Lewis Hamilton nunca teve receio de expressar opiniões. Desde a crítica às etapas de Fórmula 1 que acontecem em países em que o respeito pelos direitos humanos não é garantido à condenação absoluta do racismo e ao apoio às causas LGBTQ+, o piloto britânico sempre deixou claro o que pensava sobre os assuntos mais fraturantes da sociedade. E não mudou de atitude na hora de olhar para dentro da própria indústria.

Esta quinta-feira, em Melbourne e na antecâmara do Grande Prémio da Austrália, Lewis Hamilton foi questionado sobre a legitimidade da liderança de Mohammed Ben Sulayem, o antigo piloto dos Emirados Árabes Unidos que é o atual presidente da FIA. O contexto, contudo, era bastante específico: a queixa-crime apresentada contra o organismo por Susie Wolff, diretora da F1 Academy e mulher de Toto Wolff, na sequência da investigação a alegadas trocas de informação confidencial entre o casal.

“Vou defender aquilo em que acredito mesmo que isso me possa matar.” Hamilton aproveitou os 10 anos de Mercedes para deixar uma promessa

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

“Ele nunca foi a pessoa certa para estar à frente da FIA. Existe uma verdadeira falta de responsabilização neste desporto, dentro da FIA. Existem coisas a acontecer à porta fechada, não existe transparência, não há responsabilização e nós precisamos disso. Os fãs precisam disso. Como é que podes confiar na modalidade e em tudo o que aqui acontece se não tens isso?”, atirou o piloto da Mercedes, que parecia estar a referir-se à situação de Susie Wolff, mas também ao caso de Christian Horner, o team principal da Red Bull que foi recentemente acusado de comportamento inapropriado com uma funcionária (entretanto dispensada) e acabou ilibado e em funções.

Sobre Susie Wolff, a mulher do team principal da Mercedes, Lewis Hamilton mostrou-se “incrivelmente orgulhoso”. “Ela é muito corajosa e defende ótimos valores. É uma líder. E é uma grande mensagem o facto de se defender num mundo onde as pessoas são silenciadas tantas vezes. Espero que esta atitude dela crie mudança, que tenha um impacto positivo, especialmente para as mulheres”, começou por dizer.

Toto Wolff, diretor da Mercedes, investigado por receber informações confidenciais da mulher, diretora da F1 Academy

“Esta ainda é uma modalidade dominada pelos homens. E ainda estamos a viver num tempo em que a mensagem é que se apresentas uma queixa, és despedido. E essa é uma narrativa terrível que estamos a projetar para o mundo, especialmente quando queremos tanto falar sobre inclusividade na modalidade. Precisamos de garantir que nos mantemos fiéis aos nossos valores de base”, acrescentou Hamilton.

A queixa-crime de Susie Wolff contra a FIA deu entrada no início do mês e foi tornada pública esta quinta-feira. Em dezembro do ano passado, Susie e Toto Wolff foram os visados numa investigação do organismo sobre um potencial conflito de interesses — em causa estava a possibilidade de o casal, a diretora da F1 Academy e elemento da Formula One Management e o team principal da Mercedes, estarem a trocar informação confidencial.

Ambos negaram todas as acusações e, apenas 48 horas depois do início da investigação, a FIA concluiu que o caso nem sequer tinha base para interrogatório. “Posso confirmar que apresentei pessoalmente uma queixa-crime na justiça francesa em relação às declarações feitas sobre mim por parte da FIA no passado mês de dezembro. Ainda não existiu transparência ou responsabilização em relação à conduta da FIA e dos seus elementos sobre esta matéria. Sinto que, agora mais do que nunca, é importante defender-me, sublinhar comportamentos inapropriados e ter a certeza de que as pessoas são responsabilizadas. Ainda que alguns possam pensar que o silêncio os absolve da responsabilidade”, disse agora a britânica de 41 anos.

Na altura, em resposta às primeiras alegações, Susie Wolff mostrou-se desde logo “profundamente insultada, mas infelizmente pouco surpreendida”. “É desanimador que a minha integridade seja colocada em questão desta forma, especialmente quando tudo parece estar enraizado num comportamento intimidatório e misógino, concentrado no meu estado civil e não nas minhas capacidades. Ao longo da minha carreira no automobilismo, deparei-me e ultrapassei vários obstáculos e recuso-me a permitir que estas alegações vazias manchem a minha dedicação e paixão pela F1 Academy. Rejeito estas alegações da forma mais veemente possível”, sublinhou, em comunicado.