Ao todo, foram quase dois minutos. O jornalista fazia a pergunta em francês, a tradutora começava a fazer a passagem para espanhol mas chegava a determinada altura e não conseguia perceber ao certo o que estava a ser questionado. Foi assim uma vez, duas vezes, três vezes e já era Luis Enrique que tinha tomado conta das operações, bem mais sorridente do que é habitual nas últimas conferências, a pedir calma à tradutora para que conseguisse entender, a olhar para a sala e a conseguir “desbloquear” tudo com um outro jornalista espanhol na sala a fazer a tradução possível a algo que todos já tinham mais ou menos percebido: Kylian Mbappé vai ser substituído durante o jogo como na Ligue 1 ou por ser uma partida de Champions vai ser diferente? Tanta coisa para uma resposta de segundos: “Pode ser que sim, pode ser que não… Vamos ver”.

Melhor do que o Mbappé que está no banco, só mesmo o Mbappé que está em campo: PSG vence Real Sociedad em Paris

O episódio do último nulo frente ao Mónaco, naquele que foi o segundo jogo seguido sem ganhar do PSG, ainda estava vivo na memória de todos. Ao intervalo dessa partida no Principado, Luis Enrique abdicou do avançado ao intervalo apesar de haver uma completa nulidade em termos ofensivos na equipa que não teria tendência para melhorar sem o número 7 e o internacional francês também não se mostrou preocupado, surgindo dos balneários ao telefone e atravessando a pista a saudar os adeptos monegascos que o aplaudiam até ir ver o resto do jogo para a bancada ao lado da mãe (e empresária). Desta vez a novela do costume vai ter o final há muito prometido, com Mbappé a cumprir o sonho de mudar-se para o Real Madrid. Até Emmanuel Macron, presidente francês que terá sido providencial para a última renovação do avançado, já assumiu essa “derrota” e o técnico espanhol, sempre confortável nesses contextos, também prepara o futuro.

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Mbappé saiu ao intervalo, foi para bancada e já prepara Madrid entre os lamentos de Macron. “Temos de saber jogar sem ele”, diz Luis Enrique

“Quando considerar oportuno ser opção e jogar ou não, vou fazê-lo, como acontece com todos os treinadores. Mais tarde ou mais cedo isto vai acontecer, em algum momento teremos de apresentar a jogar sem o Kylian”, referiu na zona de entrevistas rápidas após o empate com o Mónaco. “Mais uma vez, mais tarde ou mais cedo teremos de nos ir acostumando a jogar sem o Kylian. Estou a tratar das melhores opções para a equipa. Talvez seja um equívoco, talvez não. A minha filosofia passa por pensar sempre naquilo que é o melhor para a equipa. Não há discussões, não quero discutir, é a minha decisão. É uma decisão 100% técnica, minha. Não há nenhum problema como o Mbappé, trata-se apenas de uma forma de gerir uma situação da maneira que considero melhor”, acrescentou depois na conferência de imprensa após a partida.

O tabu ficou desfeito e Luis Enrique mostrou que tem mais fama do que proveito em relação a quem o chama de teimoso nas opções que toma. Ou seja, o técnico sabe que, numa perspetiva de futuro, é importante que a equipa do PSG aprenda a jogar sem a sua principal referência mas, ao mesmo tempo, reconhece que Kylian Mbappé é a maior valia que tem para os encontros decisivos da Liga dos Campeões. O avançado, mais uma vez, não se fez rogado. E mais do que decidir uma partida que voltou a ter pouca história com mais dois golos que o colocam como melhor marcador desta Champions, deu nas vistas por um sprint onde se estima que fez 10,9 segundos aos 100 metros, menos um segundo do que o recorde mundial de Usain Bolt…

Antes, Mbappé jogou. Jogou e jogou muito. Atuando mais descaído sobre a esquerda de um ataque que tinha ainda Barcola e Dembélé, o avançado começou por fazer uma assistência a isolar Barcola que não passou a oposição de Álex Remiro (9′) e não demorou a inaugurar o marcador, numa grande jogada individual da esquerda para ao meio antes de um remate em arco que deixou o guarda-redes basco “pregado” ao chão e a rede da junção ao poste rebentada com o impacto do disparo disferido de pé direito (15′). Ainda na primeira parte Remiro evitou mais um do internacional francês mas não conseguiu fazer o mesmo já no segundo tempo quando Fabián Ruíz lançou o número 7 em velocidade para mais uma correria em direção da baliza que só terminou com o 2-0 (56′). A partida e a eliminatória estavam há muito decididas mas, num momento em que os adeptos da Real Sociedad cantavam o hino de cachecóis no ar a mostrar o orgulho na campanha da equipa, Mikel Merino ainda conseguiu marcar o golo de honra (89′).

Sendo certo que esta formação basca atravessa uma fase que fica a anos luz daquele que viveu durante todos os encontros dos grupos, o PSG mostrou-se à altura do desafio que tinha pela frente e conseguiu quebrar essa série de duas derrotas seguidas nos oitavos da Liga dos Campeões, um eterno objetivo por atingir por parte dos franceses. E com uma certeza: mesmo num contexto de preparação de mudança anunciada, a equipa da capital gaulesa é muito melhor tendo a sua principal referência, que leva seis golos nesta edição da Liga dos Campeões e um total de 34 noutros tantos encontros esta temporada, em campo e como capitão.