPLA” que decidiram criar um acórdão político.

O militante da UNITA Carlos Jacinto ,que disse participar como cidadão neste protesto, considerou que “o MPLA só está a demonstrar que quer implantar uma monarquia em Angola” e quis alertar os angolanos “para o grande perigo do MPLA” no país, manifestando também apoio a ACJ.

Com cartazes improvisados, onde se liam dizeres como “MPLA, já não queremos mais” e “João viaja deixa o ACJ em paz”, os jovens iam também gritando “Adalberto Presidente”, num protesto marcado mais pelo conteúdo político, motivado pelo aproximar das eleições gerais e pelo afastamento de Costa Júnior, do que pelas reivindicações sociais.

Pelo local, circulavam também zungueiras e vendedores ambulantes na tentativa de fazer algum negócio, vendendo comida e água aos jovens.

A marcha, que saiu pontualmente às 13:00, em direção ao 1.º de Maio foi engrossando à medida que o desfile ia avançado em direção à cidade, cuidadosamente vigiado pela polícia, cautelosa a controlar os jovens, numa manifestação que decorreu de forma pacífica, apesar de alguns incidentes e tentativas de provocação de manifestantes mais exaltados que os organizadores da marcha, a partir do carro que acompanhou o desfile tentaram também acalmar.

Os manifestantes demoraram cerca de uma hora a fazer o percurso até ao Largo 1 de Maio, entoando palavras de ordem como “MPLA, fora” e “Adalberto, amigo, o povo está contigo”, seguindo animadamente até à paragem final, também conhecida como Largo da Independência e onde se encontra uma monumental estátua do primeiro presidente angolano, Agostinho Neto.

Aí, os manifestantes foram-se distribuindo pela praça que foi circundada por polícias para impedir os jovens mais exaltados de prosseguir o protesto fora do local marcado.

No Largo, o jovem Bento de 24 anos , que afirmou não ter filiação partidária, declarou-se “muito maçado com o MPLA”, o partido “dos bruxos e dos feiticeiros”, queixando-se da falta de emprego para os jovens e do elevado custo dos bens alimentares

“Que país é esse? Nós somos angolanos! Esse país não é do MPLA, é do povo angolano, que está a sofrer. Os nossos irmãos estão a recolher comida nas lixeiras e nos contentores. João Lourenço fora!”, indignou-se.

Tá Nice Neutro, outro dos jovens que foram à marcha, transformou o seu protesto numa música de intervenção.

“Próximo ano, MPLA na oposição e UNITA no poder/em 2022 vão gostar/Da vitória de um outro partido/porque ninguém mais acredita no MPLA/só tem homem bandido/desde 1975 que roubam toda a riqueza de um povo humilde/ muitos angolanos morreram por falar a verdade/xee, xee, xee, MPLA caiu”, disparou em tom de ‘rapper’, fortemente aplaudido pelos jovens que o rodearem.

No largo, o protesto foi dando lugar a um comício, sucedendo-se as intervenções dos organizadores da marcha, num cenário tranquilo apesar do apelo de alguns jovens mais rebeldes para prosseguirem a marcha em direção ao Palácio presidencial.