A federação da indústria eléctrica europeia, Eurelectric, realizou um estudo para responder à questão que os detractores dos veículos eléctricos esgrimem com frequência, quando colocam em causa a capacidade de a rede eléctrica suportar um incremento brutal do número de veículos recarregáveis. Afinal, a infra-estrutura da rede europeia aguenta ou não aguenta o boom que é esperado? Segundo a Eurelectric, sim.

Como a própria organização sublinha, os desafios que se colocam pela frente nesta transição para a mobilidade 100% eléctrica são tremendos. Bastará recordar que circulam agora pelas estradas do Velho Continente apenas 3,3 milhões de veículos eléctricos – 1% do parque automóvel europeu, que contabilizava 326 milhões de veículos em 2020. Mas, a consultora Ernst & Young (EY) prevê que, no final desta década, o número de veículos eléctricos já terá passado a barreira dos 65 milhões, estimando-se que cinco anos depois, em 2035, duplique (130 milhões). Recorde-se que esse ano foi apontado pela União Europeia como aquele a partir do qual a venda de veículos novos equipados com motor de combustão deveria ser banida nos diferentes Estados-membros.

Europa quer acabar com carros novos a combustão em 2035

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Descrevendo a electrificação do transporte rodoviário como “uma megatendência irreversível”, o presidente da Eurelectric, Jean-Bernard Lévy, realça que o desafio que há pela frente é “acelerar a implantação da infra-estrutura de forma bem coordenada, para responder às crescentes necessidades de carregamento, garantindo o uso ideal da rede eléctrica”. Segundo o estudo, a boa notícia é que, mesmo com 130 milhões de EV a precisarem de ser recarregados, “a rede eléctrica permanecerá estável”. Ou seja, a infra-estrutura está preparada para abastecer de energia mais de 100 milhões de veículos. Para isso, há que ter carregadores em número suficiente: pelo menos 65 milhões, antecipa a EY.

A consultora estima que, até 2025, deverão existir na Europa 13 milhões de carregadores. Cinco anos depois, 32 milhões e, em 2035, os tais 65 milhões. À luz de hoje, esse número quase parece estapafúrdio face aos 374.000 pontos públicos de carga que existem actualmente na Europa. Sucede que, de acordo com a federação da indústria eléctrica europeia, para que a experiência de utilização de um veículo eléctrico funcione para todos, a maioria dos postos de carga terá de ser residencial. As previsões apontam que, dos tais 65 milhões de carregadores necessários em 2035, perto de 56 milhões deverão ser privados (85% para uso residencial). Os restantes dividir-se-ão, idealmente, entre a via pública (2,6 milhões, 4%), o local de trabalho (3,9 milhões, 6%) e pontos de destino (3,2 milhões).

Ainda assim, saltar de 374.000 carregadores públicos para cerca de 9 milhões é um incremento colossal, que requer tempo e dinheiro. A EY realça que a rede pública europeia de postos de carga cresceu 40% em 2021, o que a consultora diz ser “rápido, mas não o suficiente”. No relatório divulgado pela Eurelectric, é frisada a importância da infra-estrutura de carga acompanhar o crescimento dos eléctricos nas vendas, para o que é necessário resolver os “estrangulamentos” que actualmente atrasam a ampliação da rede. São apontados como problemas as limitações de financiamento, bem como as demoras no licenciamento ou a dificuldade de aceder a imóveis em locais estratégicos. Outra nota de alerta prende-se com a necessidade de avançar atempadamente com um planeamento que preveja futuros picos de solicitação da rede. Isto porque, “quando a penetração de veículos eléctricos atingir 50% numa rede urbana, o carregamento descontrolado pode levar a desvios de tensão e afectar a qualidade do fornecimento de energia”.

Além de deixar propostas para mitigar eventuais falhas da rede, quando o parque circulante eléctrico for maior, a Eurelectric deixa a conta a pagar. Conforme os cálculos da EY, para ter os 65 milhões de carregadores que serão necessários em 2035, há que investir 115 mil milhões de euros na infra-estrutura, factura essa que terá de ser dividida entre o público e os privados.

De referir ainda que a pesquisa concluiu que, em 2035, apenas 10 países europeus vão concentrar 70% dos pontos de carga. Portugal será um deles, juntamente com o Reino Unido, Alemanha, França, Itália, Países Baixos, Espanha, Suécia, Polónia e Dinamarca.