Um golo de Ricardinho, outro golo de André Coelho, uma vantagem confortável de 2-0 ao intervalo. Era este o filme de Portugal nos oitavos do último Mundial, após uma fase de grupos onde empatou diante de Marrocos como um aviso para as dificuldades que iria encontrar. No entanto, a Sérvia conseguiu reagir. E reagiu tanto que esse encontro teve mesmo de ir para prolongamento, com triunfo nacional por 4-3 a dar balanço para a conquista inédita da prova após vitórias contra três das melhores seleções da atualidade, Espanha, Cazaquistão e Argentina. Agora, como explicava Pany Varela ao Observador, era tempo de “fazer um reset“, não só por Portugal ser uma espécie de alvo número 1 de todas as equipas mas também pela competitividade que entroncava neste Europeu onde cada jogo era quase como uma “final”.

“Sabemos as ambições que temos, sabemos que é perfeitamente legítimo aspirar a tocar o céu de novo mas também sabemos a dificuldade que é vencer o Europeu. Estamos focados no trabalho que temos de fazer para voltar a sentir o que sentimos ainda muito recentemente. Vamos ver se conseguimos que não haja duas sem três. Existe a vantagem de, nos últimos seis meses, termos estado quase três meses juntos. A única desvantagem, mas que todos temos muita consciência, é tentar tirar os confettis da cabeça”, tinha comentado o selecionador Jorge Braz na antecâmara da prova que se ia realizar nos Países Baixos.

“As expectativas são elevadas e legítimas mas também estamos muito conscientes do que temos de fazer para voltar a sentir o que já sentimos no passado. Parece-me que este Campeonato da Europa vai ser extremamente equilibrado. Pelo nível das seleções que aqui estão, não tenho dúvidas de que vai haver inúmeras surpresas. O nosso foco passa por perceber o que conseguimos fazer jogo a jogo com o objetivo de chegarmos à final da competição mas sabendo que será um percurso duro e extremamente difícil. Vamos ter muito trabalho pela frente”, vaticinou. E esse trabalho começava logo frente à Sérvia, em Amesterdão.

“A Sérvia é uma seleção que sabe e quer competir, que olha sempre com possibilidade de vencer sempre. É das seleções mais fortes da Europa. Depois temos no grupo os Países Baixos, que têm a irreverência da rua e a motivação de jogar em casa, com enorme expetativa e entusiasmo. E a Ucrânia, que é de top europeu. A seguir aos candidatos, é a primeira que vem no ranking, seguida da Sérvia. Mas temos de olhar para nós, percebendo a dificuldade que vai ser vencer este grupo, mas esse é claramente o objetivo”, frisou.

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Olhando para fases finais de Europeus, houve um antes e um depois a partir de 2012. Até aí, Portugal nunca conseguiu ganhar o primeiro encontro, somando quatro empates (0-0 com a Bélgica em 1999, 3-3 com a Espanha em 2003, 0-0 com a Itália em 2007 e 5-5 com a Bielorrússia em 2010) e uma derrota (8-3 com a Itália em 2005) e alcançando apenas por uma vez o apuramento para a fase seguinte; a partir daí, só vitórias frente a Azerbaijão (4-1, 2012), Países Baixos (5-0, 2014), Eslovénia (6-2, 2016) e Roménia (4-1, 2018). Agora confirmou-se que não há quatro sem cinco e o triunfo voltou a surgir.

Pior entrada seria difícil. Quando nada o fazia prever, Pany Varela viu um passe longo intercetado junto à área portuguesa, André Sousa saiu da baliza e acabou por fazer falta sobre Rakic, com Prsic a aproveitar a grande penalidade para inaugurar o marcador com pouco mais de um minuto de jogo. O arranque tinha sido em falso mas nem por isso Portugal se desmontou no propósito que levava para o encontro, tendo dois remates perigosos por Erick e Bruno Coelho que ameaçaram o empate. No entanto, e na sequência de mais uma falha na saída de bola com um passe errado de Tomás Paçó, André Sousa ainda evitou por duas vezes o golo mas já não conseguiu chegar à terceira recarga, que permitiu a Prsisc bisar no jogo (7′). 

Jorge Braz parou de imediato o encontro. Portugal estava a cometer erros que não são habituais na saída com bola e não tinha a intensidade ofensiva necessária para ferir o adversário. A equipa reagiu, melhorou mas foi sobretudo com Zicky Té em campo, o único pivô na convocatória depois da lesão de Cardinal na semana passada, que se criaram as condições para a recuperação. Pauleta, no seguimento de uma boa zona de pressão alta que forçou o erro e deixou a bola em Miguel Ângelo, reduziu a desvantagem aos 11′ e Pany Varela, após um grande trabalho individual daquele que foi considerado o melhor jogador jovem de 2021, fez o empate a pouco menos de dois minutos do intervalo. A Seleção estava dentro do encontro.

Sempre que Zicky estava em campo Portugal conseguia outra profundidade que não tinha em 4:0 e deixava os sérvios em maiores dificuldades sem bola. No entanto, e em paralelo com isso, muitos minutos com o pivô também causariam um enorme desgaste físico perante a intensidade com que estava a ser disputado o encontro. Foi no misto das duas ambições que a Seleção partiu para a reviravolta: Afonso fez o 3-2 num lance em que Zicky foi determinante a segurar e a soltar para a assistência de Tiago Brito no tempo certo (26′); apenas 30 segundos depois, com a Sérvia a subir linhas, Afonso encontrou a entrada de Tomás Paçó descaído pela esquerda e o jovem jogador rematou cruzado para o 4-2 numa fase decisiva.

Portugal voltava à sua zona de conforto, com dois golos para gerir e a perceção que a própria Sérvia tinha quebrado em termos físicos com o desgaste a que foi sujeita durante a partida. Ainda foi necessária mais uma pausa técnica de Jorge Braz numa altura em que a equipa estava mais adormecida mas a vitória estava segura com essa particularidade de, no primeiro encontro da era pós Ricardinho, terem sido dois dos rostos mais jovens da Seleção a marcar na reviravolta e o mais novo de todos a ser decisivo em campo.