Uma brincadeira que nasceu do reaproveitamento das sobras de festas anteriores de Carnaval na ilha cabo-verdiana de São Vicente levou este mês a uma exposição de quase 30 bonecas fantasiadas, projeto que junta a inclusão e oito artesãos.

Tudo começou há alguns anos com os meus amigos, pois quando entrei no ano passado, já estavam nesta brincadeira. Sempre trabalhamos com o Carnaval e no final do evento restavam muitos materiais, como fazenda e enfeites. Então, dois amigos sugeriram fazer um Carnaval em miniatura”, contou à Lusa o artesão William Morais, de 26 anos e um dos autores dos trabalhos desta primeira exposição pública, que decorre na cidade do Mindelo.

A brincadeira começou com os artesãos a confecionarem com as sobras, cada um, uma rainha do Carnaval, em forma de boneca, competindo pela mais bonita e representativa da festa em São Vicente, ilha que é palco habitualmente da maior festa carnavalesca em Cabo Verde.

Com o “glamour” recriado em miniatura, a brincadeira foi crescendo entre os amigos, que foram dando lugar também a outros elementos de um grupo de Carnaval, terminando este ano com uma exposição de bonecas e peças que retratam parte da dinâmica e complexidade desta festa.

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“Da rainha, fomos fazendo porta-bandeira, depois foi com o andor e até agora decidimos fazer quase um grupo completo”, contou o artesão, reforçando que o grupo aproveita estas bonecas para promover a causa LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgénero) em São Vicente.

A confeção destas bonecas nasceu na zona de Fonte Filipe, onde reside a maioria destes artistas do Carnaval do Mindelo, com a comunidade LGBT local a juntar-se para formar grupos e incentivar competição entre si, com jurados compostos por elementos da organização da festa e o público, que avaliava e dava o prémio ao melhor enredo.

A primeira edição da exposição, no estúdio Mansa Flouting, na marginal da cidade do Mindelo, conta com aproximadamente 30 bonecas, divididas em dois grupos, com os respetivos enredos a retratar.

“No grupo dos meus colegas trouxeram o “Egipto” e o nosso tema foi “Nas Asas de um Sonho de um Jardim Encantado”, para trazer aquele mundo infantil de unicórnios, fadas, de contos, de reinos, jardins encantados”, explicou William Morais.

A proximidade da ilha com a festa em torno do Carnaval — que devido à pandemia não se realiza em Cabo Verde desde 2019 –, aumentou o impacto da exposição, até por se tratar de um local de grande visibilidade, como é o estúdio flutuante instalado na margem da cidade, preparando-se agora para regressar a casa, em Fonte Filipe.

“Já é conhecido porque sempre o fizemos, apesar de termos parado alguns anos e retomado o ano passado, as pessoas ficam na expectativa do próximo. Estamos a tentar fazer pelo menos uma vez ao ano, depois do Carnaval”, explicou ainda o artesão.

Para já, garante que a venda destas vistosas bonecas, cheias de cor e quase de vida, é limitada, já que só arrancou este ano, num esforço conjunto de amigos, que só com o “amor” compensa.

“É bonito, mas é cansativo e um pouco dispendioso. Então, começamos a trabalhar com a ajuda de amigos, que doam roupas de carnavais passados, enfeites e vamos reaproveitando tudo. Somos quatro fixos e de vez em quando aparecem mais dois amigos para dar uma ajuda e no outro grupo são dois artistas do Carnaval, inclusive que trabalham alas dos grupos oficiais do Carnaval Mindelense”, explicou William Morais.

As bonecas eram antes emprestadas por amigos, para serem enfeitadas. Porém, a dificuldade para as “despir” no final, para as devolver, fez com que os jovens passassem a comprar as próprias bonecas, para vestirem os modelos confecionados.

Não falam em orçamento, mas garantem que foi um trabalho complexo de confeção de cada boneca, em todos os detalhes, por isso árduo ao longo de mais de um mês.