O vídeo terá sido gravado na última quinta-feira, mas só este sábado foi divulgado. Com cerca de dez minutos de duração, foi partilhado agora no canal do batalhão Azov no Youtube e mostra — de acordo com as forças ucranianas — a vida no interior dos abrigos do complexo industrial de Azovstal, o último grande bastião de resistência ucraniana em Mariupol.

No vídeo, além de soldados ucranianos, é possível ver várias crianças (que falam para a câmara) e pessoal médico. Nas redes sociais, surgiram entretanto alguns testemunhos de crianças traduzidos para inglês. Uma delas, um rapaz, afirmará em ucraniano: “Quero ir para casa vivo. Quero ver o sol“.

No interior do complexo industrial de Azovstal estarão, além dos últimos soldados e marines ucranianos que ainda resistem em Mariupol, perto de mil civis, têm vindo a garantir os responsáveis de Kiev e as autoridades ucranianas da região. Alguns destes civis são crianças com entre 5 e 14 anos e existirão menores escondidos nestes bunkers há dois meses.

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Segundo o jornalista Oliver Carroll, da revista britânica The Economist, ao longo do vídeo os adultos filmados dizem que estão 15 crianças nos bunkers. O mesmo relata a BBC, que atribui essa afirmação (de que há 15 crianças nos abrigos) a uma mulher que no vídeo não é identificada pelo nome.

Algumas das crianças serão filhos de trabalhadores da fábrica e do complexo industrial de Azovstal, outras refugiaram-se nos bunkers por motivos de segurança.

Já a estação britânica BBC escreve que neste novo vídeo surgem relatos de que começa a acabar a comida e água disponível nestes abrigos. Há quem implore pela evacuação da cidade e pela retirada segura de civis e existe quem diga que não vê a luz do dia há semanas, por já ali estar desde fevereiro.

A BBC detalha também que, neste vídeo, uma rapariga menor de idade diz que deixou a sua casa com a mãe e a avó a 27 de fevereiro — ou seja, há quase dois meses. E acrescenta:

“Não voltámos a ver o céu ou o sol desde aí. Queremos muito sair daqui. Queremos estar num sítio que seja seguro para nós, onde ninguém se magoe, e queremos viver em segurança”.

A jovem diz inclusivamente para onde quer ir, segundo a BBC: para Lviv, junto à fronteira com a Polónia, onde estará um dos seus irmãos que conseguiu escapar de Kharkiv.

segundo o jornal britânico The Guardian, uma mulher diz no vídeo que as pessoas estão “à beira da fome” nestes abrigos: “Todos os alimentos que trouxemos connosco estão a acabar. Em breve não teremos sequer comida suficiente para as crianças. Estamos aqui e precisamos de ajuda. Estamos no epicentro dos acontecimentos e não podemos sair. Imploramos por garantias de segurança para os nossos filhos. Preocupam-nos as vidas das nossas crianças e pais [idosos] que precisam de cuidados médicos”.

Há vários dias que as autoridades ucranianas tentam assegurar a evacuação da cidade e a retirada de civis para outras cidades seguras da Ucrânia. Para este sábado, por exemplo, chegou a haver um corredor humanitário previsto. Não tem sido porém possível transportar civis nestes trajetos e há relatos das autoridades locais de centenas de pessoas deportadas à força para a Rússia, por tropas do Kremlin.

O vídeo anterior e Alice, a criança de 4 anos escondida no bunker

Este não é o primeiro vídeo alegadamente filmado nos abrigos do complexo industrial de Azovstal. Há alguns dias já tinham sido partilhadas outras imagens do interior dos esconderijos no último grande bastião de resistência ucraniana em Mariupol.

Também há alguns dias ficou a saber-se a história de Alice (na pronúncia ucraniana, Alicia), uma criança de quatro anos que, segundo as tropas ucranianas, vive praticamente desde o início da guerra nos canais subterrâneos do complexo industrial de Azovstal.

O vídeo, partilhado pelo site noticioso MNews, mostra um diálogo que dura menos de um minuto. A criança é interpelada com várias perguntas:

— Como é que te chamas?
— Alice.
— O que é que queres dizer?
— Quero ser retirada.
— Onde é que estás agora?
— Aqui, aqui… No bunker.
— Gostas de estar aqui?
— Quero ir para casa.
— E a quem queres dizer olá?
— À avó Sveta.

Na altura, Maxim Zhorin, um comandante do batalhão ucraniano fundado por neonazis, alegou: “Esta menina Alice está nos porões de Azovstal, onde a sua mãe — uma médica militar — presta assistência 24 horas por dia aos defensores feridos de Mariupol. Além dela, há centenas de civis nos porões, onde encontraram o único abrigo possível perto dos militares”.

Mariupol. Alice, a criança de 4 anos, que vive nos subterrâneos da fábrica Azovstal

Relatos de novos bombardeamentos junto ao complexo

Esta quinta-feira, Vladimir Putin tinha anunciado que recuara nos planos de atacar diretamente e entrar no complexo industrial de Azovstal, para subjugar e eliminar os soldados ucranianos do batalhão Azov que resistem à ofensiva russa em Mariupol.

O motivo do recuo: o elevado número de baixas que os confrontos no interior do complexo provocariam. Ao invés, defendeu Putin, a melhor estratégia seria cercar e bloquear por completo as entradas e saídas de este complexo industrial, até que as tropas ucranianas ainda existentes e os civis do país se rendessem. O Presidente russo disse mesmo que o objetivo era que “nem uma só mosca” conseguisse entrar ou sair deste complexo.

No entanto, um conselheiro próximo do Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky alegou este sábado numa televisão ucraniana que as forças russas tinham retomado os ataques aéreos junto a Azovstal e que estariam a tentar encetar operações de assalto ao complexo industrial.

Dentro de Azovstal. A cidade-fábrica de Mariupol onde a resistência aguenta até “à ultima gota de sangue”