O interior da múmia do faraó Amenhotep I — aquela que os egiptólogos mais receavam abrir pelo risco de a danificar — foi finalmente analisado. As ligaduras, contudo, não foram retiradas.

Para tal, os egiptólogos serviram-se de tomografias tridimensionais por computador para tentar perceber qual o verdadeiro aspeto do faraó dentro das ligaduras.

Perfeitamente enfaixada, decorada com grinaldas de flores e com uma máscara pintada a cobrir a sua própria face, os cientistas optaram por preservar a múmia tal como a encontraram, explica um comunicado divulgado na revista cientícica Frontiers in Medicine,

O facto de a múmia de Amenhotep nunca ter sido desenfaixada na idade moderna é para nós uma oportunidade única: não apenas para estudar como tinha sido originalmente mumificado e enterrado, mas também o modo como foi tratado e enterrado novamente, séculos depois da sua morte”, explicou a Dra. Sahar Saleem, professora de radiologia na Faculdade de Medicina do Cairo e autora do estudo.

A múmia já tinha já sido aberta uma vez (mais de quatro séculos após a morte do rei egípcio) na 21.ª dinastia – entre 1070 A.C. e 945 A.C. – quando sacerdotes egípcios abriram o túmulo e realizaram “operações de recuperação” do corpo de Amenhotep I. Além disso este já tinha sido alvo de ladrões de túmulos.

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Amenhotep I, de acordo com as imagens criadas pela equipa de investigação, teria, na altura da sua morte, aproximadamente 35 anos, 1,69 metros de altura, era circuncidado e tinha uma dentição em bom estado. O antigo rei egípcio foi enterrado com 30 amuletos e um cinto de ouro adornado com contas, também elas de ouro.

O cinto teria uma “função mística”, e cada um dos amuletos “teria uma função específica para ajudar o rei na vida pós-morte”, explicou à revista Live Science o egiptólogo Zahi Hawass, coautor do estudo.

“Não conseguimos encontrar nenhuma ferida ou desfiguração relacionada com a causa de morte, exceto várias mutilações realizadas post mortem, potencialmente por ladrões de túmulos. As entranhas tinham sido retiradas na altura da mumificação, mas não o seu cérebro e o coração”, informou ainda Sahar Saleem.

A múmia de Amenhotep foi descoberta em 1881 em Tebas (atual Luxor) entre outros faraós mumificados. Filho do rei Ahmose I, o faraó agora estudado reinou entre 1525 e 1504 A.C., na 18.ª dinastia, que coincidiu com um período de paz no Egito.  Por este motivo, Amenhotep pôde desenvolver a construção de diversos templos, e realizar excursões militares às regiões que correspondem atualmente à Líbia e ao norte do Sudão.

A radiologista da Universidade do Egito e o egiptólogo pensavam que o restauro de Amenhotep servira para reaproveitar objetos de valor para adornar outras múmias de faraós mais recentes, mas o atual estudo, publicado na terça-feira na revista Frontiers In Medicine, deitou por terra a anterior teoria dos dois cientistas.

Observámos que, pelo menos para Amenhotep I, os sacerdotes da 21.ª dinastia repararam amavelmente os ferimentos causados pelos ladrões de túmulos, restaurando a múmia e atribuindo-lhe a sua antiga glória, e preservaram a joalharia e os amuletos que o faraó já tinha”, explicou Saleem.

O estado de preservação da múmia de Amenhotep I é de facto, segundo o The Guardian, algo de invulgar quando comparado com outros faraós encontrados até à data.

A boa preservação da dentição do antigo rei é, de acordo com Saleem, a prova de quão “espetacular” o processo de mumificação era. “Os corpos mumificados estavam bem preservados. Até os minúsculos ossos do ouvido estavam preservados. Não há dúvida de que os dentes de Amenhotep estavam em muito bom estado. Muitas múmias de faraós tinham má dentição, mas neste caso tinha dentes muito bons.”

Ao contrário das múmias de outros faraós famosos, como Tutankhamun ou Ramsés II, o cérebro de Amenhotep manteve-se intacto dentro das ligaduras, e foi ainda descoberta uma vespa totalmente preservada no caixão do faraó.