Primeiro, durante a passagem inicial de seis anos pelo Benfica. A seguir, no projeto de três anos interrompido da pior forma no Sporting. Por fim, num ano que não mais esquecerá na carreira no comando do Flamengo. Jorge Jesus teve sempre aquela esperança que chegar a um grande clube europeu ao longo de todo o trajeto de mais de três décadas como treinador. Inglaterra nunca foi algo que lhe despertasse um particular gosto, Alemanha é uma liga que valoriza mas onde não se via, França também não constituiu um chamariz tendo em conta que em 2015 Luís Filipe Vieira, amigo e então presidente dos encarnados, tentou colocá-lo no PSG com passagem pelo Qatar. Aquilo que mais queria sempre foi bem mais próximo e chamava-se (ou chama-se) Espanha. Era na La Liga, entre Madrid e Barcelona, que se via na projeção do ponto mais alto de todo o seu trabalho. Nunca aconteceu. No entanto, nem por isso o treinador deixa cair essa ambição.

Jesus, o aprendiz de soldador que fez do futebol uma ciência durante 50 anos e a tornou exata em cinco meses

Desportivamente, as coisas têm corrido bem ao técnico que, aos 69 anos, ainda consegue bater recordes na Arábia Saudita. Depois da passagem pelos turcos do Fenerbahçe, onde ganhou uma Taça da Turquia, Jorge Jesus teve uma proposta para comandar a seleção saudita mas preferiu regressar ao clube por onde tinha passado após sair do Sporting, o Al Hilal. As condições são diferentes, com uma constelação de estrelas à mistura que entretanto perdeu aquela que mais brilhava por lesão (Neymar) mas que vai ganhar mais um nome forte no regresso das competições com a contratação de Renan Lodi para a lateral esquerda, e todos os resultados acabaram por multiplicar-se, numa série que se mantém em aberto desde setembro.

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Al Hilal soma 18ª vitória consecutiva e Jorge Jesus iguala recorde obtido na Luz

Nessa fase e, apenas numa semana, o conjunto de Riade teve uma entrada em falso na Liga dos Campeões da Ásia com um empate caseiro conseguido somente nos descontos diante do Navbahor, do Usbequistão, e não foi além de uma igualdade para a Liga com o Damac, que permitiu uma aproximação dos seguidores diretos pela liderança. A partir daí, tudo mudou de forma radical – até agora. Entre Campeonato, Champions asiática e Taça do Rei, o Al Hilal leva 20 vitórias consecutivas, o que permitiu que Jorge Jesus batesse o seu recorde de 16 no Benfica e alcançasse, para já, a oitava melhor série de sempre com condições para subir ainda mais perante as 21 do Manchester City em 2020/21, as 22 do Real Madrid em 2014 ou as 23 do Bayern em 2020 (o registo máximo é dos galeses do New Saints com 27). Agora, o desafio do técnico era outro.

Aproveitando a paragem nas competições oficiais devido à Taça Asiática de seleções, o Al Hilal defrontava em Riade os norte-americanos do Inter Miami, equipa que ganhou outra dimensão com a chegada de Lionel Messi aos EUA e que foi sendo reforçada por outros nomes próximos do argentino e com passagem pelo Barcelona como Busquets, Jordi Alba e mais recentemente Luis Suárez. Apesar de não ter a equipa com todas as opções (longe disso), o português tinha outra boa oportunidade para se “mostrar” como treinador frente ao jogador com mais Bolas de Ouro de quem não guardava boas recordações dos confrontos diretos mas que colocava a par de Cristiano Ronaldo num patamar acima de todos os outros jogadores. Antes, o treinador passou por Portugal, viu o Benfica-Sp. Braga na Luz e mostrou-se preocupado… com o país.

“Voltar a Portugal? Claro que sinto falta do meu país, sou 100% português. Mas Portugal está muito confuso. Não vou entrar em questões políticas mas não pretendo neste momento voltar a Portugal. No que diz respeito à Europa, acho difícil, porque o futuro dos melhores jogadores e treinadores é na Arábia Saudita. O motivo? Não sei. O que sei é que ninguém vai querer sair da Arábia Saudita. A Arábia Saudita não é aquilo que os portugueses pensam. Em Portugal pensa-se que na Arábia não há liberdade nenhuma e que as mulheres andam todas tapadas, mas não é verdade. É um país muito seguro e cada vez mais vai ser uma potência muito forte. Quem vai a Riade, vai dizer que isto cresce como cogumelos”, atirou no aeroporto.

“O jogo de amanhã [segunda-feira] com o Inter Miami é um dos jogos mais importantes para nós, não apenas dentro do relvado, mas também fora dele. É um fenómeno global organizado pelos melhores do mundo, com transmissão à escala global. É uma oportunidade para mostrar o desenvolvimento que este país atingiu. É pena estarmos a sofrer com muitos jogadores ausentes, são 11 só nas seleções. Tenho treinado apenas com 12 jogadores mas vamos dar tudo para ganhar”, tinha comentado agora na antecâmara do jogo que iniciava também a digressão pelo país do Inter de Miami, que na quinta-feira defronta o Al Nassr, e que na entrada das equipas em campo teve um cumprimento especial entre o técnico português e Lionel Messi, argentino a quem chamou de “Baixinho” quando quis saudar depois de um jogo entre Barcelona e Sporting.

Se para os norte-americanos este era apenas mais um teste de pré-época, os sauditas levaram a sério o jogo (como se viu nas indicações que Jesus ainda dava aos jogadores antes do apito inicial) e chegaram cedo ao 2-0 com golos de Mitrovic (10′) e Abdullah Al-Hamdan, um dos jogadores que aproveitou as ausências para ganhar espaço nas opções (13′), entre uma exibição de encher o olho de Milinkovic-Savic. Luis Suárez ainda reduziu no primeiro tempo (34′) e Messi viu um golo anulado por fora de jogo no início da jogada mas seria Michael a aumentar de novo a vantagem em mais uma lance em que a defesa do Inter Miami mostrou todas as suas fragilidades (44′). Tudo parecia resolvido mas Messi decidiu abrir o livro no segundo tempo, fazendo o 3-2 de penálti (54′) e estando na jogada do empate marcado por David Ruíz, outra das grandes figuras da partida (55′). Ficava tudo em aberto entre oportunidades falhadas e bolas no poste até que Malcolm, aos 88′, marcou o 4-3 final para festa do público saudita… e mais um abraço entre Jorge Jesus e Messi.