Cabo Verde faz mea-culpa pela degradação do Forte de São Veríssimo, que defendia de piratas a Cidade Velha, mas garante a sua reabilitação já este ano para integrar o circuito turístico do património mundial cabo-verdiano.

“Hoje encontra-se num estado de degradação extremamente avançado, de total abandono das estruturas, aqui assumimos a quota-parte”, afirmou à Lusa o presidente do Instituto do Património Cultural (IPC) de Cabo Verde, Jair Fernandes, para a contextualização histórica e análise à situação atual do Forte de São Veríssimo, à entrada da Cidade Velha, mas que passa praticamente despercebido aos visitantes.

Apesar de estar a menos de 10 metros da estrada principal, não tem acesso de carro, e para lá se chegar é preciso passar por quintais de pelo menos duas casas.

Ao chegar ao forte a vista é deslumbrante sobre toda a baía da Cidade Velha, mas, por outro lado, o cenário é desolador, pois o monumento está em ruínas, com muros caídos, entulhos por todo o lado, currais de animais (porcos e galinhas) e os canhões espalhados por vários sítios, inclusive no mar.

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Mas nem sempre foi assim. O Forte de São Veríssimo foi construído possivelmente nos finais do século XVI (1590) e terá sido inicialmente uma plataforma de tiro, sendo uma das várias estruturas de defesa dos constantes ataques dos piratas à Cidade Velha.

Segundo Jair Fernandes, fez parte do conjunto classificado património nacional e património mundial, em 2009, mas na altura não houve investimento para a sua reabilitação tal como aconteceu, por exemplo, com a Fortaleza Real de São Filipe e a Igreja Nossa Senhora do Rosário.

Em 2010, foi alvo de uma campanha de limpeza e prospeção arqueológica, desenvolvido em contexto formativo, financiado pela cooperação espanhola, em parceria com o IPC, mas este trabalho de reabilitação não foi concluído devido à falta de recursos financeiros, o que contribui para a sua continuada degradação.

Entretanto, surgiu uma “luz ao fundo do túnel”, com o IPC a candidatar e a conseguir um financiamento de 15 mil dólares (13,2 mil euros) do Fundo Mundial para o Património Africano para um projeto de reabilitação e recuperação, que tem um custo total de 30 mil euros.

O Fundo Mundial para o Património Africano (AWHF) é uma organização intergovernamental criada em 2006 para apoiar a conservação e proteção efetiva do património cultural e natural de excecional valor universal em África.

O financiamento internacional já foi aprovado, mas só será disponibilizado a partir de maio, segundo o presidente do IPC, garantindo que o Governo cabo-verdiano vai entrar com a outra parte, para as obras arrancarem já em janeiro.

Numa primeira fase, avançou o líder institucional, vai ser feita uma limpeza exaustiva do local, acompanhada da prospeção e de uma intervenção arqueológica profunda no interior e ao redor.

“Depois passaremos à conservação das ruínas, com intervenção e um projeto de musealização in sitio“, delineou, avançando que, após ser reabilitado, o forte poderá ser um espaço de lazer e de contemplação, passando a integrar o circuito turístico da Cidade Velha.

Também poderá ser instalado um bar ou restaurante no local, daí Jair Fernandes aventar a possibilidade de se avançar com uma parceria público-privada, dada a localização sobre a baía e a mais-valia que se quer dar ao monumento.

Mas para todo este projeto avançar, há que sensibilizar e resolver algum conflito com os moradores, embora a mesma fonte considere que a comunidade já compreendeu a mais-valia do turismo no centro classificado património mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) em 2009.

“O único aspeto que tem a ver com a cedência de parte a parte é sobretudo em quesitos não só de saúde pública, mas também para guarda ou resguardo dos animais que aqui coabitam com o monumento. Daí a envolvência da câmara municipal neste projeto é extremamente fundamental”, apontou.

E precisamente a Câmara Municipal da Ribeira Grande de Santiago tem em curso a requalificação da orla marítima, que começou na baía da Cidade Velha e vai até ao Forte de Santo António, que também está à entrada da cidade.

Segundo o IPC, a reabilitação e recuperação do Forte de São Veríssimo deverá estar concluída em fevereiro de 2023 e enquadra-se no Eixo II, Desenvolvimento Urbano: Conservação e Valorização da Paisagem Urbana Histórica do Plano de Gestão da Cidade Velha 2019/2022.

Além disso, Jair Fernandes avançou que o IPC tem mais projetos em carteira para arrancar este mês, nomeadamente a musealização das ruínas de Nossa Senhora da Conceição, financiada pelo instituto Camões, em 15 mil euros, mas também formações em empreendedorismo jovem e sobre património, financiadas pela UNESCO, através do Japão.

O dirigente avançou ainda à Lusa que o IPC já está em negociações com o Banco Mundial para um financiamento para uma requalificação mais profunda de toda a cidade e das áreas limítrofes, o que vai melhorar as condições de vida das comunidades locais, de forma direta e indireta.

Depois da paralisação mundial e nacional por causa da pandemia de Covid-19, o presidente do IPC notou que já há uma retoma do turismo na Cidade Velha, com números ainda a serem trabalhados, mas garantiu que serão muito melhores do que em 2020.