De forma a obter uma clarificação rápida do Tribunal Constitucional, e de evitar o prolongamento da crise política até outubro, o Governo prepara-se para aprovar a legislação sobre a tabela salarial única da função pública sem que esta passe pelo crivo da Assembleia da República, apurou o Observador junto de várias fontes do Executivo.

O Ministério das Finanças acelerou todos os diplomas, que tinha previsto entrarem em vigor em 2015, autonomizando-os do Orçamento do Estado, que terá de entregar em Outubro. E quer que estes cheguem ao Palácio Ratton em agosto, para o tira-teimas decisivo da legislatura: saber se os cortes “duradouros” são, ou não, admitidos à luz da Constituição – o que parece mais improvável, acreditam os ministros, à luz do acórdão da última semana.

Porém, para que o processo não se arraste até à apresentação do OE 2015 (como aconteceu há um ano com a proposta da convergência de pensões), a opção desta vez passará por o Governo assumir o diploma dos salários, evitando o percurso legislativo da Assembleia. Na prática, esse ato evitará cerca de dois meses de discussão e aprovação parlamentar, seguindo diretamente (se for na forma de decreto-lei) para o Palácio de Belém. E daí, se houver pedido do Presidente, para fiscalização preventiva no TC.

trabalhos prolongados na AR?

Na prática, as mudanças salariais no Estado não têm de passar obrigatoriamente pelo Parlamento. Desde que não impliquem alterações, por exemplo, nas carreiras, esta não é matéria de reserva de competências da AR, podendo ser legislada pelo Executivo. Segundo a lei geral de trabalho em funções públicas, tudo depende das matérias que vierem a ser incluídas na legislação. A questão, porém, é sobretudo política. “O bom é inimigo do ótimo”, diz ao Observador uma fonte do Executivo, explicando que nesta fase a prioridade é obter uma “rápida clarificação do que o Governo pode ou não pode fazer”. “Não podemos viver um ano nesta incerteza, isso prejudica o país”, justifica a mesma fonte.

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No caso dos diplomas ontem aprovados (pacote da contribuição de sustentabilidade, que inclui o aumento do IVA e da TSU), o processo terá mesmo de passar pela AR. Mas pode ser um pouco mais rápido do que seria no caso dos salários – primeiro por não exigir negociação prévia com os sindicatos, segundo porque a nova tabela salarial ainda nem está pronta no Ministério das Finanças.

Mesmo assim, vai ser precisa pressa. “A proposta tem de ser aprovada até ao fim da sessão legislativa”, diz uma outra fonte do Executivo ao Observador. Mesmo que isso implique “que os trabalhos parlamentares se prolonguem por mais uns dias”, para além do último plenário marcado para dia 10 de julho, acrescenta ainda. Uma coisa é certa: a discussão pública obrigatória, quando o diploma chegar à AR, demorará 20 dias. Só mesmo um processo muito veloz permitirá chegar aos objetivos da coligação.

outra vez nas férias dos juízes?

Se tudo acontecer como espera Passos Coelho – incluindo um pedido de fiscalização do Presidente -, os acórdãos decisivos do TC vão acontecer em agosto, em plenas férias do Palácio Ratton. Em 2013, foi nessa altura que os sete juízes que ficaram de turno chumbaram os artigos da lei que permitia os despedimentos no Estado. O acórdão, apenas com um voto contra, foi divulgado a 29 de agosto e levantou enorme celeuma na maioria, que prontamente contestou o regime de férias instituído no TC.

Nessa altura, o presidente do tribunal, Sousa Ribeiro, lembrou que este regime resulta de legislação aprovada na AR, feita para garantir que o “funcionamento permanente do tribunal”.

Na direção do PSD, a vice-presidente Teresa Leal Coelho chegou a admitir a hipótese de alterar esta legislação – mas durante esta sessão ninguém chegou a apresentar propostas.