A defesa de Mário Machado tentou esta sexta-feira demonstrar em tribunal o impacto pessoal e familiar das afirmações de Mamadou Ba que considera difamatórias, tendo o militante neonazi reafirmando o orgulho nacionalista e defendido que este não justifica “valer tudo”.

“Tenho muito orgulho em ser nacionalista. Esse orgulho não pode ser suficiente para valer tudo e para me chamarem assassino”, disse o militante neonazi perante a juíza Joana Ferrer.

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Mário Machado falava na segunda sessão do julgamento em que processa o ativista antirracista Mamadou Ba por difamação, publicidade e calúnia, na sequência de um texto de Ba na rede social Facebook, no qual escreveu “Mário Machado é um dos principais responsáveis pela morte de Alcindo Monteiro“, levando Mário Machado acusá-lo de o chamar assassino por um crime de ódio do qual foi absolvido.

A defesa de Mário Machado chamou a depor, para além do próprio, a sua ex-mulher e a sua mãe, com o objetivo de retratar o impacto familiar e pessoal negativo para o militante neonazi da referida publicação, sobretudo junto dos filhos e do ambiente escolar que os mais novos frequentam.

Mário Machado reiterou a argumentação já anteriormente usada pelo seu advogado, de que as afirmações de Mamadou Ba que o classificam, segundo a sua interpretação, como assassino do cabo-verdiano Alcindo Monteiro – morto em 1995 por um grupo de “skinheads” aos quais Machado tinha ligação – são afirmações reiteradas e feitas por alguém com “forte ressonância” na opinião pública.

Pediu a condenação de Mamadou Ba pelo crime de difamação, tal como ele foi condenado – “e bem”, disse – pelos crimes que cometeu, acrescentando que desde que saiu da prisão não cometeu qualquer crime e que não há nada na lei que o impeça de professar uma ideologia nacionalista.

Isabel Duarte, advogada de Mamadou Ba, perguntou se via na frase em julgamento perseguição política, ao que Mário Machado começou por responder que via apenas um crime de difamação, mas depois da insistência da advogada acabaria por dizer que via motivações políticas nas intervenções de Mamadou Ba.

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Questionado por Isabel Duarte sobre se a perseguição a minorias raciais e homossexuais faziam parte da ideologia nacionalista, Mário Machado acabaria por responder, em tom irritado, lembrando que não era ele o réu na sala, que Alcindo Monteiro foi a única vítima de nacionalistas de que se recorda e que se batem “recordes todos os anos” de pessoas brancas mortas por pessoas negras, rejeitando responsabilizar toda uma etnia por esses crimes e acusando Isabel Duarte o tentar responsabilizar pelo inverso.

“Nunca matei ninguém, sou ativista nacionalista e nunca matei ninguém. Nunca mais voltou a acontecer e espero sinceramente que não aconteça”, disse, sobre o caso de Alcindo Monteiro.

Sobre outro processo, pelo qual cumpriu pena por ofensas corporais, Isabel Duarte questionou, sem sucesso, Mário Machado sobre “o que esperava que acontecesse” depois de ter deixado o homem agredido inconsciente nas ruas do Bairro Alto, em Lisboa, sem assistência: “Não vou responder, já respondi por esse processo, agora é a vez do seu constituinte”.

Mário Machado foi ainda confrontado com uma fotografia retirada de uma publicação da rede social Telegram, identificada como sendo uma conta sua, algo que o militante neonazi negou. Convidado por Isabel Duarte a interpretar a fotografia onde se via um cão branco com um capuz do Klu Klux Klan (organização supremacista branca norte-americana) e outro cão preto, com uma corda ao pescoço, Mário Machado disse achar a fotografia “muito engraçada”, afirmando que lhe dava vontade de rir.

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O momento levaria a uma troca de palavras mais acesa entre Mário Machado e a advogada de defesa, com o primeiro a pedir a Isabel Duarte que não se exaltasse e a sugerir que “devia tomar qualquer coisa” e a segunda a exigir respeito, tendo a juíza acabado a pedir calma no tribunal.

Mário Machado foi também questionado sobre as razões pelas quais decidiu apresentar queixa, inicialmente pela procuradora do Ministério Público Teresa Silveira Santos, à qual respondeu com a imagem da “gota que faz transbordar o copo”, falando num amontoar de situações e sublinhando umas das primeiras ideias que deixou em tribunal esta tarde: “Chegou o momento da minha vida em que disse que isto tinha que parar”.

Já Isabel Duarte questionou sobre o total de queixas apresentadas por afirmações de que Machado seria o assassino de Alcindo Monteiro, rejeitando que tenha desistido das outras e dado continuidade à de Mamadou Ba por este ser negro, atribuindo esta ideia a uma “concertação da extrema-esquerda”.

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Mário Machado explicou, nomeadamente, que desistiu da queixa contra o deputado do Livre, Rui Tavares, por este ter feito um desmentido público de um texto de opinião em que o acusava de ser o assassino de Alcindo Monteiro, algo que “foi o suficiente”, e que não chegou a apresentar queixa contra o jornalista Daniel Oliveira por se ter ultrapassado o prazo legal para o efeito.

A próxima sessão do julgamento está agendada para dia 19 de maio, pelas 14h00.

A 27 outubro passado, foi tornado público que o ativista antirracismo Mamadou Ba ia a julgamento por difamação do ex-dirigente do movimento “Hammerskins Portugal” Mário Machado, após decisão do juiz de instrução criminal Carlos Alexandre, que proferiu um despacho de pronúncia para julgamento em tribunal singular “nos exatos termos” da acusação do Ministério Público (MP).