O “pacto” de Romero Jucá, referido pelo ministro do Planeamento em conversa libertada esta segunda-feira pelo jornal Folha de S. Paulo, está a aumentar as tensões no Congresso entre os defensores do governo interino de Michel Temer e os partidos da oposição. Em causa está a conversa gravada de forma oculta entre Jucá e Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, empresa subsidiária da Petrobras, em que sugere que uma mudança na Presidência do Brasil resultaria num “pacto” para “estancar a sangria” da Operação Lava Jato. Segundo a publicação, a conversa aconteceu dias antes da votação da abertura do impeachment de Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados, em março.
Para o líder do PT na Câmara dos Deputados, Afonso Florence, o conteúdo da conversa “não surpreende” porque a “dimensão conspirativa do golpe era nítida”.
De alguma forma, a gravação não surpreende, porque a dimensão conspirativa do golpe era nítida. A novidade é que agora está nas palavras dele. […] Ali tem crimes como obstrução da Justiça, ataque à democracia e comprova que foram eles quem lideraram o ataque à Petrobras”, afirmou citado pelo site G1.
Florence acredita que a gravação “fez a máscara do golpe cair”, mas que “é preciso que observe o processo legal e seja garantido a ele [Romero Jucá] o direito de defesa”.
O senador Humberto Costa, ex-líder do governo de Dilma Rousseff no Senado, manteve o mesmo tom crítico ao afirmar que a destituição de Dilma Rousseff terá como objetivo “obstruir a justiça”.
A fala de Romero Jucá corrobora aquilo que sempre denunciamos: esse golpe foi articulado para, entre outras coisas, obstruir a justiça e asfixiar o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal. O diálogo divulgado é uma confissão clara disso. (…) Sua sinceridade é escandalosa até mesmo para esse governo descarado”, defende em entrevista ao site.
Foi Golpe Sim. Áudios de @romerojuca provam q combate à corrupção nunca foi objetivo dos golpistas ao tirar @dilmabr https://t.co/8YmMNSaKuS
— PT Brasil (@ptbrasil) May 23, 2016
O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) avançou esta segunda-feira que vai entregar à Procuradoria-Geral da República (PGR) do Brasil um um pedido de prisão contra o ministro. Para o presidente nacional do PSOL, Luiz Araújo, as gravações não deixam dúvidas de que o impeachment está a ser usado para exterminar as investigações da Operação Lava Jato. “O PSOL não reconhece [Michel] Temer como Presidente e nem os corruptos que o acompanham. O mínimo que a PGR deve fazer é pedir a prisão de Jucá. O mínimo que o STF [Supremo Tribunal Federal] deve fazer é acatar o pedido”, lê-se em comunicado de imprensa. O PSOL é um partido de esquerda, que não fazia parte da base de governo do então governo de Dilma Rousseff e que votou contra a abertura do processo de destituição da Presidente afastada na Câmara dos Deputados.
PSOL pedirá prisão de Romero Jucá por conteúdo de áudios divulgados https://t.co/dletxLIz5K
— PSOL 50 (@psol50) May 23, 2016
Já os deputados que pertencem à base de apoio ao governo de Michel Temer preferiram adotar um discurso mais moderado. Foi o caso de André Moura, filiado ao partido PSC e líder do governo interino na Câmara dos Deputados.
Eu tomei conhecimento do conteúdo da gravação somente pela imprensa. Acho que o ministro Jucá terá a oportunidade de se explicar. Não se pode antecipar questões neste primeiro momento, temos de ouvir as explicações e ele as dará, de maneira correta. A nossa preocupação agora é trabalhar para que este facto não contamine o processo de votações tanto na Câmara quanto no Senado”, explicou ao G1.
O deputado Carlos Marun, do PMDB, reconhece que a conversa é “preocupante”, mas que não leu na transcrição da gravação nenhuma revelação que pudesse comprometer o governo de Michel Temer.
Não vi, no que foi revelado, alguma situação bombástica ou o planejamento de alguma ação. Achei que foi uma conversa genérica e temos que apoiar a decisão que o presidente [em exercício] Michel Temer vier a tomar. (…) Não é uma tragédia, mas também não é algo positivo. Melhor seria se não tivesse acontecido, mas a questão tem que ser tratada com rapidez e serenidade. Eu acho que a investigação na Lava Jato não pode ser considerada um atestado de culpa, senão, vamos subverter o próprio estado de direito”, assegurou à publicação.
Por meio de comunicado de imprensa, o senador João Capiberibe (PSB) foi mais longe ao dizer que “o Estado Brasileiro está contaminado por agentes da corrupção” e propôs eleições gerais antecipadas em outubro, quando se realizam as próximas eleições municipais. “Temer deve admitir a sua fragilidade, procurar a presidente afastada Dilma Rousseff e propor uma negociação, que passa pela realização de novas eleições em outubro para presidente, vice-presidente e também para o Congresso Nacional”.
O ministro Luis Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal, citado por Jucá como parte do “pacto”, disse num seminário promovido pela revista Veja, esta segunda-feira, que é “impensável” supor que alguém, de maneira individual, possa paralisar as instituições brasileiras ou ter acesso a um ministro do Supremo para “parar determinado jogo.”
“As instituições despertaram e passaram a funcionar melhor, de modo que é impensável nos dias de hoje supor que alguém tenha individualmente a capacidade de paralisar as instituições ou pensar que qualquer pessoa tenha acesso a um ministro do Supremo para parar determinado julgo”, assegurou, citado pela Agência Brasil.
Jucá “tranquilo” à espera da decisão de Temer
Apesar de já se ter manifestado, esta segunda-feira, sobre a gravação libertada pelo jornal Folha de S. Paulo, Romero Jucá realizou uma conferência de impressa onde voltou a negar ter cometido qualquer “tipo de ação que possa paralisar qualquer investigação [contra ele] seja ela na Lava Jato ou outra”. Segundo o ministro, as suas declarações foram tiradas do contexto pelo jornal brasileiro.
Não tenho nada a temer, não devo nada a ninguém. Se tivesse medo, se tivesse telhado de vidro, não teria assumido a presidência do PMDB num momento de confronto com o PT para ajudar a afastar a presidente da República. Se tivesse medo de briga, não estaria nesse processo da forma como entrei”, declarou Jucá.
Romero Jucá disse ainda que estava tranquilo e reafirmou que não se demite, enquanto o Presidente interino do Brasil, Michel Temer, entender que tem condições para continuar à frente do Ministério do Planejamento. “O cargo de ministro é uma decisão do presidente Michel Temer. Vou exercê-lo na plenitude enquanto entender que tenho a confiança do presidente. Há muita coisa para fazer e eu vou fazê-lo até o dia que ele entender que eu tenho condição de atender esse papel. Minha função não é de ministro do Planejamento. Eu estou ministro. Minha função é de senador da República”, defendeu.
Quero repelir as interpretações das informações publicadas hoje no Jornal Folha de São Paulo.
— Romero Jucá (@romerojuca) May 23, 2016
Quero repelir as interpretações das informações publicadas hoje no Jornal Folha de São Paulo.
— Romero Jucá (@romerojuca) May 23, 2016