E-mails da Presidência tornados públicos por uma investigação da TVI/CNN Portugal revelaram novos dados sobre o caso das gémeas lusobrasileiras que receberam um tratamento milionário para atrofia muscular espinhal em Portugal, em 2019. A principal novidade está no facto de que, ao contrário do que referiu aquando da sua comunicação ao país a 4 de dezembro, Marcelo Rebelo de Sousa recebeu vários e-mails sobre o caso, antes e depois de encaminhar o assunto para os serviços sociais da Presidência e para o governo, e que terá, segundo comunicações de Nuno Rebelo de Sousa, discutido o tema com o filho ao longo do processo.

Uma das principais revelações contidas nos emails é o envolvimento assumido de Nuno Rebelo de Sousa no processo de obtenção de nacionalidade das gémeas, algo que até aqui não era conhecido. Ao mesmo tempo, os emails trocados com Belém indicam que as gémeas obtiveram a nacionalidade com o expresso propósito de virem a Portugal receber o tratamento — e não, como era alegado até aqui, antes do diagnóstico.

O processo começa com uma comunicação enviada por Rebelo de Sousa ao pai e Presidente da República a 21 de outubro de 2019, na qual pede expressamente ajuda a Marcelo:

…Os pais destas gémeas luso-brasileiras de 9 meses com atrofia muscular espinhal são muito amigos de uns amigos nossos e nas últimas semanas temos estado 100% focados tentando ajudar as gémeas a conseguir os cartões de cidadão portugueses, o que já está. (…) Agora precisamos de uma ajuda maior para que elas consigam o único tratamento no mundo que as pode salvar. O pai pode ajudar? A burocracia em Portugal é grande e os pais das crianças estão preocupados porque não têm muito tempo para as salvar”, lê-se.

Ao todo, o Chefe de Estado terá recebido um total de cinco e-mails ao longo dos dez dias da sua atuação, que tinha delineado numa comunicação ao país a 4 de dezembro. Na altura, Marcelo disse ter recebido o referido e-mail de 21 de outubro de 2019, reencaminhando o caso para o Chefe da Casa Civil e para Maria João Ruela, assessora para os assuntos sociais das comunidades. A partir daqui, a questão teria sido tratada ao nível da Casa Civil até sair de Belém, a 31 de outubro.

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Alguns destes e-mails, segundo a investigação, foram endereçados diretamente ao Presidente; noutros, o endereço de Marcelo aparecia em conhecimento nas conversas entre Nuno Rebelo de Sousa e os serviços da Presidência. O primeiro indica ainda a existência de conversas com o pai paralelas a estes e-mails — numa das comunicações surge a frase “falei com o meu pai há pouco”.

As comunicações arquivadas demonstram ainda um envolvimento maior do filho de Presidente do processo do que aquele que tem vindo a ser alegado. Recorde-se que a mãe das gémeas já tinha dito no passado que não conhecia pessoalmente Nuno Rebelo de Sousa nem tinha quaisquer contactos da Presidência e que apenas conhecia a mulher do filho de Marcelo.

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As trocas agora tornadas públicas contrariam esta versão dos factos e demonstram que Nuno Rebelo de Sousa se envolveu diretamente com as tentativas de ajudar as gémeas a receber o milionário medicamento Zolgensma, com um custo de 4 milhões de euros para ambas.

Num dos e-mails enviados para os serviços de Belém, o filho de Marcelo diz por duas vezes que sabe que os pais das gémeas ainda não foram contactados e pede por indicações sobre o que lhes deve dizer, acrescentando num outro momento que “o pai das crianças está na disposição de ir a Portugal saber se tem alguma chance de conseguir o tratamento caso as crianças se mudem agora para Portugal”.