O líder do PS deixa nove avisos a Luís Montenegro sobre os próximos tempos políticos, começando pelo que mais tem repetido de rejeitar qualquer pressão sobre o PS para “suportar o Governo”. Mas depois passa para o Orçamento do Estado, em que aconselha o PSD a não misturar carreiras da função pública com essa discussão e avisa que a redução do IRC não é a única coisa que separa socialistas e sociais-democratas. Foi a tudo, até a um apoio mais claro de Paulo Rangel a uma eventual candidatura de António Costa à presidência do Conselho Europeu.

É praticamente uma lista que, na entrevista à TVI/CNN Portugal, deixou ao novo primeiro-ministro que começou logo por considerar ter respondido com “arrogância” à carta que lhe enviou esta manhã a desafiar para um acordo na valorização de salarial e de algumas carreiras da função pública, pedindo “humildade” à AD — segundo aviso. “Quase remete o PS para uma mera função de, no final do processo, firmar um acordo”, descreveu Pedro Nuno que avisa: “Este Governo não tem uma maioria que lhe permita ter essa atitude na relação com o PS.”

Montenegro mostrou-se, no entanto, disponível para conversar, mas Pedro Nuno não quer que essa conversa seja contaminada pela discussão do Orçamento do Estado, pelo que quer tudo fechado até julho. Aliás, disse mesmo de forma muito clara que “seria um erro deixar estas matérias para o Orçamento do Estado porque há condições de resolvê-las de forma autónoma”, já que são assuntos que geram consenso em várias bancadas e podem ter resposta no imediato — terceiro aviso.

Pedro Nuno Santos escreveu a Montenegro a propor acordo até julho

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Levar Programa de Estabilidade a “votos seria provocação ao PS”

E um dos capítulos onde aconselha Montenegro a ter uma atitude diferente é na discussão que se avizinha no Parlamento, logo depois do Programa de Governo. Se para este primeiro confronto, no final desta semana, o PS já sinalizou que não vai travar a entrada em plenas funções do Executivo de Montenegro, já no Programa de Estabilidade avisa que é melhor que não vá a votos — quarto aviso.

O Programa que o Governo terá de entregar este mês em Bruxelas tem de ser discutido no Parlamento e pode ir a votos, via projeto de resolução (que funciona como uma recomendação ao Governo), caso alguma bancada o submeta a isso. E o líder socialista avisa já que o PS não o fará e que “é importante que o Governo não se coloque num beco sem saída” — a expressão já tinha sido usada na semana passada, na reação ao discurso de tomada de posse de Montenegro — e que “não é avisado” levá-lo a votações, já que isso seria entendido como “uma provocação ao PS” — quinto aviso.

O Programa de Estabilidade terá o plano do Governo para o médio prazo, mostrando como pretende garantir a estabilidade orçamental de acordo com as regras europeias e o líder socialista tem sublinhado que as perspetivas do PS e da AD são “distantes” em matérias económica e financeira. Voltou a fazê-lo nesta entrevista, muito concretamente quando falou no Orçamento do Estado para o próximo ano.

Pedro Nuno Santos sacode pressão de “suportar” Governo e avisa que Montenegro está a vitimizar-se já a pensar em eleições

O líder socialista tudo faz para separar o PS da responsabilidade por uma eventual futura crise política, mas não garante a viabilização da proposta de Orçamento que o Governo vier a apresentar para o próximo ano. Nesta matéria mantém a ideia do “praticamente impossível”, onde o advérbio de modo só está porque a proposta ainda não é conhecida, porque o “impossível” tem um enorme peso: “É muito difícil por questões de ordem programática”, detalha.

Um dos pontos que mais afasta as duas frentes é a redução do IRC que a AD tinha no seu programa e que o PS sempre considerou como “um rombo” para os cofres do Estado, quando há investimento em serviços públicos que quer priorizar. Mas Pedro Nuno Santos não resume a este tema o que cimenta a viabilização quase “impossível” do próximo Orçamento. “O IRC não é a única coisa que nos distingue da AD” — sexto aviso. Afinal também há “visões muito diferentes” no SNS, atirou na entrevista. O que não considera “nem correto nem justo” — mais uma vez — é que se exija ao PS a viabilização de Orçamentos à mesma direita que disse que queria mudar tudo o que os socialistas fizeram nestes oito anos.

Mas também diz, o sétimo aviso, que governar em duodécimos (caso o Orçamento chumbe), “não é desejável para o país”. E, por fim, no oitavo aviso, diz que o PSD não deve contra com o PS para aprovar a privatização total da TAP. É um dossiê que tutelou (nas Infraestruturas) e pelo qual até caiu (depois da polémica indemnização à ex-administradora da companhia, Alexandra Reis), mas sobre a privatização total avisa a AD que precisa de maioria e que não conte com o PS para a formar no Parlamento.

Pedro Nuno acha que Rangel pode fazer mais por Costa

O nono aviso que deixou foi mais político, quando falava nas hipóteses europeias de António Costa — depois de ter voltado a pedir “celeridade” da Justiça quanto ao seu processo — e sugeriu que a posição manifestada pelo Governo português foi insuficiente. Quando questionado sobre se Costa seria um bom nome para a presidência do Conselho Europeu, Pedro Nuno disse que “seria um ganho muito importante para a UE e para Portugal”. Depois, disse que ouviu Paulo Rangel, ministro dos Negócios Estrangeiros, dizer que Costa não terá apreciação negativa, mas que gostaria de ver mais do que isso: “Uma apreciação positiva e proativa”.

Mas não deixa claro se conta com Costa nas listas para as Europeias. Atirou o assunto para lá do debate do Programa do Governo e diz apenas que ser apontado a presidente do Conselho “não é incompatível” com uma candidatura nas listas do PS, ao mesmo tempo que não quer alimentar “a especulação” sobre o assunto.

Contra inquérito às gémeas

Terminou com dois casos mais políticos. Um da última semana, o caso das gémeas luso-brasileiras. e outro desta segunda-feira, Passos Coelho na apresentação do livro  “identidade e família”, onde também esteve André Ventura. Quanto às gémeas e o inquérito parlamentar proposto pelo Chega, mostrou que é contra. “Está-se a banalizar o exercício da comissão parlamentar de inquérito”, atirou para logo depois concluir que “a Comissão de inquérito não vai acrescentar nada a este tema”. E é com esta posição de partida mais crítica que vai levar o tema à consideração da bancada parlamentar.

Quanto a Passos, diz ser “assustador que um ex-primeiro-ministro tenha alinhado num discurso de extrema-direita”. E garante que “a esquerda e o PS não impõem uma visão de família a ninguém”, acusando a “direita de estar a impor uma determinada visão da sociedade e da família”, quando “há muitas formas de família”. Não tem dúvidas que “Pedro Passos Coelho e a direita tradicional estão a assumir bandeiras da extrema-direita, do Chega” e rejeita que Ventura lidere a oposição neste momento, chamado-lhe antes “chefe da confusão”.

Ainda antes de terminar, o socialista enredou-se no caso da Madeira, condenado Miguel Albuquerque — que “não inspira confiança” e não devia ser recandidato na Madeira –, mas sem saber o que dizer sobre um caso de justiça bicudo no PS, Eduardo Vítor Rodrigues, o autarca de Gaia condenado por peculato em primeira instância (que recorreu).  O socialista “não é, neste momento, candidato a nenhuma função política”, defendeu-se o líder do PS que tenta, assim, diferenciar-se do que se passa no PSD-Madeira.