O El Mundo recuperava na antecâmara do arranque deste Europeu feminino aquela que foi a primeira final de sempre da competição no longínquo ano de 1984. Duas partes de 35 e não 45 minutos, um campo muito empapado que tornava quase impraticável jogar futebol (e com um dilúvio que fazia esse “favor” de não parar), pouco mais de 2.000 pessoas nas bancadas de um estádio com capacidade para 10.000, nem sequer sombra de uma possível transmissão televisiva. Até a bola, o centro de tudo, era mais pequena da que era utilizada pelos homens. Quase quatro décadas depois, tudo mudou. Tão ou mais importante do que isso, todos percebem que este é o Campeonato da Europa que vai potenciar a projeção dessa mudança.

Recuemos então de novo a 1984. Depois de uma fase de jogos sempre em campos modestos, quase sem assistência e com pouco ou nenhum interesse entre as 16 equipas presentes, Gotemburgo ainda conseguiu dar um ar da sua graça na primeira mão da decisão (com cobertura televisiva neste caso), o que deixou até as jogadoras inglesas surpreendidas. Na segunda mão, em Luton, o cenário supracitado mostrou uma outra realidade, adensada com o problema de todas as atletas terem de trabalhar na segunda-feira, o que fazia com que a suspensão do jogo não fosse um cenário. A Inglaterra ainda anulou o 1-0 do encontro inicial mas foi a Suécia a fazer a festa, ganhando nas grandes penalidades ao conjunto britânico por 4-3.

38 anos depois, Inglaterra e Suécia reencontravam-se num cenário diametralmente. O Bramall Lane, em Sheffield, estava há muito com lotação esgotada, a festa que se fez na antecâmara da partida foi quase como se fosse um jogo do futebol masculino, a própria qualidade das jogadores e os clubes que representam não tinha comparação – e houve até queixas, isso sim, de vários jornais britânicos por não haver mais espaço nos lugares de imprensa, como aconteceu com o The Guardian que fez questão de continuar o mesmo número de jornalistas de um Europeu masculino como o do ano passado. No entanto, só uma poderia repetir essa final com a esperança de poderem ganhar a competição como nunca mais aconteceu (oito títulos da Alemanha, dois da Noruega, o último dos Países Baixos). E foi a Inglaterra, que teve bem mais problemas em superar os quartos frente à Espanha com um 2-1 no prolongamento, a chegar à final.

O encontro começou a um ritmo de loucos, com a Suécia a necessitar apenas de 21 segundos para criar a primeira oportunidade flagrante na sequência de um roubo de bola a meio-campo com passe longo que deixou Sofia Jakobsson na cara de Mary Earps. Pouco depois, Beth Mead, goleadora da formação inglesa, teve também uma ameaça de cabeça ao segundo poste que saiu ao lado (5′) mas as escandinavas eram bem mais pragmáticas nas chegadas ao último terço, tendo mais uma ocasião com Blackstenius isolada a rematar enrolado para desvio complicado de Earps para canto (8′) e, na sequência dessa bola parada, a avançada sueca acertou mesmo na trave (9′). As visitantes deixavam o seu cartão de visita no jogo.

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Aos poucos, com muitas correções da treinadora neerlandesa Sarina Wiegman à mistura, a Inglaterra foi equilibrando a partida, estancou as transições rápidas da Suécia, conseguiu “tirar” do jogo Asslani (melhor jogadora das escandinavas e candidata a MVP do torneio) e teve a chave do sucesso no momento em que conseguiu colocar-se em vantagem pela inevitável Beth Mead, a aproveitar uma insistência de Lucy Bronze na direita após um cruzamento longo para rematar cruzado e fazer o 1-0 registado ao intervalo.

A lateral direto de Inglaterra, que vai reforçar o Barcelona na próxima temporada e que já foi considerada a melhor jogadora do mundo, tem sido um dos grandes focos da equipa ao longo do Europeu mas não estava propriamente a fazer a melhor exibição de todas, com Sofia Jakobsson a ganhar várias vezes os duelos diretos pela esquerda entre algumas perdas de bola na saída. No entanto, seria mesmo a filha de Joaquim Bronze (um português casado com uma inglesa), grande adepta de conquilhas, bacalhau e pastéis de nata, a fazer a diferença de cabeça no arranque do segundo tempo com o 2-0 após canto (48′).

Se a Suécia tinha ainda ambições de poder chegar à final, esse momento acabou por ser um golpe anímico demasiado forte para o conjunto escandinavo, que depois de uma bola na trave de Lauren Hemp sozinha na área viu ainda Earps fazer uma grande defesa com a ponta dos dedos na última grande oportunidade de Blackstenius (65′). O jogo “acabava” aí mas havia tempo para espectáculo com algumas culpas à mistura da guarda-redes sueca, Hedvig Lindahl: Alessia Russo, na recarga a um primeiro remate, marcou de calcanhar o 3-0 por entre as pernas da número 1 sueca (68′) e Fran Kirby fez o 4-0 num chapéu (76′). Depois das derrotas com a Suécia (1984) e a Alemanha (2009), a Inglaterra volta à final do Europeu.