Paulo Moreira é arquiteto, está habituado a recuperar edifícios antigos no Porto, tendo no currículo vários projetos de reabilitação urbana e até um Prémio Távora, em 2012. Em 2017, quando procurava um novo ateliê no centro da cidade, deu de caras com os antigos armazéns farmacêuticos do Instituto Pasteur, abandonados há mais de 20 anos e situado em plena Rua dos Clérigos. “Encontrei este espaço nas traseiras de um prédio sem visibilidade para a rua, era maior do que eu precisava para o ateliê, então achei que valia a penar montar um projeto multidisciplinar de forma a poder interagir com a cidade e com outros profissionais”, começa por dizer ao Observador.

O desejo de trabalhar, discutir e aprender com pessoas dentro e fora da arquitetura era antigo e começou a ganhar forma com a descoberta deste espaço, cujo nome — Instituto — resolveu manter. O edifício foi assinado pelo arquiteto e engenheiro Júlio de Brito em 1955, autor de edifícios emblemáticos portuenses como o Teatro Rivoli, o Café Aviz ou a Confeitaria Ateneia, e divide-se entre um pátio-jardim, três salas com uma estrutura modular, um ateliê e um pequeno apartamento para acolher artistas em residência. Nele cabem exposições, oficinas, conversas, projeções, performances ou workshops inseridos numa programação cultural própria, que pode tocar áreas como o design, o vídeo, a fotografia ou até mesmo a moda, tendo sempre a arquitetura, o espaço e o território como elementos comuns.

Num espaço com 175 metros quadrados cabem salas polivalentes, um ateliê de arquitetura e uma residência artística (Foto: Ivo Tavares)

“A arquitetura é uma materialização do nosso contexto social, político e económico e aqui tentamos problematizar o que nos envolve. Interessa-nos escapar do espaço formal de uma instituição, não somos uma galeria, somos uma morada de portas abertas ao público e a ideias”, sublinha o fundador e o diretor artístico d’o Instituto, inaugurado em dezembro de 2018.

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Em cada ano surge uma nova programação, tendo sempre um tema diferente e como fio condutor a prática expandida da arquitetura e as suas relações interdisciplinares. “Tentamos explorar diversas perspetivas da arquitetura e a várias escalas, do projeto pequeno ao urbanismo, percebendo de que forma é que as pessoas ocupam esses espaços e como outros arquitetos desenvolvem esses lugares”, explica Raquel Pais, gestora de projeto e da programação artística.Além dos apoios da Câmara Municipal do Porto, através do programa In Residence, para residências artísticas, e do concurso anual Criatório, que garante o financiamento do espaço, o Instituto terá pela primeira vez este ano um apoio de 25 mil euros da Direção-Geral das Artes para programação. À exceção das oficinas, que carecem de um custo de inscrição que inclui todos os materiais, as restantes atividades do programa são gratuitas.

Um festival de cinema, intercâmbios e uma exposição que quer ditar a mudança

“Arquiteturas, Territórios, Comunidades” é o tema da programação do Instituto para este ano e arranca já este sábado com a exposição “Desviaduto”, que irá ocupar a Galeria Nuno Centeno com visitas guiadas e atividades de interação com o público, até 23 de abril. A mostra tem como caso de estudo o viaduto Gonçalo Cristóvão, no centro do Porto, partindo de um momento–chave na história da infraestrutura — o seu desabamento durante a construção, em 1962 — sendo resultado de um workshop que culminou em várias propostas que ditam soluções mais adequadas a nível social e ambiental.

“Este viaduto foi construído exclusivamente para veículos, leva exatamente ao mesmo ponto da rua e corta-a visualmente, numa imposição que já não faz sentido. Tornou-se obsoleto daquilo que deveriam ser hoje as premissas na criação de espaço urbanos e espaços verdes nas cidades. A exposição prova como esta infraestrutura pode ser reconvertida ou subtraída com projetos realistas, não utópicos, que permitem o início de um pensamento e de uma discussão que gostaríamos de fazer chegar à câmara municipal”, explica o arquiteto Paulo Moreira, acrescentando o futuro pode mesmo passar por uma ideia de subtração na arquitetura.

“Tenho trabalhado nos últimos anos em reabilitação e no dia a dia experimento muito essa prática da subtração em edifícios antigos, muitas vezes não é necessário acrescentar nada, mas retirar, separar as salas das cozinhas ou aumentar compartimentos que eram mais pequenos. Trazer essa ideia de subtração para a cidade é importante e faz-nos perceber que a reabilitação também pode ser feita dessa forma.”

Oficinas, debates, workshops, projeções ou performances são algumas das atividades desenvolvidas pelo Instituto (Foto: Ivo Tavares)

Uma das grandes novidades de 2022 é o Arquiteturas Filme Festival ser realizado pela primeira vez no Porto e ter o Instituto como anfitrião.Slow Down!” é o tema-chave desta edição e reflete sobre a ideia de ‘abrandamento’, ainda que isso implique demolir, reduzir, reutilizar, ou subtrair a arquitetura. O festival irá acontecer entre setembro e outubro em vários espaços da cidade e contará com uma programação própria, uma instituição convidada e uma competição, fruto da open call que abrirá em breve.

De 18 de março a 8 de abril, o Instituto recebe a exposição “Arquiteturas da Imagem / Imagens de Arquitetura”, com a curadoria do arquiteto Frederico Vicente. A partir de um arquivo de fotografias ilustrativas da produção nacional da arquitetura contemporânea, o trabalho junta fotógrafos profissionais e ‘instagrammers’ numa leitura global de como é transmitida a arquitetura aos mais leigos.

À boleia de uma parceria com a Suécia, a arquiteta Cassandra Lorca Macchiavelli é a primeira participante do programa de residência, cujo trabalho se centra numa abordagem crítica sobre a relação entre a arquitetura e os temas sociais dos nossos dias. A sua estadia será acompanhada por uma palestra e uma exposição, que poderá ser visitada até dia 1 de maio. Refletindo sobre os efeitos das alterações climáticas e da desflorestação na paisagem e na ocupação humana do território, Virgina de Diego apresenta em junho a exposição “Clear the Path”. A artista visual espanhola foca-se nas dunas da península Neringa, na Lituânia, desaparecidas debaixo do areal, cruzando a pesquisa e a documentação histórica com a cartografia ou o registo fotográfico.

O coletivo abre as portas a várias áreas da cultura e da arte urbana, tendo sempre o pensamento do espaço público como ponto de partida (Foto: Ivo Tavares)

No campo de continuidade, os ciclos de conversas “Quinzena”, “WIP [Work In Progress]” e “Expedition” regressam com novidades. Para discutir, expor e debater o trabalho, os discursos e os processos que se estão a produzir atualmente, o WIP é um ciclo de três sessões que têm como objetivo de reforçar redes e cruzar conhecimento entre espaços culturais de pequena e média dimensão, em Portugal e no estrangeiro, e reuni-los junto do público. Os convidados variam entre micro-projetos expositivos de ‘montra’, pequenas galerias ligadas a ateliês de arquitetura e espaços culturais de âmbito comunitário.

Já o ciclo “Expedition” vai centrar-se na história do edifício onde se localiza o Instituto e pela primeira vez irá além do formato de conferência, integrando dois passeios pelas margens urbanas do Porto e de Vila Nova de Gaia. A experiência será complementada por conversas e oficinas, num programa interdisciplinar propício à interação social e à captação de novos públicos.