40 jogos. Roger Federer e Rafa Nadal cruzaram-se 40 vezes ao longo das respetivas carreiras: o primeiro duelo foi em março de 2004, na terceira ronda do Masters de Miami, e o último foi em 2019, nas meias-finais de Wimbledon. Federer ganhou em 16 ocasiões, Nadal ganhou 24 vezes. 24 das partidas entre os dois foram finais, com o espanhol a manter a superioridade em relação ao suíço com 14-10. Esta sexta-feira, na Laver Cup, entravam novamente no court ao mesmo tempo — não para o 41.º jogo mas para formar dupla na última partida da carreira de Roger Federer.

“Depois de todas as coisas incríveis que partilhámos dentro e fora de campo, fazer parte deste momento histórico será incrível e inesquecível para mim. Espero ter uma boa chance de jogar a um nível decente e espero que juntos possamos dar um bom show e talvez vencer o encontro. Espero que o público nos apoie e se divirta. Estar no court, com o Roger ao meu lado, será algo muito especial e estou muito feliz por isso”, disse Rafa Nadal em conferência de imprensa, já em Londres, na antecâmara da partida.

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Federer indicou logo na semana passada, quando anunciou o fim da carreira, que iria despedir-se na Laver Cup deste fim de semana. Dias depois, acabou por confirmar que a última partida seria no torneio de pares, já que não se sentia em condições para atuar no quadro individual, revelando depois que iria formar dupla com Rafa Nadal. “Vou estar nervoso. As pessoas pensam que não mas não jogo há tanto tempo! Não vou estar ao meu melhor nível. Vou sentir saudades de coisas que não terei de fazer novamente. Apertar as sapatilhas, pôr a fita na cabeça, olhar para o espelho e dizer para mim mesmo: ‘Estamos prontos’. Já passei por momentos difíceis, em que não era capaz de falar sobre o assunto sem me emocionar. Passei por várias fases… Quero estar feliz e em modo festa”, explicou o suíço em declarações à Eurosport.

E o modo festa esteve sempre presente. Para além da fotografia que parou as redes sociais, em que Roger Federer revelou um jantar com os “amigos” Rafa Nadal, Novak Djokovic e Andy Murray, o suíço apareceu em amena cavaqueira com os mesmos três tenistas durante um treino, jogou ténis de mesa de smoking antes da gala do torneio que ele próprio imaginou e foi ovacionado na abertura da Laver Cup, horas antes de entrar em ação. Esta sexta-feira, pela última vez, juntava-se a Nadal e representava a Equipa Europa, treinada por Björn Borg; do outro lado, estavam Frances Tiafoe e John Sock, da Equipa Mundo, treinada por John McEnroe.

Na O2 Arena, em Londres, ninguém ficava indiferente ao facto de Roger Federer estar a poucos instantes de terminar uma carreira de mais de 20 anos. Todos os tenistas que atuaram primeiro mencionaram o óbvio, o ambiente nas bancadas era naturalmente de ansiedade e até a Rolex, parceira do circuito ATP desde há muito tempo e braço direito também do próprio suíço, preparou um anúncio especial para a transmissão para homenagear o atleta sob o slogan #perpetual — perpétuo.

O jogo acabou por ser bem mais competitivo do que aquilo que era esperado, com nenhuma das duplas a abdicar de lutar pela vitória apesar da notória boa disposição que se vivia em campo. Federer e Nadal venceram o primeiro set (6-4) e a partida dava espaço para tudo — até para Frances Tiafoe, a meio do segundo set, trocar de lado para cumprimentar o espanhol depois de este ficar muito perto de enquadrar uma bola que seria extraordinária. Com o aproximar das decisões, porém, o nível competitivo subiu e os sorrisos deram lugar aos semblantes mais carregados e às conversas mais intensas entre colegas de equipa.

Num segundo set fisicamente mais exigente, Federer e Nadal voltaram a mostrar que são monstros competitivos mas não conseguiram evitar o empate (6-7), com a partida a seguir para um decisivo match tiebreak. Aí, na altura de cerrar os dentes, os mais experientes ainda desperdiçaram um match point mas não sobreviveram ao dos adversários, perdendo com Tiafoe e Sock (9-11) e falhando a derradeira vitória do suíço. E no fim, quase como se fosse um qualquer romancista a escrever a história, Nadal foi o último a abraçar o tenista Federer e o primeiro a abraçar o ex-tenista Federer.

Terminado o jogo, foi tempo de abrir a porta às emoções. Roger Federer permitiu finalmente que as lágrimas caíssem, assim como os pais, a mulher e até Nadal, e sentou-se para absorver uma O2 Arena que o aplaudia em uníssono. “Vou conseguir fazer isto de alguma forma, não vou? Tem sido um dia maravilhoso. Estou feliz, não estou triste. É ótimo estar aqui. Aproveitei para apertar as sapatilhas mais uma vez, foi tudo pela última vez. Nem senti tanto o stress. Fico muito contente por ter conseguido jogar o jogo até ao fim, foi ótimo. E claro, jogar com o Rafa, estar aqui com os rapazes, todas as lendas, é mesmo fantástico”, começou por dizer o suíço, sublinhando depois a despedida ao lado da Equipa Europa.

“Não queria sentir-me sozinho, queria dizer adeus como equipa. Sempre senti que era um jogador de equipa, mesmo que o ténis nem sempre tenha essa componente. Sinto que é uma celebração, queria sentir-me assim no fim e é exatamente aquilo que esperava. Por isso, obrigado. Nunca foi suposto ser assim. Só gostava de jogar ténis e passar tempo com os meus amigos e acabei aqui. Foi uma aventura perfeita e fazia tudo outra vez. Tem sido muito divertido. Obrigado a todos. Tudo isto significa o mundo para mim”, acrescentou Federer, que interrompeu o discurso diversas vezes devido às lágrimas que não conseguia conter e que se despediu com abraços duradouros à mulher, Mirka, aos quatro filhos e aos pais.