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"A Outra Rapariga Negra": não é "Get Out" quem quer

Este artigo tem mais de 6 meses

Do livro para a Disney+, entre mistério, humor e crítica social, a premissa da série é promissora, mas deixa escapar uma boa oportunidade porque tem pressa e é preguiçosa, tudo ao mesmo tempo.

Sinclair Daniel é Nella Rogers. Ashleigh Murray interpreta Hazel-May McCall. Entre as duas, tudo podia ser perfeito. Pelo contrário: é tudo muito complicado
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Sinclair Daniel é Nella Rogers. Ashleigh Murray interpreta Hazel-May McCall. Entre as duas, tudo podia ser perfeito. Pelo contrário: é tudo muito complicado

Sinclair Daniel é Nella Rogers. Ashleigh Murray interpreta Hazel-May McCall. Entre as duas, tudo podia ser perfeito. Pelo contrário: é tudo muito complicado

Em 2017, o filme Get Out, do até então comediante Jordan Peele, apanhou o mundo cinematográfico desprevenido. Num golpe de mestre, Peele quase criou um novo subgénero: o do terror com uma camada de crítica social que não se ficava pela superfície, escarafunchando entranhas metafórica mas também literalmente.

Relatava a história de Chris, um jovem negro que vai conhecer a família da nova namorada Rose, acabando numa mansão rodeado de brancos de classe alta, numa visita que rapidamente vai do afável a perseguições com instrumentos de cirurgia. Tornou-se num tratado artístico sobre o racismo, que foi nomeado para Óscares nas categorias principais, que figura constantemente em listas de preferidos e de melhores e que leva constantemente ao uso em descrições de outras obras do chavão “ah, isso  é tipo o Get Out“.

Seis anos depois, sim, A Outra Rapariga Negra (The Other Black Girl no original) é tipo o Get Out. De tal modo que o filme de Peele é referido de passagem, no décimo e último episódio, como que calando a pergunta que o espectador fazia desde o primeiro. Sim, a nova série da Hulu (que por cá já se estreou na Disney+) e o livro que lhe deu origem só existem porque o pobre Chris foi hipnotizado e torturado como uma peça de caça. Se isto retira inovação à série? Sem dúvida. Se mesmo assim A Outra Rapariga Negra tenta surpreender e dar cambalhotas inesperadas na história? Sim, mas se calhar devia era ter ficado quietinha.

[o trailer de “A Outra Rapariga Negra”:]

https://www.youtube.com/watch?v=7gmYkNE0wYw&pp=ygUcdGhlIG90aGVyIGJsYWNrIGdpcmwgdHJhaWxlcg%3D%3D

Criada por Zakiya Dalila Harris (autora do livro, um best seller de 2021) e por Rashida Jones (conhecida sobretudo como atriz de Parks And Recreation, mas também ela autora, por exemplo, dos guiões de Toy Story 4 e de episódios de Black Mirror), A Outra Rapariga Negra é o isco perfeito numa plataforma de streaming que ainda opta por lançar as temporadas todas de uma vez.

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O ritmo e o mistério da história, aliados ao facto (cada vez mais raro) dos episódios só terem meia hora, tornam a maratona quase inevitável. Aqui conhecemos a história de Nella Rogers (interpretada pela quase estreante Sinclair Daniel), uma assistente editorial e a única funcionária negra de toda a Wagner Books. Nella fica muito feliz ao saber que a empresa contratou outra negra para uma função similar, a enigmática Hazel-May McCall (a atriz Ashleigh Murray do êxito juvenil Riverdale). Porém, a chegada da nova funcionária traz uma série de acontecimentos misteriosos consigo. A história terá sido, em parte, inspirada por experiências pessoais da autora Zakiya Dalila Harris como editora, de modo a abordar várias formas de racismo, das mais subtis às mais descaradas, no mundo empresarial e corporativo.

Apesar de baseado então em algum realismo, A Outra Rapariga Negra depressa dá a atender que possamos estar em presença de algo do âmbito do sobrenatural — especialmente nos flashbacks do primeiro grande livro da Wagner Books, uma obra dos anos 80 chamada The Burning Heart. Mas mesmo no plano do concreto e do palpável, a série é muitas vezes preguiçosa, apressada ou simplesmente desengonçada no modo como nos força a encaixar peças.

Muitos detalhes são metáforas ou piscadelas de olho ao racismo estrutural ou ao complexo do salvador branco. Esta é, aliás, a textura mais interessante de "A Outra Rapariga Negra"

Basta pensar que um dos momentos chave passa por, em 2023, alguém encontrar um envelope com todo o plano impecavelmente impresso e colado na parte de trás de um espelho. Parece uma daquelas cenas dos filmes vintage do James Bond nos quais o vilão, em vez de matar o herói, passa um quarto de hora a explicar o seu esquema ao detalhe, para conforto do espectador. E isto já para não dizer que grande twist final funciona com base (inesperada e deixada por explicar) na ficção científica ou no realismo mágico (riscar o que não interessa, de acordo com quão abananado ou irritado se ficou com esta solução).

A série, tal como o livro, terá mais subtilezas de interpretação para a comunidade negra do que para esta branquelas das Avenidas Novas que assina o texto. Muitos detalhes são metáforas ou piscadelas de olho ao racismo estrutural ou ao complexo do salvador branco. Esta é, aliás, a textura mais interessante de A Outra Rapariga Negra (apesar do livro Yellowface, lançado este ano por R.F. Kuang, o fazer muito melhor com a comunidade asiática).

Porém, perde-se nas metáforas e com isso força a história para onde dá jeito, e não necessariamente para onde faz sentido. Mesmo o facto de o tal grande twist final estar ligado com (ALERTA ESPÉCIE DE SPOILER À FRENTE) produtos de cabelo tem uma conecção com a experiência negra de ser julgado pelas suas opções e características capilares, diferentes das caucasianas-padrão. Mas tudo isso parece, infelizmente, curto quando se esquece de contar uma história coesa e que cumpra a tensão de thriller sem desiludir o espectador. A Outra Rapariga Negra deixa o final em aberto, dando a entender uma segunda temporada. Espero que até lá as autoras se lembrem que não é Get Out quem quer.

 
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