“Foi Ricardo Salgado quem decidiu este pagamento [avença mensal de cerca de 15 mil euros paga a Manuel Pinho]. Não dizemos isto por Ricardo Salgado ser dono do BES. Ele era o DDT — dono disto tudo. Mas para o Ministério Público não é relevante se ele era o DDT. O que interessa é que ele foi dono da relação com Manuel Pinho”.

Rui Batista, procurador do Ministério Público, começou assim as alegações finais do processo EDP, que arrancaram esta segunda-feira, depois de vários meses de julgamento, defendendo que Ricardo Salgado, ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES), dominava o universo Espírito Santo, incluindo os pagamentos feitos a Manuel Pinho, que estão em causa neste processo, que tem como arguidos Ricardo Salgado, Manuel Pinho e Alexandra Pinho. “São os dois que decidem e determinam” o contrato que resultou no pagamento mensal de cerca de 15 mil euros a Manuel Pinho quando este estava já a exercer funções como ministro da Economia, considerado pelo MP como “pacto corruptivo”.

O início serviu então para justificar a conclusão avançada no final da sessão, com o MP a pedir a condenação de Manuel Pinho por quatro crimes — corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais — a uma pena “não inferior a nove anos de prisão”. Para Ricardo Salgado, o Ministério Público entendeu que a pena de prisão deve ficar entre os seis e os sete anos de prisão e, em relação a Alexandra Pinho, a pena deverá ser de quatro anos.

“O mais grave do ponto de vista criminal é que, durante o período em que exerce funções públicas, [Manuel Pinho] está a receber estes valores de uma entidade privada”, considerou ainda o Ministério Público. “Lesa imediatamente o bem jurídico dos crimes relacionados com estatutos públicos. A gravidade é esta: alguém que exerce funções públicas, recebe dinheiro de entidades privadas”, acrescentou o procurador Rui Batista. Aliás, Pagamentos são provas evidentes de um acordo corruptivo.

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Para o MP, o pagamento mensal de 15 mil euros e o pagamento único de 500 mil euros a Manuel Pinho “são provas evidentes de um acordo corruptivo”, considerando que se mantêm, depois de ouvidas todas as testemunhas, os crimes de corrupção de que Manuel Pinho e Ricardo Salgado vêm acusados. E também os crimes de branqueamento de capitais imputados a Manuel Pinho e Ricardo Salgado ficaram provados durante as dezenas de sessões de julgamento, considerou o MP. “Existe uma estrutura de ocultação de rendimentos que começa em 2005, ano em que há um acréscimo de património”, referiu o procurador Rui Batista.

Caso EDP. Manuel Pinho recusa “pacto criminal” com Ricardo Salgado e diz que acordo foi assinado um ano antes de ser nomeado como ministro

Ainda antes do início das alegações finais, Francisco Proença de Carvalho, advogado de Ricardo Salgado, quis pedir uma nova perícia, para acautelar a suspensão da pena do antigo presidente do BES. Ou seja, a defesa de Salgado quis garantir que, caso venha a existir uma condenação, Salgado não poderá cumprir a mesma, uma vez que lhe foi diagnosticada a doença de Alzheimer. No entanto, o coletivo de juízes, numa decisão tomada em menos de cinco minutos, decidiu não aceitar o requerimento, justificando que essa perícia e essa decisão deverá ser remetida caso Salgado seja condenado.

Manuel Pinho está acusado pelo Ministério Público de dois crimes de corrupção passiva, um deles para ato ilícito, um crime de branqueamento de capitais e outro crime de fraude fiscal e o tribunal decidiu manter todos os crimes, tal como constam na acusação. Sobre Alexandra Pinho recaem os crimes de branqueamento de capitais e de fraude fiscal — os dois em co-autoria material, em concurso efetivo, com o ex-marido. Já Ricardo Salgado chegou a julgamento por dois crimes de corrupção ativa e um crime de branqueamento de capitais.

Segundo o Ministério Público, Manuel Pinho terá sido corrompido por Ricardo Salgado, na altura em que era o responsável pela pasta da Economia no Governo de José Sócrates, e terá recebido uma avença mensal de 14.963,94 euros através da sociedade offshore Espírito Santo Enterprises — o conhecido saco azul do Grupo Espírito Santo (GES). No total, o antigo ministro da Economia terá recebido um total de 3,9 milhões de euros do GES e Ricardo Salgado terá dado ordem para efetuar esses pagamentos. O objetivo do ex-líder do BES seria favorecer, alegadamente, o grupo da família, nomeadamente na aprovação das herdades da Comporta e do Pinheirinho como “Projeto de Interesse Nacional”.

Manuel Pinho: “Tenho a certeza absoluta que não cometi nenhum ato de corrupção”

À saída do Campus da Justiça, Manuel Pinho disse ter dúvidas de que o pedido do Ministério Público para uma pena “não inferior a nove anos de prisão” se concretize. “Não creio que isso suceda. E uma das razões é que os juízes são justos”, afirmou em declarações aos jornalistas, acrescentando que “o mais forte é o que as testemunhas aqui disseram e a prova material”.

O antigo ministro garantiu ainda que é inocente e que durante o julgamento, que se prolonga há sete meses, “ficou provado que atos de corrupção [foram] zero”. “Tenho a certeza absoluta de que não cometi nenhum ato de corrupção”.

“As testemunhas provaram aqui que eu tinha um acordo laboral com o Espírito Santo datado de 2004. Os procuradores disseram ‘não senhor’, há esse acordo, mas como não é de acordo com a nossa tese ou interesse então o que há é um de 2005. Não se sabe como foi feito, se foi escrito, se não fosse escrito”, apontou. “Uma coisa é certa, das testemunhas que aqui foram chamadas, e mais de metade delas foram chamadas pelo MP, nem uma confirma a tese do MP. Dos factos materiais aqui apresentados, nem um confirma isso. Se agora vierem dizer que as testemunhas negaram e os factos materiais apontam noutro sentido, mas queremos que seja assim, quer dizer, não posso fazer nada”, acrescentou.