Recuemos a março de 2019 (inserir som da fita a ser puxada para trás). João Félix deslizava de joelhos no relvado, cruzava os braços e olhava para as bancadas do Estádio do Dragão de boca calada. O golo que acabara de marcar falava por si. O Benfica vencia em casa do FC Porto e assumia a liderança de um campeonato que viria mesmo vencer. Então, por que não voltar a um sítio onde se foi feliz? Era a pergunta que João, vestido com a camisola do Barcelona, fazia a si mesmo no regresso à casa do emblema azul e branco. “Pode ser que seja especial por ser adversário português, por ter família e amigos na bancada, mas é mais um jogo para tentar ganhar”, disse o jogador que fez parte da formação no FC Porto, mas que brilhou ao serviço do Benfica na antevisão ao jogo entre os portistas e o Barcelona da segunda jornada do grupo H da Liga dos Campeões.

Antes do compromisso europeu, o FC Porto tinha perdido o clássico precisamente frente ao Benfica na Luz. “Não foi bom para nós o Benfica ter ganho”, intuiu Félix. “Perdem um jogo e entram para fazer melhor, com vontade no máximo. Sabemos que no Dragão é sempre complicado. Estamos precavidos para isso”. João é um nome próprio demasiado comum em Portugal. O certo é que parece vir munido de uma injeção de talento. A Félix juntava-se outro João de apelido Cancelo, dupla que deixava o treinador do FC Porto, Sérgio Conceição, em sobreaviso. “São dois internacionais portugueses, com muita qualidade, assim como vejo a maior parte dos jogadores do Barcelona, que têm uma qualidade individual acima da média”, disse o técnico. “É uma equipa cheia de qualidade. Félix e Cancelo foram acrescentar ao Barcelona nas posições que acho que o Barcelona precisava”.

Depois do clássico e perto da eliminatória da Taça de Portugal contra o Vilar de Perdizes, o FC Porto procurava dar sequência à vitória contra o Shakhtar Donetsk e vincar ainda mais o favoritismo a passar à fase a eliminar. Perante si, os dragões tinham outro candidato a fazer o mesmo, pelo que os duelos diretos com o Barcelona podem ser decisivos para empurrar os catalães para fora do primeiro lugar. “Têm individualidades que podem resolver de um momento para o outro”, referiu Sérgio Conceição. “Sabemos das fragilidades deles, todas as equipas as têm. Tem muito a ver com a nossa consistência defensiva e depois aproveitar algumas fragilidades do adversário”.

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Ficha de Jogo

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FC Porto-Barcelona, 0-1

2.ª jornada do grupo H da Liga dos Campeões

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro:  Anthony Taylor (Inglaterra)

FC Porto: Diogo Costa, João Mário (Nico González, 80′), Fábio Cardoso, David Carmo, Wendell, Alan Varela (Francisco Conceição, 80′), Eustáquio, Romário Baró (Evanilson, 64′), Pepê, Galeno (Iván Jaime, 80′) e Taremi (Danny Namaso, 80′)

Suplentes não utilizados: Cláudio Ramos, Grujic, Jorge Sánchez, André Franco, Fran Navarro, Toni Martínez e Gonçalo Borges

Treinador: Sérgio Conceição

Barcelona: Ter Stegen, João Cancelo, Koundé, Ronald Araújo, Baldé, Oriel Romeu (Sergi Roberto, 69′), Gavi, Gundogan, João Félix (Fermín López, 69′), Lamine Yamal (Marcos Alonso, 80′) e Lewandowski (Ferran Torres, 34′)

Suplentes não utilizados: IñakiPeña, Astralaga, Iñigo Martínez, Christensen e Casado

Treinador: Xavi Hernández

Golos: Ferran Torres (45+1′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a João Cancelo (13′), Fábio Cardoso (28′), Ronlad Araújo (28′), Gavi (36′ e 90+3′), Koundé (47′), João Félix (51′) e Sergi Roberto (86′); cartão vermelho a Gavi (90+3′)

O FC Porto voltou a repetir o onze que utilizou no jogo anterior frente ao Benfica, o que significava que, devido às ausências de Pepe e Marcano, a dupla de centrais ia ser composta por Fábio Cardoso e David Carmo. Romário Baró, a atuar sobre a direita, colocava-se no corredor central quando a equipa tinha bola, transformando o 4x4x2 em 4x3x3. Pepê residiu ao lado de Taremi em organização defensiva e Galeno caiu sobre a esquerda. O Barcelona incluiu João Félix e João Cancelo nas opções iniciais, mas a grande notícia foi que Lamine Yamal, aos 16 anos e 83 dias, tornou-se no jogador mais novo de sempre a jogar a titular na Ligas dos Campeões. Com o objetivo de igualar a agressividade do FC Porto, Xavi Hernández colocou o combativo Oriol Romeu na posição de médio mais recuado.

O Estádio do Dragão usou o tom de voz do Mundial da África do Sul, em 2010, para gritar aos ouvidos de João Félix sempre que o internacional português tocava na bola. Em vez de vuvuzelas, o som era produzido a partir de assobios que não faziam o extremo encolher-se. Pelo contrário, só o deixavam mais espevitado. Melhor que Félix na primeira parte só Galeno que, num jogo sem sentido definido, moía a defesa do Barcelona em ataques rápidos que cedo deixaram Cancelo e Gavi condicionados com amarelos. A cerca de dez minutos do intervalo, Robert Lewandowski saiu com queixas no pé esquerdo. Uma vez dentro do campo, o substituto do polaco, Ferran Torres, precisou apenas de 12 minutos para marcar. Romário Baró, que já tinha feito um túnel a Oriol Romeu para incluir na compilação de melhores momentos da época, não foi capaz de, numa situação bem mais simples, soltar a bola. Em vez disso, o médio portista perdeu a posse para Gundogan que entregou o golo a Ferran Torres (45+1′).

Perante a agressividade que o Barcelona estava a colocar no jogo, o FC Porto respondia com algo mais doce. Taremi fez um passe que não foi açucarado, mas sim diabético para Pepê. O brasileiro estava tão cara a cara com o guarda-redes blaugrana Ter Stegen que foi ludibriado pelos lindos olhos do alemão. Sem se aperceber, o extremo do FC Porto só viu Koundé tirar-lhe a bola numa espécie de roubo por esticão. Houve mais Pepê e mais Taremi na segunda parte e, com isso, a reação dos dragões foi positiva.

Depois de João Mário e Taremi terem atirado pouco ao lado, de Galeno e Wendell terem obrigado Ter Stegen a boas intervenções, o que se verificava era que o Barcelona não mais criou perigo. Conseguida que estava a estabilidade defensiva, era hora de rumar ao empate. Não era de esperar que, pelo passado do lateral no Seixal, Cancelo desse uma mãozinha aos azuis e brancos, mas a verdade é que aconteceu. Dentro de área, o árbitro detetou o toque ilegal do defesa com o braço e assinalou penálti. No entanto, a lupa do VAR viu que Eustáquio tinha feito o mesmo instantes antes. Seguiu-se um simulacro de festejo. Taremi, com uma execução perfeita de pontapé de bicicleta, marcou. Entre os adeptos dizerem a primeira sílaba e a segunda da palavra golo, o árbitro assistente levantou a bandeira e anulou o lance. Gavi ainda foi expulso ao ver o segundo cartão amarelo, mas já nada impediu o Barcelona de chegar aos seis pontos e sair do Dragão como líder isolado do grupo H da Liga dos Campeões, aplicando a segunda derrota consecutiva ao FC Porto.