Começou com diligências que não conheceram qualquer nome mas que envolveriam 62 jogadores, alguns dos quais comprados e vendidos pela Juventus, e eram descritas pelo Il Tempo como “um novo terramoto no futebol”. Continuou com a operação Prima, um processo que visava diretamente os bianconeri e que motivou a apreensão de centenas de documentos relativos também a contratações e alienações de passes que podiam ter visado a criação de falsas mais valias para equilibrar demonstrações financeiras. Conheceu um capítulo novo esta sexta-feira, com mais buscas nas instalações da Vecchia Signora com o objetivo de chegar a mais uma série de contratos feitos no último triénio e que envolvem também Cristiano Ronaldo.

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Como explica a Reuters esta manhã, os promotores italianos ordenaram novas buscas ainda no âmbito da investigação que já se encontrava em curso e um dos contratos agora visados é o da venda do número 7 ao Manchester United no último verão, quase a fechar a janela de transferências. Mais uma vez, existem suspeitas por parte das autoridades de prestação de falsas comunicações ao mercado e aos acionistas e de emissão de faturas inexistentes no sentido de “maquilhar” resultados financeiros. Ao mesmo órgão, a Juventus confirmou as buscas e garantiu que está a colaborar em pleno com as autoridades. Nesse sentido, também o avançado português e o empresário Jorge Mendes podem ser ouvidos no âmbito do processo.

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De recordar que, no final de agosto, a Juventus comunicou um acordo para a transferência a título definitivo do capitão da Seleção para o Manchester United por 15 milhões de euros, “a pagar em cinco exercícios, que podem ser aumentados num montante não superior a oito milhões de euros, mediante o cumprimento de objetivos desportivos específicos”. “A operação vai gerar um impacto económico negativo no exercício de 2020/21 de 14 milhões de euros”, acrescentou ainda a mesma missiva lançada na altura.

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Puxando o filme atrás, as primeiras movimentações das autoridades em torno do futebol italiano tiveram início no final de outubro, visando algo que começa também a ser feito em Portugal: a “troca” de jogadores sob forma de compra e venda pelos mesmos valores, sem que assim exista propriamente dinheiro a circular. Como escreveram várias publicações transalpinas, a Comissão de Fiscalização dos Clubes de Futebol enviou para o procurador federal da Federação Italiana de Futebol, Giuseppe Chiné, um total de 62 transferências de jogadores entre 2019 e 2021 que envolveram valores altos, “ou muito altos”, mas que na verdade não movimentaram sequer um euro. Razão? De acordo com o órgão de fiscalização que acompanha as contas, esses mesmos negócios têm um impacto significativo nos exercícios das sociedades. “Está a denunciar algo sistémico”, destaca o relatório a Consob (equivalente à CMVM).

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Dentro dessa comunicação constava um anexo com a súmula dos principais exemplos desse novo “modelo financeiro” que tem gerado dúvidas pelos números significativos que movimenta sem uma aparente razão desportiva que assim justifique. A Juventus era um dos clubes mais citados no documento, com 21 jogadores trocados por 90 milhões que na verdade fizeram mexer pouco mais de três milhões de euros. Exemplos? A chegada do médio Arthur do Barcelona e a ida de Pjanic para a Catalunha ou a saída do português João Cancelo para o Manchester City, com a viagem de Danilo e Félix Correia para Turim.

Na semana passada, conforme escreveu a agência de notícias italiana ANSA, as autoridades fizeram buscas nas instalações da Juventus, em Turim e em Milão, estando em causa as tais compras e vendas de jogadores e as mais-valias geradas a partir dos direitos, tendo dedicado particular atenção às demonstrações financeiras dos último triénio. Segundo a agência, existiam seis suspeitos de irregularidades, entre os quais o presidente da Vecchia Signora, Andrea Agnelli; o vice-presidente para o futebol, Pavel Nedved; o antigo diretor desportivo, Fábio Paratici, agora no Tottenham; e três profissionais responsáveis pelas finanças.

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“As atividades destinam-se a apurar a hipótese da existência de crime de falsa comunicação das sociedades cotadas e emissão de faturas por transações inexistentes, dirigidas à direção [da Juventus] e aos dirigentes das áreas de gestão empresarial, financeira e desportiva”, referiu uma nota do procurador de Turim. Dentro das 42 transações em causa, que movimentaram 282 milhões de euros, estava também o contrato de Ronaldo quando chegou a Itália e, soube-se depois, um outro vínculo feito no primeiro confinamento, que terá sido procurado sem sucesso depois de uma escuta telefónica intercetada entre Federico Cherubini, diretor geral do clube, Cesare Gabasio, advogada da Juventus, que falava num documento “que nunca devia ter existido” (e que também não terá sido encontrado quando as autoridades fizeram as buscas iniciais).

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Nessa altura, no primeiro semestre de 2020, o plantel da Juventus chegou a acordo com a administração no sentido de equilibrar as contas numa fase de confinamento e sem receitas, abdicando dos ordenados de março, abril, maio e junho. No entanto, como escreveu o Corriere dello Sport, as autoridades suspeitam de um contrato paralelo feito nessa altura entre o clube e Ronaldo onde a Vecchia Signora se comprometia a pagar 10,3 milhões de euros limpos quando o futebol voltasse, valor equivalente aos quatro meses de salário em causa. A Gazzetta dello Sport escreveu esta quinta-feira que o Ministério Público de Turim admitia chamar o português no âmbito da investigação para saber mais sobre esse acordo.