A juiza Dora Lucas Neto afirmou, esta segunda-feira, ter sido convidada para se candidatar ao Tribunal Constitucional antes de 7 de novembro”e considerou deselegante que Chega e IL tenham criticado a oportunidade desta eleição em período de crise política.

Na audição na Comissão parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, prévia à eleição marcada para quarta-feira, os deputados Pedro Pinto (Chega) e Patrícia Gilvaz (IL) lamentaram que a eleição do juiz em falta desde junho para o TC se faça num período em que o Governo está demissionário e com a dissolução à vista.

“Estivemos meses à espera de eleger um juiz do TC, qual seria o problema de esperar mais uns meses? Não nos parece ético que seja agora, com eleições já marcadas, que estejamos a nomear juízes para o TC”, criticou Pedro Pinto, ao mesmo tempo que elogiou a “riqueza de currículo” de Dora Lucas Neto.

Também a deputada da IL lamentou que o PS tenha indicado, depois de meses de espera, uma candidata a juíza do TC “com um primeiro-ministro e um Governo demissionários”, e o parlamento se prepare para eleger “um juiz para um mandato de nove anos” quanto tem a sua dissolução prevista para meados de janeiro.

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Na resposta conjunta às perguntas de todas as bancadas, a juíza conselheira no Supremo Tribunal Administrativo fez questão de fazer um ponto prévio.

“Eu aceitei esta candidatura antes do dia 7 de novembro, manifestei-me disponível para aqui vir e apresentar o meu currículo. Ou seja, não tendo deixado de ser juíza e perdido nenhuma das minhas qualidades nestas três semanas, eu julgo que é de facto de uma deselegância, é muito desconfortável ser confrontada com essa questão”, afirmou, dizendo saber que a matéria ficou fechada na conferência de líderes parlamentares.

Dora Lucas Neto sem “programa nem ideologia” e preparada para “convencer e ser convencida”

Na mesma audição, a candidata ao TC assegurou que “não tem programa nem ideologia” e disse que em todos os processos de decisão colegial é preciso estar preparada a “convencer e ser convencida”. Além disso, a juíza conselheira no Supremo Tribunal Administrativo não respondeu a perguntas dos deputados relativas a matérias concretas, como os metadados ou a despenalização da morte medicamente assistida.

“Por muito que gostasse de discutir questões que ou estão ou podem vir a estar pendentes no TC ou que são questões fraturantes, eu tenho a minha predisposição, a minha pré-compreensão, mas como juíza estou habituada a afastar-me delas no processo de formação dos meus juízos sobre os casos que vou decidir”, afirmou.

À pergunta o que pode uma juíza administrativa aportar ao TC, Dora Lucas Neto salientou que o processo de formação de um juízo num tribunal superior “é um processo deliberativo e colegial”. “Não há outra atitude a ter, a pessoa tem de estudar, tem de formar a sua opinião, e tem de estar preparado para convencer e ser convencida”, defendeu.

A juíza salientou ter sido “uma grande honra” ter sido indicada como candidata ao TC e destacou, além do seu currículo académico e profissional, algumas características pessoais. “Aprendi à minha custa que o mundo se divide entre quem cria problemas e quem resolve problemas”, disse.

Dora Lucas Neto salientou a “importância indiscutível do TC como guardião da Constituição, na defesa intransigente do Estado de direito e dos direitos fundamentais dos cidadãos”. “Sinto-me capaz de contribuir para este propósito caso venha a ser eleita. Não tenho, como juíza e muito menos como candidata a juíza do TC, nem programa nem ideologia de que possa dar noticia”, disse, assegurando “absoluta independência” para julgar todos os processos “segundo o caso concreto e o direito aplicável”.

Em resposta à deputada da IL Patrícia Gilvaz, que lamentou que quando o PS a indicou tenha invocado entre os argumentos o equilíbrio de género no TC (ao mesmo tempo que afastou, no processo de revisão constitucional, quotas para este tribunal), Dora Lucas Neto disse que não a ofendia nada que a sua escolha tenha sido assim noticiada.

“Venho de uma família em que as mulheres não estudaram, é muito importante não colocarmos isto num segundo plano”, disse, sendo saudada quer pela deputada do PS Isabel Moreira quer pela do PSD Mónica Quintela.

A 17 de novembro, o PS anunciou que indicou Dora Lucas Neto como candidata a preencher o lugar deixado vago no TC por Maria da Assunção Raimundo, que renunciou ao cargo em junho.

PS indica juíza Dora Lucas Neto para o Tribunal Constitucional

A eleição de Dora Lucas Neto, por voto em urna e secreto, está marcada para quarta-feira e exige o voto favorável de “dois terços dos deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções”.

O primeiro-ministro apresentou a sua demissão em 7 de novembro, por causa de uma investigação judicial sobre a instalação de um centro de dados em Sines e negócios do lítio e do hidrogénio, que levou o Ministério Público a instaurar um inquérito autónomo no Supremo Tribunal de Justiça em que é visado.

Perante essa decisão, que aceitou, o Presidente da República anunciou que vai dissolver o parlamento e marcar eleições legislativas antecipadas para 10 de março.

Contudo, Marcelo Rebelo de Sousa decidiu adiar a demissão formal do Governo, que é feita por decreto, para permitir a aprovação final do Orçamento do Estado para 2023, marcada para 29 de novembro, e a sua entrada em vigor. Só nessa altura o executivo ficará limitado a atos de gestão.