Uma cassete datada de 1963 poderá ser um dos primeiros registos de uma atuação completa dos Beatles no Reino Unido. Uma gravação dos quatro jovens de Liverpool numa atuação numa escola apenas para rapazes, no início do fenómeno de popularidade “beatlemania”.

A cassete, até agora desconhecida, foi guardada ao longo de 60 anos por um então aluno da Stowe Public School, uma escola em Buckinghamshire. A existência desta relíquia foi revelada a Samira Ahmed, jornalista da BBC, durante uma troca de emails, quando tentava reunir testemunhos de alunos para assinalar os 60 anos do concerto.

O diretor da escola tentou organizar um encontro com o maior número possível de alunos que frequentavam a escola na altura, que hoje já têm mais de 70 anos. Num dos emails trocados para essa preparação, relata o Guardian, o diretor quis perceber com um aluno da altura se o “rumor de que um dos rapazes tinha um fio de um microfone ligado a um gravador debaixo do palco” era verdade ou um mito da escola.

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John Bloomfield, então um jovem com 15 anos, desempenhou funções como responsável de palco no dia do concerto. Confirmou que a história era mesmo verdade. “Sou culpado, fui eu. [O gravador] não estava debaixo do palco, mas em frente ao palco. Vou ver se encontro a cassete e se ainda está utilizável.”

Bloomfield não só encontrou a cassete como percebeu que tinha resistido à passagem dos anos. Num texto publicado no Guardian, Samira Ahmed explica que, na primeira ocasião em que ouviu uma parte da gravação, sentiu que estava a “viajar no tempo”. Quis ouvir a totalidade da gravação, desta vez acompanhada por Mark Lewisohn, historiador dos Beatles, a ouvir através de uma videochamada. Foram as primeiras pessoas, além de Bloomfield, a ouvir aquela cassete em décadas.

Começaram a registar aquilo que iam ouvindo. “As piadas e as vozes de John Lennon, o agradecimento educado de Paul McCartney e a desculpa pelo facto de estarem habituados a tocar dois ‘sets’ de meia hora”, relatou a jornalista da BBC. Durante o concerto, os Beatles atuaram para um público maioritariamente masculino; as únicas raparigas presentes eram as filhas dos funcionários da escola, no fundo da sala.

John Bloomfield diz que sempre gostou de engenhocas. Tinha um novo gravador, um Butoba MT5, que queria testar. E, a 4 de abril de 1963, surgiu a ocasião ideal, o concerto da banda de Liverpool. Tudo porque um aluno entrou em contacto com o agente Brian Epstein para ouvir a banda na escola. Os Beatles receberam 100 libras pelo concerto, que hoje em dia seriam o equivalente a 1.691,06 libras, um valor próximo de 1.910 euros.

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A cassete registou 22 músicas, incluindo vários pedidos do público, mas o concerto terá ido mais além. Bloomfield, o autor do registo dos “Fab Four”, contou à jornalista da BBC que sentiu que “cresceu naquele momento”. “Soa um pouco a exagero, mas percebi que aquilo era algo de um planeta diferente”, disse, embora admita que tem “alguma vergonha” de ter captado aquele som.

A Stowe Public School, que funciona em regime de internato, tem desde 2020 uma placa comemorativa para assinalar o concerto. Na altura, o concerto dos Beatles também marcou um choque de classes: de um lado, os quatro de Liverpool, com origens humildes, a atuar para os alunos de uma escola privilegiada.

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A descoberta da cassete está a dar que falar no Reino Unido. O Observer avança este domingo que há conversas a decorrer para restaurar o som captado para que possa ser apreciado por uma audiência maior. Bloomfield, que captou o som, tem esperança de que a tecnologia possa dar uma ajuda

“Há conversas para limpar a cassete e dar-lhe um lar permanente numa instituição cultural nacional”, disse Samira Ahmed, a jornalista que noticiou a cassete, ao Observer. “O John [Bloomfield] tem a convicção de que não deve acabar, tal como tantas outras relíquias dos Beatles acabaram, num cofre privado.”

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