O Exército do Sudão declarou as Forças de Apoio Rápido (RSF) um grupo “rebelde”, descrevendo o comunicado emitido pelas forças lideradas por Mohamed Hamdane Dagalo, número dois do país, como uma “mentira”, citou a Al Jazeera. Os militares informaram que a força aérea foi chamada para confrontar o grupo paramilitar de Dagalo. A BBC confirmou que foram vistos caças a sobrevoar a capital do país, Cartum.

Pelo menos 56 pessoas terão morrido em resultado dos confrontos no país, segundo um novo balanço divulgado hoje pelo Sindicato dos Médicos do Sudão. O anterior balanço apontava para 26 mortos e 103 feridos. A mesma fonte adiantou que há a registar dezenas de mortes entre as forças de segurança. As mortes ocorreram por todo o país, incluindo na capital, Cartum, e Omdurman, disse o Sindicato dos Médicos do Sudão.

O jornal norte-americano New York Times cita fontes das Nações Unidas e aponta o registo de 30 mortos no país. A Reuters, por outro lado, cita fontes da União de Médicos Sudaneses e refere que o número de vítimas mortais é de 25.

A AFP, citando um comunicado do Exército avançou que as forças aéreas bombardearam e destruíram várias bases das RSF na zona de Cartum. As RSF informaram terem tomado o aeroporto internacional da capital, o maior do país. Todos os voos foram cancelados. EgyptAir tomou a decisão de suspender todos os voos por 72 horas.

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De acordo com a BBC, duas pessoas terão morrido na sequência de um bombardeamento no aeroporto. Uma terceira pessoa morreu no estado de Kordofan do Norte.

Disparos e explosões foram ouvidos este sábado em Cartum, após o Exército ter cercado o quartel-general das RSF na cidade, noticiou a Reuters, com base no relato de testemunhas. Tanto a Reuters como a Al Jazeera descrevem um clima de medo na cidade.

Testemunhas relataram à agência EFE tiroteios nas proximidades do quartel-general do Exército e da residência do líder militar e presidente do Conselho Soberano, Abdelfatah al-Burhan. As estradas que conduzem à residência do presidente foram fechadas com carros blindados. A situação permanece tensa ao início da tarde, com diversos testemunhos a darem conta de tiroteios nas ruas e “colunas de fumo”.

Não há portugueses afetados pelos incidentes, avança MNE

O Governo português diz estar a acompanhar a situação de violência no Sudão. Mas, até ao momento, não tem notícia de portugueses afetados pelos confrontos que eclodiram entre o Exército e o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido.

“O Ministério dos Negócios Estrangeiros [MNE] está a acompanhar a situação, com a Embaixada de Portugal no Cairo, que tem jurisdição consular no Sudão. Até ao momento, não há notícia de portugueses afetados”, afirmou a tutela, numa breve resposta à Lusa. “O MNE irá continuar a acompanhar a situação”, acrescentou.

Entretanto, durante a tarde deste sábado, o alto representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e Segurança, Josep Borrell, já veio condenar a violência e pedir uma “diminuição imediata do conflito”.

“A UE exorta todas as partes a mostrar liderança e trabalhar para uma cessação imediata das hostilidades. Neste momento crítico, deve ser dada prioridade a silenciar as armas, aliviar a situação e resolver as diferenças através do diálogo”, disse Borrell em comunicado.

O chefe da diplomacia europeia sublinhou que nos últimos meses tanto as Forças Armadas como as RSF  têm feito “enormes esforços” para recolocar o país no caminho da democracia ao chegarem a um acordo-quadro que abre caminho a um Governo liderado por civis, e considerou que os acontecimentos deste sábado “põem em perigo esses importantes avanços”.

E, também em reação aos últimos desenvolvimentos no país, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, condenou fortemente os confrontos entre os paramilitares das Forças de Apoio Rápido (RSF) e as Forças Armadas no Sudão e pediu o fim imediato das hostilidades.

“O secretário-geral pede aos líderes das RSF [na sigla em inglês] e das Forças Armadas sudanesas que cessem imediatamente as hostilidades, restabeleçam a calma e iniciem um diálogo para resolver a crise atual”, disse o porta-voz do secretário-geral em comunicado.

Guterres também enfatizou que qualquer “nova escalada nos combates terá um impacto devastador sobre os civis e agravará ainda mais a já precária situação humanitária no país”.

“O secretário-geral colabora com os líderes da região e reafirma o compromisso das Nações Unidas de apoiar o povo do Sudão nos seus esforços para restaurar uma transição democrática e realizar as suas aspirações de construir um futuro pacífico e seguro”, detalha o texto.

Por sua vez, o representante especial do secretário-geral para o Sudão e chefe da Missão Integrada de Assistência à Transição das Nações Unidas no Sudão (UNITAMS), Volker Perthes, anunciou hoje que contactou ambas as partes para lhes pedir que cessem imediatamente os combates, para garantir a segurança do povo sudanês e prevenir mais violência.

Em comunicado, o Exército do Sudão recusou logo durante a manhã as notícias que deram conta de que as RSF tinham tomado o palácio. “As Forças de Apoio Rápido espalham notícias falsas de fora do Sudão e reivindicam o controlo do Comando Geral e do Palácio da República”, disseram as Forças Armadas sudanesas.

O Exército também informou que o comandante das RSF no Nilo Branco entregou “todas as suas forças, acampamentos e equipamentos ao comando do Exército no estado” e anunciou que juntará à luta das forçar armadas.

Em comunicado, a força paramilitar, que emergiu das milícias de Janjaweed, acusadas de terem cometido crimes contra a humanidade durante o conflito do Darfur, descreveu as ações do Exército que terão desencadeado o escalar do conflito como um “assalto brutal”. As RSF apelaram ao “ao povo sudanês e à opinião pública internacional e regional para que condenem este comportamento cobarde” e pediram união da população num “momento histórico crítico”.

O porta-voz do Exército sudanês, Nabil Abdullah, disse à rádio Omdurman que foram as RSF a iniciar as hostilidades. “As Forças de Apoio Rápido atacaram as nossas forças em vários locais, o que exigiu uma resposta”, afirmou, sem adiantar mais pormenores.

O incidente aconteceu na sequência de vários dias de tensão entre as duas forças militares após o Exército ter acusado as RSF de movimentações ilegais em Cartum e noutras cidades. Esta sexta-feira, o líder do grupo paramilitar manifestou vontade de procurar uma solução para a tensão sem “derramamento de sangue”, segundo oficiais sudaneses que atuam como mediadores entre os militares.

Embaixador dos EUA “abrigado” juntamente com funcionários. Embaixada russa mostra-se preocupada

John Godfrey, embaixador dos Estados Unidos da América no Sudão, afirmou no Twitter que chegou na noite de sexta-feira a Cartum e que foi acordado na manhã deste sábado com “o som de tiros e de confrontos”. Godfrey disse estar “abrigado” com os restantes funcionários da embaixada enquanto os confrontos decorrem.

“A escalada de tensões dentro do componente militar para as lutas diretas é extremamente perigosa”, escreveu o embaixador no Twitter. “Apelo urgentemente aos líderes militares seniores que parem os confrontos.”

A embaixada da Rússia mostrou-se preocupada com a “escalada de violência” e pediu um cessar-fogo e negociações, noticiou a agência RIA, acrescentando que o ambiente é tenso e que os funcionários russos se encontram em segurança.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia emitiu um comunicado alertando os cidadãos para os perigos de viajar para o Sudão devido ao “agravamento da segurança na capital”. “Aqueles que lá estão devem evitar áreas perto de aeroportos, bases militares e zonas governamentais, e permanecer no local de residência”, afirmou o ministério num comunicado enviado à agência de notícias Interfax.

ONU pede “cessação imediata” dos confrontos no Sudão. Blinken defende que há “oportunidade” para transição de governo

Antes de Guterres se pronunciar sobre a situação no Sudão já o enviado especial da Missão da ONU no país, Volker Perthes, tinha condenado “veementemente o início dos combates no Sudão” e pedido “a cessação imediata” das hostilidades. “O representante Perthes falou com ambas as partes para solicitar que cessem imediatamente os combates e garantam a segurança do povo sudanês e evitem que o país sofra mais violência”, afirmou.

Perthes também expressou a sua “forte condenação” dos confrontos que eclodiram na manhã de hoje entre as Forças Armadas Sudanesas e as RSF, que estão a ocorrer “em muitos pontos da capital, Cartum, e noutras áreas”.

Em visita ao Vietname, o secretário de Estado dos Estados Unidos da América , Antony Blinken, disse que embora a situação no Sudão seja “frágil”, ainda há “uma oportunidade real para lutar por uma transição para um governo civil”.

“Existem alguns atores a travar esse progresso, mas esta é uma oportunidade real de lutar por uma transição para um governo civil. Estamos muito focados nisso”, afirmou numa conferência de imprensa em Hanói, este sábado, quando questionado sobre a situação no Sudão.

Blinken recorreu depois ao Twitter para expressar a sua “profunda preocupação com os relatos da escalada de violência entre as Forças Armadas sudanesas e as Forças de Apoio Rádio”, adiantando que o governo norte-americano está em contacto com a equipa na embaixada em Cartum. “Instamos todos os envolvidos a pararem imediatamente com a violência”, declarou.

Liga Árabe oferece-se para mediar conflito no Sudão

A Liga Árabe ofereceu-se para intervir no conflito em curso no Sudão como mediadora. O secretário-geral da Liga Árabe, Ahmed Aboul Gheit, apelou para o fim “imediato da escalada da violência e do derramamento de sangue” no Sudão, num comunicado citado pela agência espanhola EFE.

O diplomata egípcio condenou o “recurso às armas e aos confrontos”, e disse estar pronto a intervir com as partes para pôr fim aos combates. Lamentou ainda que os confrontos armados tivessem eclodido “durante o dia do mês santo do Ramadão” e apelou para a “responsabilidade das partes beligerantes em manter a segurança dos civis”.

Com sede no Cairo, a Liga Árabe tem 22 membros, incluindo o Sudão.

O Sudão atravessa atualmente uma crise política devido a rivalidades entre o líder do país, Abdel Fattah al-Burhane, líder do exército e autor do golpe de 25 de outubro de 2021, e o seu braço direito, Mohamed Hamdane Dagalo, chefe das RSF.

No fim de semana passado, a assinatura de um acordo de saída da crise para relançar a transição democrática após o golpe de 2021, que deveria ter tido lugar no dia 6 de abril, foi novamente adiada. A oposição civil apelou a manifestações.