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Dezassete ministros. Dois são de Estado. Sete mulheres. E a promoção da Juventude e Modernização Administrativa a Ministério. No elenco de Luís Montenegro há também a junção do Ensino Superior no mega Ministério da Educação, Ciência e Inovação. O Governo da AD volta, também, a juntar a Habitação nas Infraestruturas. E deixa a Energia e o Ambiente na mesma tutela. Muitos dos escolhidos já não são novos nestas lides governativas. Boa parte conhece, no entanto, melhor os corredores do Parlamento (nacional e europeu). Há quatro eurodeputados — três do PSD e um do CDS — nesta lista.
Paulo Rangel. Ministro de Estado e de Negócios Estrangeiros
Paulo Rangel estava, há menos de dois anos, a preparar-se para ser primeiro-ministro. Um orçamento chumbado e um Parlamento dissolvido trocaram-lhe as voltas, tendo falhado a primeira etapa para chegar lá: vencer o PSD. Meses antes dessa luta que perdeu com Rui Rio, Rangel dizia publicamente — no programa Alta Definição, na SIC — que tinha “muitos sonhos e poucos planos”, mas admitia a ambição de chefiar um Governo: “Não enjeito isso”. As coisas não lhe correram como previa, mas o eterno potencial líder e “senhor Europa” do PSD torna-se agora ministro dos Negócios Estrangeiros, mas também ministro de Estado, sendo o número dois do Governo.
No verão seguinte, Luís Montenegro meteu a rivalidade interna que podia existir com Paulo Rangel, de quem foi aluno na Faculdade de Direito da Universidade do Porto, e convidou-o para primeiro vice-presidente do PSD. Nos bastidores circulou a ideia de que Rangel podia ser poupado nesta fase para ser o indicado do PSD a comissário europeu, mas Montenegro acabou por não abdicar dele para ministro.
Paulo Rangel tem um histórico como poucos no partido. Foi um sério candidato à liderança do PSD, tendo ficado em segundo lugar nas duas vezes que foi candidato (2010 e 2021). Mas foi batido em circunstâncias muito específicas e com resultados honrosos: primeiro por Passos Coelho (conseguiu 34,44% dos votos), depois por Rui Rio (conseguiu 47,57%).
Na primeira vez que foi candidato em eleições venceu as Europeias de 2009, dando o primeiro golpe no socratismo, até então invencível. Antes disso, quando Manuela Ferreira Leite o escolheu — de forma surpreendente — para liderar a bancada social-democrata já se tinha destacado na oposição com a tese da asfixia democrática.
A vitória de 2009 criou o Rangel europeu, que foi sem surpresas o candidato nas duas europeias seguintes. Em 2014 perdeu com sabor a vitória (porque o resultado serviu para ferir o líder do PS, cuja vitória de Pirro, como lhe chamou Soares, precipitou a saída). Em 2019, quando foi escolha de Rio nas Europeias, teve mínimos históricos. Nos 15 anos em Bruxelas, tornou-se uma das figuras de destaque do PPE (foi dos poucos que acumulou durante vários anos vice-presidência da bancada com a vice-presidência do partido). Não raras as vezes sentou-se à mesa de figuras como Angela Merkel e outros líderes europeus.
[Já saiu o quinto episódio de “Operação Papagaio” , o novo podcast plus do Observador com o plano mais louco para derrubar Salazar e que esteve escondido nos arquivos da PIDE 64 anos. Pode ouvir o primeiro episódio aqui, o segundo episódio aqui, o terceiro episódio aqui e o quarto episódio aqui]
A experiência europeia, onde também lidou com líderes mundiais, dão-lhe pergaminhos para ser ministro dos Negócios Estrangeiros. Como chefe da diplomacia, tem desafios pela frente como lidar com as guerras na Ucrânia e no Médio Oriente. Em novembro terá ainda as eleições presidenciais norte-americanas, cuja eleição de Donald Trump pode significar uma alteração da geopolítica mundial.
O grande jogo da diplomacia portuguesa é sempre feito na União Europeia, em que Paulo Rangel pode ter de ajudar Portugal a eleger António Costa presidente do Conselho Europeu. Isto, claro, se o resultado das Europeias permitir aos socialistas europeus ficar com o lugar e o agora primeiro-ministro demissionário se livrar do processo judicial que sobre ele pende. A experiência europeia adquirida nos últimos quinze anos será fundamental para defender os interesses do país em Bruxelas, que precisa do PRR como motor do investimento público e privado.
Miranda Sarmento. Ministro de Estado e das Finanças
Quando começou a ganhar mais notoriedade pública, ficou conhecido como “Centeno de Rui Rio”. Tal como tinha sido o atual governador do Banco de Portugal, foi um académico que se tornou o principal intérprete dos planos económicos de um projeto político. Centeno assumiu esse papel com António Costa, em 2015, e Miranda Sarmento fez o mesmo com Rui Rio, antes das eleições de 2022. Nessas eleições, Costa conseguiria a maioria absoluta e o ex-presidente da Câmara do Porto sairia, algum tempo depois, da presidência do PSD. Mas Miranda Sarmento não ficou afastado da liderança do partido porque Luís Montenegro o chamou para coordenar o programa com que iria enfrentar Jorge Moreira da Silva nas eleições diretas no PSD.
Vitorioso, ao chegar à liderança, Montenegro convidou Miranda Sarmento para o lugar que ele próprio tinha ocupado no governo de Passos Coelho: líder parlamentar do PSD. E assim que o Governo de Costa caiu, o professor do ISEG assumiu-se como principal rosto do programa económico da candidatura da Aliança Democrática (AD).
Este trajeto tornou a escolha de Miranda Sarmento a hipótese mais óbvia, caso Montenegro conseguisse vencer as eleições e formar governo. E, apesar de alguns jornais terem noticiado que Montenegro preferia Paulo Macedo, presidente da Caixa Geral de Depósitos e ex-ministro da Saúde, a escolha mais natural acabou por se confirmar: é Miranda Sarmento o sucessor de Fernando Medina no Terreiro do Paço.
Joaquim Miranda Sarmento tem 45 anos. Nasceu em 1978, em Lisboa, e é professor associado de Finanças (com agregação) no ISEG – Lisbon School of Economics and Management, da Universidade de Lisboa. O doutoramento (PhD) em Finanças fê-lo na Universidade de Tilburg, nos Países Baixos.
Entre 1999 e 2010, trabalhou como economista no ministério que agora vai liderar. Depois, foi consultor da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) e assessor económico do Presidente Cavaco Silva. O Presidente viria a condecorá-lo como “Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique” em 2016.
Ao mesmo tempo, e sobretudo nos últimos anos, escreveu, escreveu e escreveu – em particular sobre temas ligados às finanças públicas, fiscalidade e, também parcerias público-privadas. Tem mais de 20 livros académicos publicados em Portugal e acima de 50 artigos científicos (“papers”) publicados em revistas académicas internacionais. Esse trabalho viria a valer-lhe um prémio de investigação académica dado pela Universidade de Lisboa/CGD em 2019.
Carga fiscal “elevada” e serviços públicos “degradados, em colapso iminente”
Miranda Sarmento chega às Finanças tendo criticado, muito recentemente, a “carga fiscal cada vez maior” que existe em Portugal. Uma carga fiscal “elevada” que não impede que os serviços públicos tenham chegado a um estado de “absoluta degradação” e de “colapso iminente”, defendeu Miranda Sarmento numa entrevista dada ao jornal Público em outubro de 2023.
Na mesma entrevista, o agora ministro das Finanças culpou o ex-ministro Mário Centeno por ter feito “uma consolidação orçamental muito pouco sustentável entre 2016 e 2019, que assentou basicamente na redução de despesa de juros, no aumento da carga fiscal e no corte do investimento público”. Por falar em Mário Centeno, o seu mandato no Banco de Portugal termina no verão do próximo verão. E, mantendo-se Miranda Sarmento nas Finanças, será um dossiê “quente” para o ministro já que poderá levar a que Mário Centeno se torne o primeiro governador neste século a não fazer dois mandatos consecutivos. Miranda Sarmento sempre considerou, aliás, que Mário Centeno não tem a independência necessária para o cargo de supervisor independente como é a liderança do Banco de Portugal.
António Costa, a par de Medina, reivindicou o mérito das “contas certas” – o que significa uma dívida abaixo de 100% do PIB (um registo conseguido antes do previsto) e “ratings” favoráveis. Daí que Miranda Sarmento tenha como principal desafio apresentar uma estratégia diferente para garantir o equilíbrio das finanças do Estado – já que sempre afirmou que a consolidação orçamental de Costa foi sempre feita “dando com uma mão e tirando com a outra”.
O Orçamento do Estado em vigor, que o próximo governo tem de executar, foi um “exercício de propaganda” e um “tapa-remendos”. Tal como tinham sido os outros, de Costa, disse Miranda Sarmento. “Quando olhamos para a decomposição do aumento da carga fiscal, temos de facto uma redução ligeira da carga fiscal nos impostos sobre o rendimento – nomeadamente com as medidas do IRS – mas temos um aumento maior do que essa redução do IRS dos impostos indiretos”, disse Miranda Sarmento, a respeito do orçamento do Estado que está em vigor.
O novo ministro das Finanças estabelece como prioridade baixar o imposto sobre o rendimento. Pelo menos era o que dizia quando estava na oposição (e o governo de Costa ainda não tinha caído): “É preciso lembrar que o Estado cobrou a mais” e é “socialmente injusto o Estado cobrar mais do que aquilo que previa – que precisava para executar a despesa – e não devolver esse excedente às famílias”.
Miranda Sarmento herda um excedente das contas públicas histórico (de 1,2%), deixado por Fernando Medina, e terá de gerir as contas públicas sem saber se vai haver condições políticas para ser aprovado um orçamento retificativo. Se não houver, o novo ministro terá de governar quase um ano com o orçamento que lhe foi deixado, ao mesmo tempo que prepara a negociação do orçamento para 2025.
Em simultâneo, o novo Governo toma posse poucas semanas antes de ter de entregar em Bruxelas o Programa de Estabilidade. Este é um documento que é entregue na Assembleia da República, todos os anos até 15 abril, e depois de alguns dias de discussão interna este plano plurianual das receitas e despesas públicas é enviado para a Comissão Europeia.
Outro grande desafio foi aquele para o qual alertou Mário Centeno há poucos dias: garantir que as contas públicas respeitam as novas regras do Pacto de Estabilidade que vão entrar em vigor (em pleno) no próximo ano.
Além da escolha de uma alternativa a Centeno no Banco de Portugal (se este não for reconduzido), Miranda Sarmento também terá de encontrar um novo presidente para a Caixa Geral de Depósitos já que o mandato de Paulo Macedo termina no final deste ano. Miranda Sarmento terá de optar por alguém mais da área socialista, se quiser respeitar a “tradição” de ser escolhido um presidente para a Caixa mais próximo da “cor política oposta” (que levou à escolha de Paulo Macedo, ex-ministro pelo PSD, como independente, por um governo do PS).
“Não é difícil pôr economia a crescer mais de 3%”
Quando Pedro Nuno Santos, em plena campanha pelo PS, acusava a Aliança Democrática (AD) de ter um programa eleitoral irrealista, com objetivos de crescimento demasiado ambiciosos, Miranda Sarmento chutava para canto. “Não é difícil pôr a economia portuguesa a crescer acima de 3%”, atirou, em entrevista à revista Exame.
“A principal prioridade do país deve ser voltar a crescer e crescer de forma prolongada, sustentada e no médio e longo prazo acima de 3% porque só isso nos permite voltar a convergir com a União Europeia, não ser ultrapassado pelos outros países da coesão e podermos proporcionar melhores salários, sobretudo às gerações mais novas”, afirmou Miranda Sarmento, cujo livro mais recente se intitula “Crónicas de um País Estagnado”.
“Não há fórmulas mágicas” para acelerar o progresso económico em Portugal. Mas, na cabeça de Miranda Sarmento, o Ministério das Finanças tem um papel a desempenhar nessa missão: “deve ser um agente ativo na política de competitividade e crescimento económico, através de uma política fiscal que incentive o investimento e a poupança, através da redução dos custos de contexto, das externalidades positivas de melhores serviços públicos e que liberte recursos para a iniciativa privada”.
António Leitão Amaro. Ministro da Presidência
António Leitão Amaro era dos nomes mais certos no Governo, por onde já tinha passado como governante. Foi secretário de Estado da Administração Local na segunda metade do Governo de Pedro Passos Coelho, depois de ter sido coordenador do grupo parlamentar do PSD na comissão que tratava dessa pasta. No ano em que chegou ao Parlamento (2009, pela mão da direção de Ferreira Leite) começou a dar aulas no Instituto Superior Técnico.
Pela mesma altura foi secretário-geral da JSD, então presidida por Pedro Rodrigues. Ao contrário da maioria dos montenegristas, apoiou Rui Rio contra Santana Lopes. No entanto, bastou Montenegro ir a jogo para deixar Rio de lado. Não só já estava com o atual líder na célebre e inusitada tentativa de impeachment de 2019, como depois o apoiou nas diretas seguintes – contra Rio.
Esteve sempre ao lado de Luís Montenegro (e de Hugo Soares) e foi recompensado por isso. Na mini-competição da distrital de Viseu ganhou, com a atual direção, mais estatuto que Pedro Alves. Tornou-se num dos vice-presidentes com mais voz na cúpula de Montenegro. Chega, com naturalidade, aos 44 anos a ministro.
Como ministro da Presidência tem como função ser o controlador da casa das máquinas do Governo. Os briefings do Conselho de Ministros também devem passar por Leitão Amaro, que, assim, também vai ser importante na forma como o Governo vai comunicar. Ao contrário do que acontecia agora com a sua antecessora Mariana Vieira da Silva, não terá a pasta dos fundos europeus, o que lhe vai dar mais espaço para a gestão do Governo.
Manuel Castro Almeida. Ministro Adjunto e da Coesão Territorial
Aos 66 anos, Manuel Castro Almeida volta a exercer funções governativas, desta vez como ministro Adjunto e da Coesão Territorial. Numa altura em que é necessário acelerar a execução dos fundos europeus — o Observador confirmou que esta pasta fica no âmbito de atuação deste ministério — Castro Almeida é uma escolha natural para uma área que domina e que já tutelou no passado, quando, entre 2013 e 2015, foi secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, com responsabilidade pelos Fundos Europeus, no governo de Passos Coelho.
Nos anos 80, Castro Almeida começou a acumular experiência na área, quando trabalhou na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte. Em 1991, foi eleito deputado nas listas do PSD e chegou também a ocupar o cargo de secretário de Estado do Desporto, entre 1993 e 1995, no último governo de Cavaco Silva.
Em 2001, Castro Almeida decidiu ingressar na luta política local e conquistou a presidência da Câmara Municipal de São João da Madeira. Seria reeleito quatro anos depois e, novamente, em 2009, desta vez derrotando Pedro Nuno Santos, atual secretário-geral do PS.
Agora, chega a ministro pela mão de Luís Montenegro e tem uma tarefa difícil pela frente: acelerar a execução dos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência, que está abaixo do expectável, e levar a cabo, o mais rapidamente possível, projetos (como a Barragem do Pisão ou o sistema de depósito e reembolso de embalagens) essenciais para Bruxelas desbloquear a próxima tranche do PRR, no valor de quase 2.800 milhões de euros.
Castro Almeida foi vice-presidente do PSD, mas acabou por sair antes das eleições legislativas de 2019, em choque com Rui Rio, à época presidente do partido. Em causa estiveram as divergências quanto à relação com o PS, com Castro Almeida a defender um maior distanciamento em relação aos socialistas (então no governo) e uma oposição mais vigorosa — uma estratégia que colidia com a adotada por Rui Rio e ia ao encontro das vozes dissonantes da oposição interna ligadas a Luís Montenegro. Outro fator que terá levado o agora ministro da Coesão territorial a sair foi a perda de confiança de Rui Rio, uma vez que a então direção social-democrata desconfiava que as fugas de informação, divulgadas em horário nobre por Luís Marques Mendes (e que davam força à tal ala opositora) tinham origem em Manuel Castro Almeida.
Pedro Duarte. Ministro dos Assuntos Parlamentares
Pedro Duarte era o presidente do Conselho Estratégico Nacional do PSD não sendo, por isso, surpresa que tenha chegado a ministro. Para se afirmar tem um problema: o líder parlamentar do PSD (Hugo Soares) terá sempre mais peso político do que ele nas negociações em nome do partido.
O novo ministro começou a destacar-se no partido na JSD no final dos anos 1990, tendo sido líder entre 1998 e 2002. Logo em 1999 foi eleito deputado e esteve no Parlamento até 2011. Pedro Santana Lopes foi buscá-lo em 2004 para uma secretaria de Estado (a da Juventude e do Desporto) num curto Governo.
Durante o mandato de Passos Coelho esteve mais afastado da política, dedicando-se à sua carreira profissional, como diretor da Microsoft Corp. Em 2016, insuflado pela vitória das presidenciais, apresentou-se no Congresso do PSD como um crítico de Passos Coelho. As suas ameaças de disponibilidade para avançar para a liderança foram sempre inconsequentes.
Uma das suas conquistas, tinha sido pouco antes desse Congresso. Pedro Duarte foi diretor de campanha na primeira corrida presidencial de Marcelo. Foi uma campanha vitoriosa, mas os dois acabariam por se afastar. Ambos tinham coincidido na liderança do PSD e da JSD, mas esses tempos já iam longe.
Voltando um pouco mais atrás, durante essa licença sabática política, foi tendo participação na estrutura concelhia do PSD no Porto. Em 2013 foi o diretor de campanha de Luís Filipe Menezes à câmara municipal do Porto — numa derrota que as sondagens não previam. Voltando ainda mais atrás, foi colega de curso de Luís Montenegro, na altura em que foram ambos alunos de Paulo Rangel. Consta que Pedro Duarte tinha melhores notas. Apesar disso, Montenegro é agora o chefe.
Desempenhava até aqui também funções entre os patrões empresariais, como vice-presidente da CIP e é, segundo informações reveladas pelo próprio Governo, doutorado em Estudos de Desenvolvimento.
Terá um grande desafio pela frente: fazer a ligação entre o Governo um Parlamento, onde o PSD não tem maioria, totalmente fragmentado e com duas forças políticas que não vão facilitar a vida do Executivo de Montenegro. É a ele que compete fazer a ligação entre Executivo e deputados e participa nas conferências de líderes. Negociações para a aprovação de diplomas (como os que se avizinham de polícias, professores e saúde) ou para o Orçamento do Estado (com Chega ou PS) também vão passar pela figura que representa o Governo no Parlamento. E essa figura é Pedro Duarte. Terá o apoio, mas também a supervisão (não há dúvidas que informalmente Hugo Soares está acima de Pedro Duarte) do líder parlamentar do PSD. Os problemas não serão, no entanto, entre ambos. Serão entre eles e as restantes bancadas.
Nuno Melo. Ministro da Defesa Nacional
No início do ano, milhares de elementos da PSP e GNR saíram à rua em protesto contra o que consideram ser uma discriminação salarial em relação aos inspetores da Polícia Judiciária. Nas semanas seguintes, e depois durante a campanha para as legislativas, conseguiram levar os principais responsáveis políticos a reconhecer que a situação é insustentável e a comprometerem-se com uma revisão dos valores pagos pelos suplementos de risco, equiparando-os ao suplemento de missão atribuído à PJ. Os militares — que há anos reclamam uma revisão profunda das tabelas salariais — permaneceram nos quartéis, com o argumento de que não queriam interferir na campanha eleitoral. Mas deixaram o aviso: o próximo Governo, fosse qual fosse a sua cor política, estava obrigado a alterar essa realidade. Se isso não acontecesse, seriam os próximos a sair à rua.
É essa pasta, com os militares em ponto de ebulição, mas também umas Forças Armadas há longos anos depauperadas de recursos humanos, que Nuno Melo vai agora liderar, depois de Luís Montenegro ter apresentado ao Presidente da República o nome do presidente do CDS, segunda figura da Aliança Democrática, para a área da Defesa Nacional.
“Alertámos que mal o Governo tome posse vai ter mesmo de olhar para as Forças Armadas no imediato. Não é daqui a seis meses, é agora. Já não podemos ser mais ignorados. Fizemos tudo da melhor forma, e também avisámos que tomaríamos medidas mais mediáticas. E tomaremos”, reitera o presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas, tenente-coronel António Costa Mota, em declarações ao Observador.
O estado de espírito é exatamente o mesmo noutra instituição representativa dos militares, a Associação Nacional de Sargentos (ANS). Depois de criticar a “secundarização da Defesa Nacional”, quer na campanha quer nos próprios programas eleitorais dos vários partidos, António Lima Coelho diz que “o caderno de aspirações” dos militares “mantém-se atual”, depois de ser conhecido o resultado das eleições e no dia em que era conhecido o próximo elenco governativo. “Pelos vistos, [os últimos alertas] não foram suficientes para ser vertida uma vírgula” sobre as reivindicações dos militares nas propostas levadas a votos. “Temos de voltar à carga com todos os mecanismos legais que estejam ao nosso alcance. E à rua, se tal for necessário”, assegura o presidente da ANS.
Ao contrário de Helena Carreiras, Nuno Melo não é reconhecido como sendo um político particularmente conhecedor das especificidades do universo militar. Há quase uma década e meia em Bruxelas — e mesmo antes disso, como deputado à Assembleia da República —, nunca acompanhou de perto as áreas da Segurança ou da Defesa Nacional.
“Esteve na Europa muitos anos e, ao nível da política nacional, não tem essa experiência, não tem um curso de Defesa Nacional, ou uma passagem pela comissão [parlamentar] de Defesa Nacional”, aponta ao Observador o tenente-general Joaquim Formeiro Monteiro, membro do Grupo de Reflexão Estratégica Independente (um conselho de análise militar), para sublinhar todo um percurso político distante da pasta que Nuno Melo se prepara para assumir. “Seria preferível que tivesse essa experiência, mas se se rodear de quem tenha essa experiência, isso poderá atenuar” eventuais fragilidades.
Mas, também ao contrário da ainda ministra da Defesa Nacional, Nuno Melo tem uma (considerável) experiência política e maior “peso” no seio do Governo, o que, esperam os futuros interlocutores, poderá facilitar a resolução dos graves problemas nas Forças Armadas. “É presidente do CDS, um partido que integrou a Aliança Democrática, é a segunda figura da Aliança Democrática e isso poderá ser uma vantagem” no desbloquear de processos, acredita António Costa Mota.
Nuno Melo foi deputado à Assembleia da República entre 1999 e 2009. No Parlamento, onde integrou várias comissões, e onde chegou a líder da bancada parlamentar centrista, destacou-se sobretudo pelas suas intervenções na comissão parlamentar de inquérito à nacionalização do BPN. Cabeça de lista pelo CDS às eleições europeias de 2009, passaria os 13 anos seguintes em Bruxelas, até voltar a Lisboa para disputar a liderança do CDS, acabando por suceder a Francisco Rodrigues dos Santos.
Agora, Melo assume o cargo de maior relevância política da sua carreira como ministro da Defesa, numa área com problemas que passam, sobretudo, pelas dificuldades de recrutamento e retenção de militares nos diferentes das Forças Armadas — um tema que arrasta consigo as reivindicações de melhores condições salariais e, para alguns, o necessário regresso a um sempre adiado debate sobre a reintrodução do Serviço Militar Obrigatório em Portugal.
“O recrutamento e a retenção só se resolvem dando condições aos que já estão nas Forças Armadas e, também, aos potenciais interessados em ingressar” na vida militar, diz o presidente da Associação de Oficiais das Forças Armadas. “O sistema remuneratório tem de ser fortemente registo em alta (e não é com aumentos de três, cinco ou 10%”, avisa António Costa Mota. “No mínimo, o que o próximo Governo tem de fazer — e é já, não é daqui a seis meses — é equiparar os militares das Forças Armadas às forças e serviços de segurança”, considerando já que elas próprias terão a sua situação revista, em linha com a Polícia Judiciária. “Aguentou-se a situação enquanto era possível e agora já não é, a quebra de 30% nos efetivos das Forças Armadas é espelho disso mesmo”, sublinha o tenente-coronel.
Além das “condições de vida e salariais”, o general Formeiro Monteiro defende uma revisão do caderno de compras de equipamentos militares, tendo em conta a guerra na Ucrânia, a guerra às portas da Europa (com o conflito no Médio Oriente) e a permanente exigência de Portugal cumprir missões no quadro da NATO. “É preciso redimensionar e antecipar a aquisição de equipamentos que estavam na lei programação militar nos próximos quadriénios”, defende o tenente-general.
As expectativas, assumem, são “baixas” no que toca à capacidade do próximo ministro da Defesa para dar resposta — rápida e eficaz — às reivindicações dos militares. António Mota reitera o alerta: são precisas novas “políticas” e “diálogo com compromissos”. “Se isso não acontecer, teremos de tomar as posições legais que estão ao nosso alcance.”
Rita Alarcão Júdice. Ministra da Justiça
Foi dos nomes mais bem guardados. Rita Alarcão Júdice, a nova ministra da Justiça, é descrita por quem a conhece como “a pessoa certa para as reformas” de que a Justiça precisa. Outros falam numa ministra pouco conhecida, por exemplo, entre magistrados, com um peso político menor do que o esperado: “Mas isso não significa nada”.
O percurso profissional pode explicar em parte esta descrição. Advogada, licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, em 1997, foi sócia da sociedade de Advogados PLMJ de 2013 a 2023, onde foi co-coordenadora da área de Imobiliário e Turismo. Na prática fazia o acompanhamento de transações imobiliárias relacionadas com processos de investimento ou de desinvestimento de ativos imobiliários. Tem, aliás, nessa área 25 anos de experiência. É ainda membro da Comissão Executiva da Urban Land Institute (ULI) Portugal e associada da Women in Real Estate (WIRE Portugal). Mais recentemente assumiu a coordenação do Conselho Estratégico Nacional (CEN) do PSD, tendo como objetivo preparar ideias e propostas políticas para o setor da habitação.
Ainda no mês passado, enquanto cabeça de lista da Aliança Democrática (AD) por Coimbra, a advogada de 50 anos, filha de José Miguel Júdice, apontou o dedo ao anterior Governo por ter “governado fechado em gabinetes geridos por ministros que não conhecem a realidade do país”. A crítica, feita na sessão de apresentação dos candidatos efetivos e suplentes da AD, funciona agora como uma promessa, que os vários operadores da Justiça esperam ver concretizada. E não é a única.
“A política é ouvir as preocupações de quem está à nossa volta”
“Há uns dias, num debate a candidata do Partido Socialista por Coimbra, que também foi ministra nos últimos anos, dizia-me que ‘a política não é ouvir’. Pois a minha forma de ver a política é precisamente o oposto. A política é ouvir, sim. É ouvir as preocupações e os problemas de quem está à nossa volta”, garantiu na mesma altura, citada pelo Notícias de Coimbra.
A capacidade de ouvir e, sobretudo, dialogar de Rita Júdice é, aliás, algo que João Nuno Calvão da Silva, vice-reitor para as Relações Externas e Alumni da Universidade de Coimbra, destaca em declarações ao Observador: “É moderada e ponderada. Dialogante, mas decidida”. Caracterísitcas que o levam a acreditar que a advogada, “com larga experiência profissional na área da justiça” possa “ser a pessoa certa para as reformas tão necessárias em área fulcral para o país”.
O percurso na advocacia e relativa pouca exposição fazem com que outros não consigam ter para já a mesma certeza. Alguns magistrados, que preferiram não ser identificados, assumiram mesmo que foram pesquisar o currículo da nova ministra depois de a lista de ministros ter sido divulgada. “É esperar para ver”, disse um deles, adiantando que o facto de ser pouco conhecida nada diz sobre a qualidade do trabalho que poderá vir a desenvolver, nem sobre o seu conhecimento sobre os desafios da pasta.
“As salas são tetris, ninguém consegue trabalhar assim”
Ainda antes de ser conhecido o nome da nova ministra, Paulo Lona, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, sublinhava que “o perfil ideal” é o de “alguém que seja conhecedor profundo do setor da Justiça, das suas várias insuficiências — carências em termos recursos humanos, materiais e tecnológicos. E alguém com capacidade de diálogo com os vários operadores da Justiça e de preferência com algum peso político para poder executar as medidas a que se propuser”.
O primeiro grande desafio que terá de enfrentar tem a ver com os recursos, defende, sobretudo com a questão dos funcionários judiciais, que estão em greve — exigem a revisão dos estatutos, o pagamento de um suplemento e a abertura de um novo concurso: “É necessário contratar mais oficiais de Justiça, temos um problema […] que está a paralisar alguns tribunais e serviços do MP e que necessita de uma resposta muito urgente”, disse, acrescentando que o novo titular da pasta também terá de “tornar atrativas as carreiras, quer dos oficiais de justiça, quer as carreiras na magistratura”. Em paralelo, falou também da degradação dos recursos materiais nos tribunais e em diversos departamentos: “Estive recentemente no DIAP do Porto e no último andar há dois gabinetes onde chove, as colegas têm de colocar umas coisas para aparar a chuva, porque as condições de salubridade são péssimas. Esses são os reais problemas na Justiça”.
E Rita Júdice conhece-os. No final de fevereiro, por isso, ainda antes de se saber que iria ocupar a pasta, numa entrevista à Rádio Universidade de Coimbra relatou o que encontrou naquela cidade quando foi entregar ao tribunal as listas de candidatos ao círculo eleitoral: “Ninguém consegue trabalhar e quando fomos entregar a nossa lista vimos bem, as salas são tetris, as pessoas trabalham sem condições nenhumas. não há condições para as pessoas trabalharem como estão. Isso é uma parte do problema”.
“Antigamente ser juiz era o prestígio…”
Nuno Matos, recém-eleito presidente da direção da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) — só toma posse no próximo dia 5 — também aceitou falar sobre os desafios da pasta, antes de se saber quem iria liderá-la. Ao Observador, o também juiz desembargador da Relação de Lisboa, lembra que os problemas dos tribunais são públicos: “Cada uma das 23 comarcas de tribunais comuns faz anualmente um relatório em que levanta os problemas que existem: seja de instalações, para receber os cidadãos, de pendências, de falta de juízes, de falta de funcionários, o que é muito relevante”. E a próxima ministra terá de ter em atenção esses relatórios, defende, lembrando, que também os tribunais administrativos e fiscais o fazem.
Se a ministra tiver em conta tudo o que é referido, não terá dificuldades em identificar o que é preciso mudar urgentemente, assegura, defendendo que há coisas que podem ser feitas sem qualquer autorização das Finanças. “Há coisas do dia a dia que o ministro da Justiça poderá resolver dentro de portas. Não estou a falar de fazer um Palácio da Justiça novo em qualquer parte do país”.
E a nova ministra também deu conta de muitas destas preocupações na recente entrevista. Além da falta de condições para o trabalho, a morosidade justifica-se porque “o próprio sistema jurídico demora, os juízes têm muito trabalho, os processos são complexos, muitas vezes têm poucos apoios informáticos, os próprios sistemas, em alguns sítios funciona bem, mas há outros processos que não funcionam tão bem”. “Há falta de pessoal, de juízes, e não só, de oficiais de justiça. Tem havido falta de investimento também nessas áreas, porque são profissões que cada vez são menos dignificadas e isso afasta as pessoas. Antigamente ser juiz, era o prestígio… Mas não é só ser juiz, é ser professor, é ser médico. Tem havido uma decadência do prestígio, porque as pessoas têm sido maltratadas”, rematou.
Uma preocupação que é manifestada também pelo presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que insistindo na necessidade de resolver os problemas dos oficiais de justiça, explica que há neste momento procuradores a fazer o papel de magistrado e de oficial, “porque não têm ninguém que junte os papeis aos processo”. “É necessário recrutar mais oficiais de Justiça, mas só resulta se a carreira for atrativa. No último concurso, foram recrutados quase 200 e quase metade deles já desistiram das funções. Não é ganhando 800 ou 900 euros que estão na disposição, na grande maioria, deslocar-se para os grandes centros urbanos, onde vão gastar mais do que ganham. Esta é resposta mais urgente que precisa ser dada”.
Cabe à ministra o “papel agregador”
Sobre a reforma da Justiça — que no programa da AD se defende que seja “sólida e não de alterações casuísticas” –, Nuno Matos recorda estar em cima da mesa há muitos anos e que deve ser transversal. Tem de “tocar as várias profissões jurídicas e ter o contributo de todos, incluindo da Academia”.
O recém-eleito presidente da ASJP defende mesmo que é “preciso que haja um clima de confiança entre todos, porque se uns desconfiam dos outros, não se vai a lugar nenhum”. E cabe à nova ministra da Justiça esse “papel de agregador”, de “criar esse clima para todos refletirem sobre as matérias — e se entenderem que há algo a mudar, mudá-lo –, mas tentando manter o máximo de consenso político”. Algo com que Nuno Matos concorda, afirmando que “não pode haver tentação de querer fazer reformas na Justiça a reboque de dois ou três processos concretos que não são significativos”.
A partir de dia 2 de abril, Rita Júdice poderá começar então a ouvir as preocupações, a dialogar e a resolver todos os problemas que já identificou.
Margarida Blasco. Ministra da Administração Interna
“Queremos forças e serviços de segurança que cumpram intransigentemente os direitos humanos. E nisso somos intransigentes. Podemos compreender determinados fenómenos, mas não pactuamos com eles. E queremos ir a fundo”. Margarida Blasco assumia assim o ataque a casos de acusações de racismo a polícias numa entrevista ao Público, na qual admitia poder haver casos de infiltração da extrema-direita nas forças policiais. Assumia, nessa mesma entrevista, que a Inspeção Geral acompanhava os fenómenos de extrema-direita nas polícias “a par e passo para evitar que se instalem e progridam”. Era, então, a polícia dos polícias, inspetora geral da Administração Interna, cargo para o qual tinha sido nomeada em 2012 por Miguel Macedo (ministro da Administração Interna que saiu depois de divulgadas suspeitas de corrupção com vistos gold, acabando anos mais tarde absolvido). Blasco até foi falada para substituir Macedo, o que não aconteceu. Chega agora ao Ministério da Administração Interna com o currículo recheado e com alguns cargos ligados à pasta que a juíza vai ocupar aos 67 anos.
O currículo governativo começou como chefe de gabinete do secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça no Governo de Cavaco Silva, entre 1987 e 1991, era ministro da Justiça Laborinho Lúcio e seu secretário de Estado José Borges Soeiro. Ainda permaneceu em serviços ligados à Justiça. EM 1999 foi nomeada para o Conselho de Fiscalização dos Serviços de Informações da República, onde permaneceu até 2003. Para no ano seguinte, em 2004, passar a diretora geral do SIS (Serviço de Informações de Segurança), a primeira mulher com essa função, escolhida por Durão Barroso, de quem tinha sido colega na faculdade. Saiu em 2005 forçada a renunciar por José Sócrates que assumira nesse ano a liderança do Governo. E já nos tempos recentes, a propósito da polémica que envolveu o SIS e a recuperação do computador do ex-adjunto de João Galamba, Frederico Pinheiro, disse confiar nas secretas mas admitia o “episódio infeliz” e um “erro de avaliação”, pedindo, por isso, esclarecimentos.
O SIS ficou para trás. Uns anos mais tarde voltava, num governo PSD/CDS, a ser escolhida para outras incumbências. Foi a escolhida por Miguel Macedo para a Inspeção Geral da Administração Interna em 2012, de onde saiu em 2018 já com Eduardo Cabrita no comando da pasta. Três mandatos com casos mediáticos como as agressões numa esquadra de Alfragide por parte de agentes da PSP a seis jovens da Cova da Moura, do qual foram acusados. O IGAI, no entanto, arquivou sete dos nove processos disciplinares neste caso. Oito agentes foram condenados em tribunal. Também teve em mãos o caso no Bairro da Jamaica, no Seixal, onde agentes da PSP foram filmados durante uma detenção a agredir várias pessoas. E no IGAI a apanhou os incêndios de 2017.
Saiu do IGAI quando foi nomeada para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo entrado na Inspeção Geral como desembargadora do Tribunal da Relação de Lisboa. Está desde 2021 jubilada.
Na sua mesa de decisão judicial nas várias instâncias passaram casos como o de Camarate, Dona Branca e o do então diretor da Polícia Judiciária Fernando Negrão, demitido por uma alegada fuga de informação sobre uma investigação à Universidade Moderna (processo arquivado).
Agora no Ministério da Administração Interna será confrontada com as reivindicações dos polícias que exigem o mesmo complemento de risco atribuído à PJ, mas é também a herdeira de um controlo de fronteiras que resultou da extinção do SEF para ser assumido pela AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo), cuja tutela no Governo cessante ficou com a ministra dos Assuntos Parlamentares.
Fernando Alexandre. Ministro da Educação, Ciência e Inovação
A Educação, o Ensino Superior e a Ciência voltam a estar concentrados num único ministério, tal como aconteceu durante a governação de Passos Coelho, com Nuno Crato à frente da pasta, entre 2011 e 2015. Mas há surpresas. Apesar de conhecido no meio do Ensino Superior, nas escolas poucos sabem quem é Fernando Alexandre, o novo ministro da Educação, Ciência e Inovação, que vem da esfera da economia e gestão – é professor desta área na Universidade do Minho –, foi secretário de Estado Adjunto do Ministério da Administração Interna e fez parte da Comissão Técnica Independente que analisou a localização do novo aeroporto de Lisboa.
Para já, tanto os sindicatos dos professores como os diretores das escolas, que ficaram surpreendidos com a escolha, esperam que Luís Montenegro venha a nomear nomes fortes para as secretarias de Estado. “Foi uma surpresa, mas pode ser um bom ministro. Tem de se rodear de bons secretários de Estado e tem de ouvir as bases”, sublinha Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP) ao Observador.
Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, também acredita que “os verdadeiros ministros serão os secretários de Estado” da área. “O ministro acaba por ser um coordenador dos secretários de Estado”, refere Mário Nogueira, sem deixar escapar que “a educação não deve ser gerida por critérios menos ligados à educação e mais à economia”, concretiza Nogueira.
As ligações de Fernando Alexandre à economia são muitas: é doutorado em Economia pela Universidade de Londres, Birkbeck College, foi presidente da Escola de Economia e Gestão e diretor do departamento de Economia da Universidade do Minho, onde é também professor associado, e é vice-presidente do Conselho Económico e Social.
Apesar de pouco conhecido na Educação, esta não é a primeira vez que Fernando Alexandre faz parte de um Governo. O economista e professor foi escolhido para a equipa do antigo ministro da Administração Interna Miguel Macedo, em abril de 2013, mas dois anos depois, em abril de 2015, já durante o mandato de Anabela Rodrigues, acabou por pedir a demissão do cargo de secretário de Estado do Ministério da Administração Interna.
Na altura, Fernando Alexandre apresentou a sua demissão alegando motivos pessoais, mas fonte do governo chegou mesmo a confirmar ao Observador, em 2015, que em causa estavam incompatibilidades com Anabela Rodrigues, consequência das negociações do novo estatuto da PSP. Aliás, Fernando Alexandre acabou mesmo por ser afastado dessas negociações. E, também na altura, fonte da Direção Nacional da PSP explicou que as relações entre polícias e o então secretário de Estado não eram boas: “Tinha sempre uma postura sobranceira em relação à polícia. Era um académico muito pouco político e com pouca sensibilidade para as questões da instituição”. A sua postura levou os polícias a preferir negociar diretamente com a ministra.
Mais tarde, avançou o Correio da Manhã ainda a propósito desta demissão, soube-se que Fernando Alexandre foi arrolado pelo Ministério Público como testemunha no âmbito de um processo de corrupção. Este caso envolveu João Alberto Correia, ex-diretor-geral de Infraestruturas e Equipamentos do MAI, que estava acusado de 69 crimes – 32 destes eram crimes de corrupção. Fernando Alexandre terá sido ouvido pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), para explicar as 70 obras públicas por ajuste direto.
Mas, se em 2015 teve de negociar os novos estatutos da PSP, o desafio das negociações mantém-se agora neste “superministério”. A AD prometeu, no seu programa eleitoral, a recuperação total do tempo de serviço congelado, mas de forma faseada nos próximos cinco anos. O objetivo é que a carreira seja descongelada à razão de 20% ao ano, até 2028. O descongelamento das carreiras – os seis anos, seis meses e 23 dias – tem levado milhares de professores às ruas e agora Fernando Alexandre terá de se sentar com as estruturas sindicais para negociar.
Mas o descontentamento dos professores não fica por aqui. Os concursos que colocam estes profissionais a centenas de quilómetros das suas casas e o elevado preço das rendas em cidades como Lisboa são outros dois problemas com os quais o novo ministro terá de lidar.
Para já, e a curto-prazo, Fernando Alexandre, terá um grande desafio: garantir que as provas de aferição – dos 2.º, 5.º e 8.º anos – e as provas finais do 9.º ano decorrem sem problemas. O Governo de António Costa decidiu que estava na altura de deixar de lado o papel e a caneta, implementando um modelo de provas digital, mas há ainda escolas que não têm computadores suficientes, internet sem falhas, ou até tomadas para carregar os computadores. A grande questão, neste momento, é saber se Fernando Alexandre vai manter a medida ou se vai optar por revertê-a, como têm pedido os diretores das escolas, pais e professores.
Apesar de ser pouco conhecida a sua ligação ao Ensino, Fernando Alexandre tem falado sobre esta área nos últimos tempos. Num artigo de opinião publicado no Observador, o novo ministro já deixava algumas pistas sobre o seu entendimento: “O investimento em Educação continua a ser o melhor caminho para alcançar níveis de bem-estar mais elevados no futuro. No entanto, temos de melhorar o sistema de ensino e o funcionamento do mercado de trabalho para conseguirmos retirar mais benefícios desse investimento para as famílias, para as regiões e para o país.”
O Ensino Superior será, de resto, a área que conhecerá melhor, pelos 20 anos que tem na academia. Mas também terá desafios e um deles é o alojamento para os estudantes, que têm cada vez mais dificuldades em encontrar quartos a preços acessíveis.
Ana Paula Martins. Ministra da Saúde
Há oito anos, ninguém sabia quem era Ana Paula Martins. Em 2016, a até então discreta professora da Faculdade de Farmácia de Lisboa foi eleita bastonária dos Farmacêuticos e tudo mudou. Entrou nos holofotes mediáticos e ganhou peso político. Depois de ter sido vice-presidente de Rui Rio e de ter passado (de forma conturbada) pela presidência do Hospital de Santa Maria, chega agora, aos 58 anos, a ministra da Saúde, o maior desafio da sua carreira profissional.
Diz quem a conhece bem que é uma pessoa “inteligente” e “determinada” e preparada para gerir conflitos e concertar posições. No entanto, há também quem considere que não é a pessoa indicada para ocupar a difícil pasta da Saúde: não tem quase nenhuma experiência de trabalho no SNS e não é “consensual”.
O atual bastonário dos Farmacêuticos, que conhece Ana Paula Martins desde os 18 anos, fala numa mulher “preparada” e elogia a escolha, inédita, de uma farmacêutica para ocupar a pasta. “Fomos do mesmo curso da faculdade e sempre tivemos uma relação próxima. É uma mulher inteligente, preparada, com um instinto político acentuado. Fará um bom trabalho como ministra da Saúde”, diz ao Observador Hélder Mota Filipe, destacando que a ex-bastonária “sabe ouvir, conhece a área, e tem os ingredientes necessários” para fazer um bom mandato “se lhe forem dadas as condições para exercer o cargo”.
“Tem uma carreira política e um desenvolvimento do ponto de vista profissional que combina bem com o cargo”, refere Mota Filipe, que não disfarça o “orgulho” de ver, pela primeira vez, uma farmacêutica com a pasta da Saúde. “É um orgulho para os farmacêuticos, mas não tenho uma visão corporativista da saúde. O que quero é que seja alguém com capacidade para exercer o cargo, e ela tem esse perfil”, considera o atual bastonário.
À semelhança de Hélder Mota Filipe, também a administradora hospitalar Catarina Baptista, que trabalhou com Ana Paula Martins na administração do Hospital de Santa Maria, destaca a capacidade para ouvir da agora ministra da Saúde. “É um exemplo, uma pessoa ponderada e que ouve. Consegue sentar-se à mesa para uma reunião, num assunto difícil e reunir consenso”, diz ao Observador a administradora hospitalar, acrescentando que Ana Paula Martins é também “determinada” e tem capacidade para tomar decisões, ainda que possam ser “difíceis”. “É altamente dedicada, coloca a energia toda no que está a fazer e tem muita capacidade de trabalho”, diz Catarina Baptista.
A capacidade de diálogo e de conciliação de posições diferentes são duas qualidades importantes para Ana Paula Martins enfrentar um dos principais desafios que terá quando assumir a pasta: a negociação com os profissionais de saúde. Os sindicatos médicos já avisaram que não haverá “estado de graça” para o novo governo, e exigem retomar as negociações para valorização dos salários e da carreira. Também os enfermeiros e os farmacêuticos devem aumentar a pressão nos próximos meses, o que vai obrigar a ministra a uma gestão cuidada da relação com os sindicatos. “É virada para a gestão do conflito. Isso será útil para o momento que estamos a viver com os recursos humanos na saúde, uma área que lhe é querida”, sublinha Catarina Baptista.
Outro grande desafio é o aumento da capacidade de resposta do SNS, que não tem conseguido acompanhar o aumento da procura por cuidados de saúde em várias áreas — das urgências às cirurgias e consultas. Neste campo, o programa da Aliança Democrática propunha um aumento da cooperação com os setores privado e social e a criação do voucher consulta de especialidade. Ana Paula Martins vai ter a missão de reforçar a ligação aos privados, sem comprometer a centralidade do SNS.
Os cuidados de saúde primários serão outra ‘dor de cabeça’: com um milhão e meio de pessoas sem médico de família, e com um número cada vez maior de vagas por ocupar nas zonas mais carenciadas (essencialmente, Lisboa e Algarve) a cada concurso, este será um dossier de resolução difícil.
Crítica da generalização do modelo de Unidades Locais de Saúde aos grandes hospitais universitários (motivo que a fez abandonar a presidência do Santa Maria, no final de 2023), terá de contornar aquela que o atual governo apresenta como a maior reforma de sempre do SNS, precisamente as ULS. Outro desafio é a relação com a Direção Executiva do SNS, com quem mantém boas relações (foi de Fernando Araújo, aliás, a escolha para Ana Paula Martins liderar o Santa Maria). Isto porque o programa da AD prevê a reformulação da estrutura orgânica e das competências daquela entidade.
Mas se muitos consideram que Ana Paula Martins tem o perfil adequado para ser ministra da Saúde, também há vozes dissonantes. “Não é uma pessoa consensual, como vão ver”, alerta um profissional de saúde do Hospital de Santa Maria, que trabalhou com a agora ministra naquela unidade. “O mais complicado é a ausência de experiência no SNS. Não percebe nada de SNS”, critica um médico do Hospital de Santa Maria, realçando o que, durante os 12 meses em que esteve à frente daquele hospital, “só criou confusão e não fez nada”. “É complicado fazer um bom mandato no Ministério da Saúde”, vaticina o mesmo médico. No entanto, para a administradora hospitalar Catarina Baptista, a experiência em gestão não é determinante para liderar o Ministério da Saúde, um cargo que requer, sim, “uma elevada competência política e capacidade de diálogo”.
Em 1995, ao mesmo tempo que terminava o mestrado, Ana Paula Martins começava a dar aulas na Faculdade de Farmácia de Lisboa, onde foi professora durante mais de 20 anos. No início dos anos 90, desempenhou as funções de secretária-geral da Ordem dos Farmacêuticos e foi também nessa altura que teve o primeiro contacto com cargos políticos: foi assessora do ministro da Educação e do ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares, no terceiro governo de Cavaco Silva.
No entanto, a passagem pela política seria fugaz (durou menos de dois anos) e logo em 1994 Ana Paula Martins assumia um cargo de direção na Associação Nacional de Farmácias — de onde saiu, 12 anos depois, a convite da indústria farmacêutica. Entre 2006 e 2014, exerceu o cargo de diretora de External Affairs and Market Access da MSD, uma das maiores empresas do mundo no ramo farmacêutico.
Sem nunca ter exercido a profissão na qual se formou, decidiu, ainda assim, em 2015, candidatar-se a bastonária da Ordem dos Farmacêuticos. Sem oposição, ganharia as eleições em fevereiro do ano seguinte e seria reeleita três anos depois, com o dobro dos votos — e num sufrágio onde voltou a concorrer sem adversários.
Ainda antes de deixar oficialmente a Ordem, onde deixou uma boa imagem, tomou posse, no final de 2021, como vice-presidente do PSD, por escolha do então presidente do partido Rui Rio. Por essa altura, regressou também à indústria farmacêutica, para ocupar o cargo de director of governmental affairs da Gilead Sciences. No entanto, manteve-se apenas um ano no cargo. No final de 2022, e sem praticamente ninguém esperar, foi nomeada pela Direção Executiva do SNS para a presidência do Conselho de Administração do Centro Hospitalar e Universitário de Lisboa Norte, que engloba o maior hospital do país — o Santa Maria.
Ana Paula Martins. Do Hospital de Santa Maria ao Parlamento, a crónica de um ano atribulado
Sem experiência anterior em gestão hospitalar, o mandato, que acabaria por durar pouco mais de um ano, seria marcado por polémicas e muita tensão. Ana Paula Martins foi, desde logo, obrigada a pedir escusa de qualquer decisão relacionada com a Gilead Sciences, empresa à qual o Santa Maria compra muitos medicamentos, nomeadamente nas áreas da Oncologia e da Infecciologia.
Ultrapassado o conflito de interesses, Ana Paula Martins teria pela frente um ano de 2023 recheado de dossiês complexos: o fecho da maternidade do hospital e a instabilidade no serviço de Obstetrícia — com a transferência das grávidas para o São Francisco Xavier — que gerou mal-estar e levou à saída de vários médicos especialistas; a falta de capacidade de resposta no serviço de Urgência Geral — causado, em grande parte, pela escusa dos médicos às horas extra — e que levou a administração a acionar o plano de contingência, recusando atender doentes não urgentes de fora da área da influência do hospital; e a alegada cunha para as gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinhal, uma história com vários anos e que ‘rebentou’ nas mãos de Ana Paula Martins.
Ana Paula Martins acabaria por renunciar ao mandato, no final do ano passado, por não concordar com a generalização do modelo de Unidades Locais de Saúde aos grandes hospitais universitários, como é o caso do Santa Maria — uma opção que, argumentou há alguns meses, vai agravar o subfinanciamento destas unidades, que tratam doentes em fim de linha, mais complexos e, por isso, que geram mais custos para o sistema.
Miguel Pinto Luz. Ministro das Infraestruturas e da Habitação
A escolha de um perfil mais político para esta pasta já foi uma aposta de António Costa com a nomeação de Pedro Nuno Santos (com resultados questionáveis). E volta a ser aposta de Montenegro, até porque estão aqui alguns dos nós mais políticos que o novo governo terá de desatar e nos quais a palavra decisiva será sempre a do primeiro-ministro, como aliás já acontecia com o antecessor.
Luís Montenegro prometeu prioridade e rapidez para a futura solução aeroportuária, na sequência da entrega do relatório final da comissão técnica independente. Mas apesar deste processo ter seguido o guião escrito a dois (pelo então líder do PS e o PM em exercício), os social-democratas começaram a levantar ondas ainda na oposição. E foi precisamente Miguel Pinto de Luz quem deu voz a essas reservas, questionando a independência e isenção dos membros da CTI (uma suspeita muito alimentada pelo ex-presidente do CDS, Paulo Portas, na sua encarnação como comentador na TVI). E indicando que o PSD iria nomear um grupo de trabalho interno para avaliar as recomendações.
A alimentar mais as dúvidas de que o relatório, ou pelo menos as recomendações, podem cair no vazio, está o envolvimento do autarca de Santarém na proposta para esta localização. Ricardo Gonçalves foi apoiante de Pinto Luz quando este concorreu nas diretas de 2020. Por outro lado, um dos técnicos que estudou o aeroporto no capítulo económico vai-se sentar à mesa do Conselho de Ministros também, embora com uma pasta que nada tem a ver (Fernando Alexandre será o ministro da Educação).
Outra grande incógnita neste dossiê é a relação com a concessionária aeroportuária. A ANA é contra a solução recomendada — Campo de Tiro de Alcochete ou Vendas Novas — mas também não será grande fã de Santarém que até fica fora da sua área exclusiva. Mas a solução que defende tem pouca margem para ser politicamente validada, por causa das grandes objeções ambientais e de saúde pública apontadas. O facto de a empresa ter como chairman um antigo e influente dirigente do PSD — José Luís Arnaut — da qual Montenegro já teve de se distanciar publicamente, é mais uma peça do puzzle do novo aeroporto que o novo Governo terá de montar.
A primeira área onde o futuro governo quererá mostrar trabalho depressa será provavelmente a habitação que regressa à pasta das Infraestruturas depois de ter tido honras de um ministério. A crise deu visibilidade a este setor que só tarde mereceu a atenção do Governo de António Costa. É de esperar que haja mexidas relevantes no Pacote Mais Habitação, a começar pelas restrições ao Alojamento Local. Mas não só. O programa eleitoral do PSD prevê PPP para promover a construção de habitação a preços acessíveis.
Uma das chaves para resolver o problema da habitação poderá ter sido lançada ainda pelo governo de António Costa, com o lançamento do Simplex do Urbanismo, que foi globalmente bem recebido pelo setor da promoção imobiliária embora outros – como os notários e os arquitetos – tenham deixado algumas críticas.
Caberá a Miguel Pinto Luz avaliar se a legislação deve sofrer alterações, mantendo o seu propósito de acelerar o ritmo dos licenciamentos habitacionais. E terá de ser o seu ministério, também, a monitorizar a forma como a legislação passa do papel para o mundo real.
Em simultâneo, será com Pinto Luz que o Governo irá avançar em mais dois processos importantes para simplificar a construção de casas – essencial já que a AD dizia no programa eleitoral que a solução para o problema da habitação passa pelo estímulo à oferta. Um desses processos é a produção do Código da Construção, que deverá estar pronto em 2026, e a criação de uma plataforma nacional de processos de licenciamento comparável ao Citius.
O então desconhecido secretário de Estado das Infraestruturas esteve no cargo um mês (em 2015 no segundo Governo liderado por Passos Coelho) para fechar uma das operações mais polémicas, a venda da TAP. Pinto Luz esteve na AR a defender a operação e desmentir Pedro Marques (o sucessor socialista na pasta) sobre omissões relativas a esta privatização na passagem de pasta.
Agora será o principal rosto da nova privatização da TAP. Apesar da TAP ter sido uma das principais armas da oposição social-democrata a António Costa e Pedro Nuno Santos, os ataques centraram-se na ajuda pública de 3,2 mil milhões de euros. O PSD será a favor da venda da TAP e até da maioria do capital, como preparou Costa (e apesar da oposição do seu sucessor na liderança. E até pode culpar o antecessor se não conseguir (como não deve conseguir) recuperar na venda todo o dinheiro que o Estado colocou.
Mas tal como foi para o anterior Governo, a TAP será sempre um dossiê escaldante, seja pela privatização, seja pelos resultados ou qualquer caso inesperado que venha a rebentar. E será um dos alvos preferenciais para a oposição à direita do Chega e à esquerda do PS que são contra a cedência da maioria do capital.
O TGV foi um dos assuntos que marcou a gestão corrente do Governo demissionário. João Galamba, a dias de se demitir de ministro, e depois António Costa, repetiram que era necessário avançar com um concurso para o primeiro troço da linha Lisboa-Porto em janeiro. Se não, Portugal perdia fundos europeus. E pedia a bênção do maior partido da oposição para um projeto que depois de muita polémica passada parece ser consensual. Os social-democratas desconfiaram do argumento, torceram o nariz ao lançamento de uma obra de regime que soava a propaganda e investigaram em Bruxelas o fundamento do pedido do PS.
Acabaram por ceder, mas não sem manifestar reservas sobre o modelo financeiro adotado — parceria público privada dividida em duas nesta primeira fase. Terão de decidir a adjudicação do primeiro concurso e ficou tudo preparado para o lançamento do próximo concurso para o segundo troço entre Oiã-Soure no final do primeiro semestre. No passado, a alta velocidade foi um dos projetos mais revistos a cada mudança de Governo, o que resultou numa mão cheia de nada em termos de execução. Se o PSD cair nessa tentação e fizer mais do que ajustamentos, o resultado pode repetir-se.
O novo ministro será também o Sr. dos Transportes recuperando a mobilidade urbana que com os socialistas tinha passado para o Ambiente. Enquanto Pinto Luz foi vereador e vice-presidente, a Câmara de Cascais generalizou os transportes gratuitos dentro do concelho. Parece ser uma boa notícia para a grande massa dos utilizadores de transportes públicos nas áreas urbanas, que com os governos socialistas passaram a ter descontos substanciais no preço dos passes, com financiamento garantido para este ano. Mas foi também o vereador Pinto Luz que pediu um estudo de viabilidade para substituir a linha de Cascais por um BRT (um autocarro elétrico rápido com via dedicada) — na verdade por dois BRT (um no eixo da atual linha ferroviária e outro num corredor dedicado da A5). Mas como a modernização da linha de Cascais está em curso, talvez esta ideia caia.
Mas um dos projetos que pode ser afinado é o da polémica linha circular do Metro de Lisboa, e em sintonia com as reivindicações da autarquia de Lisboa — esta tem sido uma guerra perdida de Carlos Moedas com os governos socialistas. Ainda esta semana, a Câmara propôs que a operação seja feita em laço em vez de circular, o que implicaria mexer no projeto de uma obra que tem o fim previsto já para 2025.
Pinto Luz herda ainda a “revolução ferroviária” de Pedro Nuno Santos que terá de continuar, acelerar (porque está tudo bastante atrasado), ou alterar. Mas a margem de manobra é muito limitada pelo risco de perda de fundos europeus e do PRR.
O facto de a mesma ter sido lançada pelo atual secretário-geral dos socialistas, que está na linha da frente da oposição, poderá ser um fator a ter em conta na forma como a pasta vai ser gerida, pelo menos nos projetos mais caros a Pedro Nuno Santos. À boleia do aeroporto e do TGV e dependendo do tempo que durar esta legislatura, poderá ainda ter que ser tomada uma decisão sobre a terceira travessia sobre o Tejo.
Miguel Pinto Luz chega a ministro abdicando de uma carreira de autarca que, tendo em conta o histórico do concelho de Cascais, lhe dava boas expectativas de assumir a presidência de uma das maiores autarquias do país. Afilhado político de Carreiras, Pinto Luz chegou a vice-presidente da câmara de Cascais e cedo se destacou pela forma hábil com que conseguia que os seus feitos autárquicos fossem publicamente reconhecidos
No partido começou a ganhar influência quando conquistou a poderosa distrital de Lisboa com a benção do então líder incontestado Pedro Passos Coelho. Visto como um dos mais fiéis defensores do passismo, chegou a ser chamado pelo primeiro-ministro para secretário de Estado das Infraestruturas num governo que acabaria por durar apenas 27 dias.
Finda a curta experiência, nos anos seguintes continuou a exercer a sua influência política através de Cascais. Saiu definitivamente do anonimato quando concorreu nas diretas de 2020 contra Luís Montenegro e Rui Rio. Ficou em terceiro lugar, mas ganhou notoriedade interna. Esteve depois ao lado de Paulo Rangel em 2021, não apoiou Montenegro em 2022, mas este último acabaria por chamá-lo para vice-presidente numa tentativa (conseguida) de unir o partido.
Mais recentemente teve de enfrentar um dilema: ou assumia a presidência da câmara de Cascais ou arriscava ir como deputado para cumprir o seu novo objetivo de ser ministro das Infraestruturas. Optou pela segunda e conseguiu as pastas que queria. Numa tutela que será, previsivelmente, das mais difíceis de segurar no Governo.
Pedro Reis. Ministério da Economia
“As prioridades, do ponto de vista do Estado, são justamente remover custos de contexto, aliviar fiscalidade, acabar com burocracias, recuperar a diplomacia económica que se perdeu”. A frase é do próximo ministro da Economia, Pedro Reis, em entrevista ao Público. O economista (que considera que teria dado um bom advogado), que foi presidente da AICEP no tempo de Pedro Passos Coelho e perdeu a corrida a bastonário à Ordem dos Economistas (por 37 votos em 2021), assume-se como oriundo do mundo das empresas. “Eu sou um homem das PME” disse em 2011 quando aceitou o desafio do Governo de coligação PSD/CDS para liderar a Agência que negoceia os grandes projetos de investimento, nomeadamente o estrangeiro, e impulsiona a internacionalização das empresas portuguesas. Deixou a AICEP em 2014, não fazendo um segundo mandato. Na ocasião falou-se do seu nome para liderar a entidade que na altura se designava de Instituição Financeira de Desenvolvimento, tornada hoje Banco Português de Fomento. Não seguiu esse rumo. Foi para a banca privada, para o BCP, depois de ter sido convidado, quando ainda estava na presidência da AICEP, para administrador não executivo da Caixa Geral de Depósitos. Por possíveis conflitos de interesse pediu parecer à Associação Portuguesa de Bancos (APB) e, na falta de resposta, optou por recusar o cargo no banco público.
No ano em que o convite para a AICEP chegou tinha lançado o livro “Voltar a Crescer”, que continha prefácio de Pedro Passos Coelho, que apoiou e ajudou a chegar ao Governo. Foi, aliás, o então líder social-democrata que desafiou Pedro Reis a elaborar a obra que serviu de base ao programa eleitoral das eleições de 2011. A obra demorou nove meses, foi feita com entrevistas a 55 empresários e gestores e contém 365 ideias para o país. O livro foi apresentado a 15 de março de 2011, pouco mais de duas semanas antes de Portugal pedir ajuda externa (6 de abril de 2011).
Aproximou-se do PSD em 2005, pela mão de Marques Mendes, que, quando foi presidente social-democrata convidou 30 personalidades a inscreverem-se no partido. O Público contou que Pedro Reis aceitou, mas nunca teve uma participação muito ativa no partido. Acabou por entrar mais na profundeza da política com Passos Coelho e, agora, torna-se ministro com Luís Montenegro, que colocou Pedro Reis na coordenação do Movimento Acreditar, plataforma de discussão política com a sociedade civil, criada em 2022, a pensar já na elaboração de um programa de Governo. Também chegou a assumir a presidência, em 2016, do Instituto Francisco Sá Carneiro.
Aos 56 anos, Pedro Reis é o ministro das empresas e vem desse universo. Terá a missão de tutela da AICEP (que neste momento é partilhada entre Economia e Negócios Estrangeiros) – que o programa da AD prometeu reforçar nomeadamente na rede exterior – a qual liderou. Durante o seu mandato, o Tribunal de Contas, segundo noticiou o Público, apurou pagamentos a fornecedores antes do envio para fiscalização prévia desse órgão. Foram detetados casos pelo período entre 2012 e 2016, o que acabava por englobar a gestão de Pedro Reis, mas extensível à liderança posterior de Miguel Frasquilho. O cargo na AICEP valeu-lhe a condecoração pelo Presidente Cavaco Silva.
Além da AICEP, a pasta da Economia contém a tutela do IAPMEI, que é uma das entidades intermediárias que mais fundos europeus (incluindo PRR) tem de colocar no terreno. No programa da AD incluiu-se a pretensão de “reforçar a articulação entre AICEP e IAPMEI, bem como outras instituições com impacto no desenvolvimento económico das empresas, para alinhar os vetores estratégicos”.
Os desafios desta pasta não ficam por aqui. Tem a tutela do setor do turismo – um motor da economia – e do comércio, pasta que Costa e Silva, ministro da Economia cessante, resolveu juntar numa única secretaria de Estado.
Chegará ao Ministério da Economia com um acordo de rendimentos em cima da mesa, um acordo que a CIP (onde Pedro Reis é vice-presidente do Conselho Estratégico para Investimento Externo) não assinou quando aconteceu, em 2023, a revisão do acordo. Terá também de se bater pela descida dos impostos para empresas, que sempre defendeu, e que a AD prometeu no seu programa – colocar o IRC nos 15% progressivamente. Parte da taxa atual de 21%. Os impostos são pelouro das Finanças, mas a Economia é que tem de ouvir as empresas.
Pedro Reis já esteve (ou está) em vários conselhos consultivos – Conselho Estratégico de Internacionalização da Economia (CEIE), Conselho Nacional para o Empreendedorismo e a Inovação, Conselho da Indústria do Ministério da Economia, Conselho Geral e de Supervisão da Portugal Ventures.
Neste momento integra o do Banco de Fomento, entidade que tem de pôr a funcionar melhor. Costa e Silva, que ocupa o Ministério da Economia, assumiu que não foi um caso de sucesso.
Licenciado em gestão e administração de empresas pela Universidade Católica, continuou a sua formação em Harvard Business School (EUA) e no Insead (França). Logo após a licenciatura entrou no mundo das empresas, onde a sua família estava. A Altamira foi a sua primeira casa como gestor. Era a empresa da família, intervencionada no 25 de abril – que o próprio diz ter sido tomada “por engano” – e que levou o agregado (pais e irmãos, entre eles Gonçalo Reis, ex-presidente da RTP) ao outro lado do Atlântico. Foi no Brasil que passou a infância. O tropicalismo ficou. Pedro Reis regressou a Portugal. Depois de se formar entrou na Altamira, empresa de mobiliário da família, mas foi uma proposta de venda de outra companhia familiar, de andaimes, – a Tubos – que o levou a travar essa alienação. Foi o próprio que comprou a empresa que mais tarde venderia. É a venda da Tubos que leva Pedro Reis a outro mundo, o da comunicação. Participa na Imago e, mais tarde, na Cunha Vaz & Associados, consultoras de comunicação. “Cheguei pela primeira vez onde está a minha vocação: as relações públicas”, explicou ao DN a sua opção pela entrada na Imago. E chegou, mais tarde, também, com a escrita de artigos de opinião, aos jornais – Independente e Fortunas.
Pai de três filhos casou com uma colega de faculdade, Rita. Os seus perfis apontam-no como homem que gosta de ler mas assume que viajar é uma das suas maiores paixões. “Comprei a liberdade com o meu trabalho. Cheguei aos 40 anos e posso escolher fazer o que gosto e em que acredito”, declarou ao DN em 2009.
Maria do Rosário Palma Ramalho. Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social
Rosário Palma Ramalho não é uma desconhecida no mundo do direito do trabalho. É presidente da Associação Portuguesa de Direito do Trabalho, cargo que começou por ocupar em 2013 e ao qual voltou em 2017, 2018, 2021 e 2024. Segundo uma entrevista que deu ao Negócios em 2018, foi a terceira pessoa em Portugal a tirar um doutoramento em Direito do Trabalho. Aos 63 anos, sucede a Ana Mendes Godinho na liderança das pastas do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social.
São conhecidas as suas posições em relação a vários temas, do teletrabalho à contratação coletiva, até ao direito a desligar e à contratação a termo. Em 2018, defendeu ao Negócios que “o tempo do trabalho é das matérias em que hoje em dia o empregador praticamente tudo pode fazer” e que, em Portugal, “trabalha-se muitas horas mas não se trabalha produtivamente muitas horas”, considerando que os empresários portugueses são “tradicionais”: “Gostam de ter o trabalhador lá muitas horas. É uma cultura. E isso não se coaduna com outras vidas que as pessoas têm direito a ter”, defendia, na altura.
Já então, e mesmo posteriormente, em 2021, defendeu um reforço do direito à desconexão, não necessariamente por via da regulação (como veio a acontecer com o anterior governo) mas numa lógica de mentalidade e cultura. “Precisamos de nos habituar, enquanto trabalhadores, a não atender o telefone” (fora de horas)”, afirmou.
Foi muito crítica do aumento do período experimental para jovens à procura do primeiro emprego e de desempregados de longa duração e da figura das portarias de extensão, que permitem — por determinação do governo — alargar uma convenção coletiva a empregadores e trabalhadores do mesmo setor de atividade que não tenham participado na sua negociação. Porque tal “despromove” a filiação sindical uma vez que o trabalhador “sabe que cedo ou tarde lhe vai ser aplicada a convenção coletiva e, portanto, não tem de se mexer, não tem de se filiar nos sindicatos”.
Em matéria da contratação a termo, que também foi alvo de alterações legislativas com Vieira da Silva com a intenção de a restringir, Palma Ramalho defendia, em 2018, que Portugal tinha um “regime muito restritivo em matéria de despedimentos”. “Nos países que têm um regime mais livre de despedimento o recurso à contratação a termo é muito mais limitado”, argumentou.
A sua intervenção chegou, também, à administração pública, tendo coordenado a equipa de juristas que redigiu a lei geral do trabalho em funções públicas, que data de 2014 e veio concentrar num diploma uma miríade de legislação dispersa e deu passos para a aproximação ao regime de trabalho do setor privado.
Em 2021, em plena pandemia, antecipava que o trabalho à distância iria continuar em força apesar da Covid, “porque a pandemia veio provar que um bom trabalhador presencial é também um bom trabalhador remoto e que teletrabalho não significa trabalho menos produtivo, nem trabalho de menor qualidade, nem menos tempo de trabalho”. Mas admitia que do ponto de vista da gestão “traz muitos desafios” e mostrava preocupação, mais do que com o pagamento das despesas com o teletrabalho, com a conciliação entre a vida pessoal e familiar e a segurança e saúde no trabalho.
“Os horários que o trabalhador teria na sua empresa não são aqueles que está a seguir na sua sala. Porque, se calhar, interrompe o que está a fazer para deitar os filhos, mas depois recomeça às 10 ou 11 da noite. O trabalhador não vai para o trabalho, nem volta do trabalho. Portanto, não faz o necessário corte”, defendeu, noutra entrevista no mesmo ano.
Licenciada em Direito pela Universidade Católica Portuguesa, é mestre na mesma área, com especialidade em ciências jurídicas pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. É doutorada pela mesma instituição, onde é professora catedrática desde 2010 nas áreas de Direito do Trabalho e Teoria Geral do Direito Civil.
A nota biográfica que consta no site da faculdade revela a experiência na área: é, há três anos, vice-presidente da ISLSSL (Sociedade Internacional de Direito do Trabalho e Segurança Social), membro do Comité de Juristas da Comissão Europeia em matéria de Igualdade de Género e Não Discriminação, investigadora, árbitro presidente do Conselho Económico e Social (CES), coordenou projetos internacionais nas áreas do direito do trabalho, igualdade e foi consultora da Comissão Europeia, do Parlamento Europeu e da Organização Internacional do Trabalho. Assinou diversos artigos nas áreas do Direito do Trabalho, direito da Segurança Social, Direito Civil e Direito da Igualdade.
É casada com António Ramalho, ex-presidente executivo do Novo Banco, com quem tem duas filhas. A mais velha, Inês, advogada especialista na área de governance, banca e mercados financeiros, é vice-presidente do PSD. Rosário Palma Ramalho é irmã da escritora Margarida Rebelo Pinto, que chegou a descrevê-la como um “poço de sensatez e sabedoria”.
Pela frente, Palma Ramalho terá enormes desafios ligados à sustentabilidade da Segurança Social e um debate que, por natureza, é polarizado, aceso e pouco consensual. À partida, a sustentabilidade do sistema não estará em risco no curto prazo — a receita com contribuições sociais, por exemplo, ficou em 2023 acima do projetado à boleia de um emprego em máximos, da imigração e dos salários —, mas a longo prazo projetam-se riscos de rutura, à medida que o envelhecimento populacional e a baixa natalidade reduzem a população ativa e fazem crescer a despesa com pensões e cuidados de saúde.
No programa eleitoral da AD, o tema da sustentabilidade do sistema da Segurança Social esteve presente, mas numa lógica de discussão “esclarecida e serena, num contexto de estabilidade e previsibilidade das regras, contribuições e benefícios”, atirando para a legislatura seguinte eventuais alterações. O governo que agora cessa funções nomeou uma comissão em meados de 2022 para estudar alternativas de financiamento do sistema, mas não é certo que destino o novo governo dará às conclusões — se vai aproveitá-las ou metê-las na gaveta.
Para esta legislatura, a AD fixou também como prioridade uma “resposta mais efetiva às situações economicamente mais frágeis”, tanto reformados como trabalhadores. Algumas das medidas que criaram expectativa, prometidas durante a campanha, foram a subida do valor de referência do complemento solidário para idosos até aos 820 euros em 2028, o final da legislatura, ou o novo suplemento para incentivar desempregados a voltarem ao ativo.
Na área do emprego, Palma Ramalho herda um mercado de trabalho com emprego em máximos (em 2023, ficou muito perto dos cinco milhões de trabalhadores), mas nem por isso isento de problemas. Se o emprego cresceu, o desemprego também, com a taxa a subir ligeiramente (0,4 p.p.) face ao ano anterior, para 6,5%, e a taxa de desemprego jovem ainda particularmente elevada, acima dos 20%. O layoff aumentou pelo segundo mês consecutivo, em fevereiro, depois de ter atingido em novembro o valor mais elevado de sempre.
A pasta terá ainda pela frente o desafio da fixação dos jovens, da diminuição da precariedade e dos salários. A propósito deste último ponto, o programa eleitoral da AD prevê a subida do salário mínimo para 1.000 euros em 2028 e do salário médio para os 1.750 euros em 2030, “com base em ganhos de produtividade e diálogo social”. Mas não é certo que esse diálogo seja pacífico, com uma nova liderança da CGTP que promete aumentar a contestação social.
Maria da Graça Carvalho, ministra do Ambiente e Energia
Maria da Graça Carvalho é uma veterana do Parlamento Europeu, onde começou por ser deputada entre 2009 e 2014. Académica e investigadora muito ativa e com um currículo muito diversificado ao qual não falta experiência governativa.
Ministra da Energia? “Não estou e pensar nisso.”
Com 68 anos será a ministra mais velha do Executivo de Luís Montenegro, um cargo que não esperava, segundo confessou quando lhe fizeram a pergunta: “Se fosse a próxima ministra da Energia em Portugal? Oh, meu Deus! Não estou a pensar nisso. A função é muito importante, de grande dedicação, a 200%. Para já estou a acabar os meus relatórios”. A resposta foi dada ao Jornal Económico em dezembro de 2023, pouco depois de Maria da Graça Carvalho ter ganhado protagonismo como uma das relatoras do pacote de reforma do mercado elétrico na União Europeia. Perante a insistência na questão, Maria Graça de Carvalho indicou que este grande pacote de legislação define o que deve ser feito e que é necessário transpor. “É preciso arregaçar as mangas e fazer.”
A nova inquilina do palácio da Rua do Século (onde fica o Ministério do Ambiente) tem um percurso mais ligado à ciência, pasta da qual foi ministra (da ciência e ensino superior) em dois governos seguidos, o de Durão Barroso e de Santana Lopes (entre 2002 e 2004).
Carlos Moedas chamou-a para conselheira quando ocupou o cargo de comissário para a investigação, ciência e inovação e desempenhou também a função de conselheira principal do presidente da Comissão, Durão Barroso, para as áreas da ciência, ensino superior, inovação, energia, meio ambiente e alterações climáticas.
Os socialistas colocaram no centro da política energética o travão aos preços (sobretudo da eletricidade), o que implicou muitas transferências financeira do Estado para o sistema elétrico e a manutenção das contribuições extraordinárias setoriais (criadas por um governo do PSD como temporárias). Enquanto negociadora do novo mercado energético, a futura ministra sublinhou que os grandes beneficiários serão os consumidores na medida em que as faturas de energia ficarão menos dependentes das oscilações de preço que marcaram a crise energética causada pela invasão da Ucrânia. Para vários países, incluindo Portugal, a reforma não foi tão longe como poderia ter ido, mas a estabilidade dos preços foi uma preocupação central.
Como deputada europeia, Maria Graça de Carvalho fazia parte da comissão do mercado interno e da defesa do consumidor e era membro das comissões no Parlamento Europeu da Indústria, Investigação e Energia, para os direitos da mulher e igualdade da género e para a inteligência artificial. É uma profunda conhecedora das políticas europeias para uma independência energética dos fornecedores de combustíveis fósseis, o que passa necessariamente pela expansão das renováveis.
Uma das decisões mais importantes que vai encontrar é a relativa ao concurso para a potência eólica offshore, um mega-processo no qual já 49 empresas mostraram interesse, mas que pode ter grandes resistências locais, sobretudo no setor da pesca. Está por definir o modelo financeiro deste concurso que poderá exigir a subsidiação das tarifas aos produtores, o que irá suscitar oposição. Maria da Graça já se manifestou favorável ao avanço deste projeto.
Eólicas no mar, gás e lítio. Concursos na energia ficam para o próximo Governo
Outros temas da autonomia energética são as estratégias nacionais para o lítio e para o hidrogénio que foram envolvidos nas diligências iniciais da Operação Influencer. Entre as suspeitas que incidem sobre decisões políticas e administrativas e fortíssima contestação local no caso do lítio, o novo ministro terá de decidir se prossegue com o caminho definido de desenvolvimento da atividade mineira e industrial ou se muda a rota.
Maria Graça de Carvalho tem uma longa experiência de trabalho científico, tendo fundado um grupo de investigadores ligados à energia e desenvolvimento sustentável. O hidrogénio foi um dos temas que investigou e que qualifica de muito importante, mas, na já referida entrevista, sugere uma mudança de atores por causa da Operação Influencer. “Acho que pode ser positivo no sentido de que é preciso redimensionar os projetos de hidrogénio que são de grande dimensão”.
Defende ainda a proximidade entre a produção e o consumo, mostrando reservas sobre o transporte de hidrogénio previsto no projeto do corredor verde que vai ligar Portugal à rede europeia. Este projeto causou grande guerra entre o Governo do PS e o PSD que acusou o Governo de ter falhado na execução do gasoduto que tinha sido contratualizado no tempo de Passos Coelho com Espanha e França — e que era apenas para o gás natural.
Com um percurso que faz a ponte entre o ambiente e a energia, a nova ministra terá de prestar atenção ao licenciamento que tem travado a expansão da potência renovável. Para além de um pipeline significativo (e atrasado) de projetos solares, o Governo de Costa deixa uma estrutura de missão criada para acelerar estes projetos e um simplex ambiental e industrial que não é consensual. Há uma crescente oposição local e até judicial à instalação de mega-centrais, como a de Santiago do Cacém, ou de projetos que impliquem o abate de espécies protegidas. Caberá ao seu ministério conciliar a expansão das renováveis com a proteção ambiental.
A sempre difícil gestão da seca pode ser uma das grandes dores de cabeça, sobretudo se quem ocupar a pasta da Agricultura puxar mais pelas reivindicações dos agricultores face à luta contra as alterações climática. A aceleração do plano de regadios ou até planos de transvases do Alqueva para a produção agrícola a sul podem criar pressão no Ministério do Ambiente. Ainda que os dois ministros — Maria da Graça de Carvalho e José Manuel Fernandes que foi escolhido para a Agricultura — sejam colegas de bancada no Parlamento Europeu. Terá também de executar os planos de eficiência hídrica onde estão previstas dessalinizadoras e recuperar o atraso português nas metas de resíduos.
Com um currículo recheado de cargos em associações e institutos ligados sobretudo à ciência, a futura ministra do Ambiente foi vice-presidente da Ordem dos Engenheiros e é presidente do Instituto Francisco Sá Carneiro desde 2020. Licenciada em engenharia mecânica e doutorada no Imperial College of Science, Maria Graça de Carvalho é professora doutorada no Instituto Superior Técnico. Recebeu o Prémio Maria de Lourdes Pintassilgo que distingue mulheres cientistas e várias outras distinções incluindo o de Grande Oficial da Ordem da Instrução Pública concedida pelo Presidente da República.
Margarida Balseiro Lopes. Ministra da Juventude e Modernização
Margarida Balseiro Lopes entra na equipa governativa de Montenegro com um recorde para apresentar: aos 34 anos e 6 meses, será (por uma diferença de dois meses) a mais nova ministra de sempre a assumir funções, destronando uma marca que pertencia a Marina Gonçalves, a quem António Costa entregou a pasta da Habitação.
Balseiro Lopes assume, não por acaso, a pasta da Juventude (a par da Modernização), concentrando-se em implementar políticas dirigidas a eleitores de uma faixa etária que os partidos mais tradicionais têm visto fugir para as novas forças políticas (caso do Chega, para dar o exemplo mais flagrante).
Herda a Modernização Administrativa de um secretário de Estado que reportava a António Costa (Mário Campolargo). O simplex é uma das tarefas em mãos. Não há impossíveis, chegou a dizer António Costa, quando apresentou o Simplex em 2016 com uma vaca voadora à então ministra da Presidência, Maria Manuel Leitão Marques. Foi já em março, com o Governo em fim de vida, que Campolargo apresentou um novo modelo de atendimento público, assente no serviço integrado das várias entidades da Administração Pública, a marca Cidadão e o novo Cartão Cidadão. É a herança deixada por Costa. Na Pasta da Modernização está toda a dinâmica das Lojas do Cidadão.
Eleita deputada pela primeira vez em 2015, saiu das listas de candidatos às legislativas de 2022 em divergência com a direção de Rui Rio, mas num momento em que também já tinha manifestado vontade de se afastar do palco parlamentar. Esse afastamento era visível já em 2019 quando, como cabeça de lista às legislativas pelo círculo de Leiria, convida várias figuras críticas de Rio para momentos da campanha (casos de Luís Marques Mendes, mas também, e sobretudo, de Hugo Soares e do próprio Luís Montenegro).
Antes, a nova ministra, e atual vice-presidente do PSD, foi líder da Juventude Social Democrata entre 2018 e 2020, sucedendo a Simão Ribeiro.
No plano académico, Balseiro Lopes é licenciada em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa, mestre em Direito e Gestão pela Universidade Católica e iniciou, em 2021, um doutoramento em Direito pela mesma instituição.
José Manuel Fernandes. Ministro da Agricultura e Pesca
Na semana passada, no Altice Fórum Braga, José Manuel Fernandes participava, enquanto eurodeputado, na Agro – Feira Internacional de Agricultura, Pecuária e Alimentação. Era o prenúncio do que viria a acontecer esta quinta-feira. Ao fim de 15 anos, José Manuel Fernandes deixa Bruxelas para ser ministro da Agricultura e Pescas do Governo de Luís Montenegro.
O setor agrícola não é completamente novo para o vilaverdense (de onde até foi presidente da Câmara) de 56 anos, mas a experiência é recente. Desde julho do ano passado que é membro efetivo da Comissão de Agricultura e do Desenvolvimento Rural do Parlamento Europeu, que acompanha a implementação da nova PAC, que vai ser um dos seus grandes desafios na pasta. Foi nesse âmbito que visitou a Agro em Braga, onde viu “a resiliência e a competência dos nossos agricultores e dos agentes do setor agrícola”, segundo um post que publicou esta terça-feira no Instagram.
Desde que entrou na comissão, não tem sido parco nas intervenções sobre o setor. Uma das medidas mais controversas discutidas em Bruxelas nos últimos meses, relativa à possível introdução de mensagens negativas nos rótulos do vinho, mereceu o seu repúdio. “Daqui levo a certeza que é inaceitável quererem – como muitos pretendem na União Europeia – rotular as garrafas de vinho com mensagens negativas, como aquelas que existem, por exemplo, nos maços de cigarros. O vinho consumido com moderação não faz mal”, declarou em setembro após uma visita à região do Minho.
Na visão de José Manuel Fernandes, licenciado em Engenharia de Sistemas e Informática pela Universidade do Minho (ainda se aventurou num curso de Direito que não concluiu) “o setor agrícola e o mundo rural não têm sido devidamente apoiados e valorizados”. “Acarinhar” os produtores e diminuir a burocracia são alguns dos pilares que defende para o setor. “Burocracia que só traz entrave, desmotivação e aumento de custos”, defende.
O ainda eurodeputado sabe que vai encontrar um setor desmotivado, e até revoltado, que acabou de protagonizar protestos sonoros nas ruas. Sobre essas manifestações foi perentório ao defender os motivos dos produtores, num artigo publicado no jornal Novo. “Não fico surpreendido com os fortes protestos dos agricultores. Há um radicalismo verde e uma ecologia punitiva que prejudica os agricultores e não beneficia nem a qualidade dos solos, nem o combate às alterações climáticas. Há responsabilidades da Comissão Europeia, do Conselho da UE, do Parlamento Europeu e dos governos nacionais. Os agricultores protestam com razão. Lançaram um grito de revolta que tem de originar uma ação concreta e rápida a nível europeu e a nível nacional”.
Como ministro, José Manuel Fernandes poderá ser parte ativa dessa “ação concreta”. A herança é pesada. Se houve governante que nunca colheu o apoio do setor que tutelava nos anteriores executivos de António Costa foi a ministra da Agricultura. Maria do Céu Antunes viveu sempre em pé de guerra com os agricultores, que a acusavam de falta de competência técnica e de ligação ao mundo rural. As críticas surgiram, sobretudo, da principal confederação do setor, a CAP, que durante a maior parte do mandato da ministra foi presidida por Eduardo Oliveira e Sousa, eleito deputado pela AD nas legislativas de 10 de março. Apaziguar um setor que se diz ignorado pelo poder político, com queixas constantes relativamente aos atrasos na entrega dos apoios aos agricultores, bem como à insuficiência das ajudas para garantir a competitividade do setor, vai ser o grande desafio do novo ministro.
Foi há menos de dois meses, no início de fevereiro, que o protesto dos agricultores ameaçou parar o país, com bloqueio de estradas e fronteiras. As queixas já vinham a acumular-se desde a entrada em vigor da PEPAC, a reforma da Política Agrícola Comum (PAC) que vigora entre 2023 e 2027. Os produtores denunciavam, então, perdas nas ajudas diretas por erros de programação, atrasos nos pagamentos e o excesso de exigências no acesso às medidas ambientais. Ainda em funções, Maria do Céu Antunes prometeu submeter a Bruxelas reprogramação da PEPAC até ao fim do mandato, no sentido de, por exemplo, reverter cortes nos pagamentos relativos aos ecoregimes. Neste âmbito, ficou prometido o reforço do segundo pilar do PEPAC, relativo ao desenvolvimento rural, com 60 milhões de euros. Mas a então ministra avisou que algumas dimensões não poderiam ser aceleradas, nomeadamente mexer no primeiro pilar da PAC, que diz respeito aos pagamentos diretos, antes de 2026. Será um trabalho para o novo ministro.
Antes de abandonar o cargo, e também em resposta à revolta dos agricultores, Maria do Céu Antunes anunciou um pacote de apoio ao rendimento dos agricultores de 500 milhões de euros, com o objetivo de mitigar o impacto provocado pela seca e reforçar a PAC. A forma como parte deste dinheiro vai chegar ao terreno vai depender do ministério de José Manuel Fernandes, que acusou a sua antecessora de “incompetência” na gestão do dossier. “Não é aceitável que o governo retenha os montantes que recebe da UE e que são destinados aos agricultores. Não é compreensível que tenham havido cortes de cerca de 35% nos pagamentos diretos para a agricultura biológica. Foi preciso uma manifestação dos agricultores para prometerem gasóleo mais barato, o desbloqueamento das verbas que estão em atraso e a revisão dos cortes que foram assumidos como um lapso do ministério. É necessário colocar um ponto final em tanta desculpa e incompetência!”, escreveu em fevereiro.
As medidas de mitigação da seca severa que assola parte do país vão ser uma das missões mais importantes não só do novo ministério (que deixa de ser da Agricultura e Alimentação para passar a ser das Pescas) mas do novo Governo, em articulação com ministérios como o Ambiente ou a Coesão. Sobre esse ponto também é conhecida a opinião do novo ministro. Para José Manuel Fernandes “o governo [socialista] desmantelou o Ministério da Agricultura e não quis solucionar o problema da seca que seria resolvido se armazenássemos a água e a geríssemos de forma eficiente. Por isso, insisti que deveríamos utilizar o PRR para este objetivo. Note-se que Portugal não quis 8300 milhões de euros que tinham de ser “sinalizados” até 31 de agosto de 2023. Não falta dinheiro, falta competência e vontade política!”.
Durante a campanha eleitoral, Montenegro destacou a agricultura como um “setor estratégico” para a ocupação do território e a soberania alimentar do país. O novo primeiro-ministro elencou como prioridades do Governo para o setor a reintegração das florestas e do desenvolvimento rural no mesmo ministério, isto depois de no segundo executivo de António Costa as florestas terem passado para a tutela do Ambiente, numa decisão que foi sempre muito criticada pelas associações do setor, que acusaram os socialistas de esvaziamento da pasta. Além deste ponto, Montenegro reforçou como prioritária a promoção de uma relação de proximidade com os agricultores, “pagar a tempo e horas diminuindo a burocracia” e “diminuir as diferenças de tratamento que existe com outros países da União Europeia, em particular com os nossos vizinhos espanhóis”. Mensagens que o eurodeputado José Manuel Fernandes já fez questão de veicular.
No Parlamento Europeu, foi relator e negociador do Orçamento da União Europeia para 2015 e relator do chamado Plano Juncker em 2016. Chegou a ser considerado em 2020, pelo ranking da Votewatch, o eurodeputado português mais influente e o 7º mais influente entre os 705 membros do Parlamento. Destacou-se no PSD no início dos anos 90, enquanto presidente da JSD de Vila Verde e foi eleito, no final da década, autarca do concelho onde nasceu, onde também deu aulas antes de enveredar pela política. No partido, chegou a presidente da comissão política distrital de Braga. É ainda Presidente da Mesa da Assembleia Geral do Sporting Clube de Braga.
Dalila Rodrigues. Ministra da Cultura
A historiadora de arte Dalila Rodrigues e atual diretora do Mosteiro dos Jerónimos e Torre de Belém é quem vai suceder a Pedro Adão e Silva à frente do Ministério da Cultura.
Nascida em Granja de Penedono, distrito de Viseu, em 1960, Dalila Rodrigues é doutorada em História da Arte pela Universidade de Coimbra e tem um longo percurso ligado a alguns dos principais museus e equipamentos culturais do país.
Foi diretora do Museu Grão Vasco, em Viseu, entre 2001 e 2004, e diretora do Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, entre 2004 e 2007, de onde saiu em rutura, depois de ter manifestado a sua oposição à tutela relativamente à autonomização do museu em questão. Dalila Rodrigues defendia a autonomia do MNAA, à semelhança do que acontece em Espanha com o Museu do Prado. A posição da então diretora da instituição motivou um abaixo-assinado de 16 diretores de museus e culminou na não renovação da comissão de serviço de Dalila Rodrigues. “Se tivesse ficado calada teria continuado a ser directora”, diria mais tarde em entrevista ao jornal Público. “Se tivesse acatado as indicações superiores e não tivesse manifestado — internamente primeiro, e publicamente depois — a minha discordância, eu seria outra”. À saída do museu lisboeta foi aplaudida por dezenas de pessoas que lá se haviam concentrado em seu apoio, reportava então Agência Lusa.
Após a saída polémica do MNAA, Dalila Rodrigues teve ainda uma breve passagem (sete meses) pela direção de Comunicação, Marketing e Desenvolvimento da Casa da Música, em 2008, nota o seu perfil no Linkedin, antes de assumir funções como a primeira diretora da Casa das Histórias Paula Rego cujo programa museológico concebeu, coordenou e realizou, entre 2008 e 2009. Meses depois da abertura do espaço em Cascais, Rodrigues acabaria por sair da instituição por falta de consenso no Conselho de Administração da Fundação Paula Rego sobre aquela que havia sido uma escolha pessoal da artista.
Foi neste período que Dalila Rodrigues regressou à atividade académica, que exerceu entre a Universidade de Coimbra e o Instituto Politécnico de Viseu.
Mais tarde, Rodrigues foi vogal do Conselho de Administração da Fundação Centro Cultural de Belém (CCB) e, nessa condição, da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea – Museu Coleção Berardo, de 2012 a 2015. É diretora da Torre de Belém e do Mosteiro dos Jerónimos desde 2019 e terminava o mandato este ano.
É investigadora integrada do Centro de Estudos de Arqueologia, Artes e Ciências do Património (CEAACP), Unidade de I&D 281 da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, e membro do Conselho Diretivo da “Associação Trienal de Arquitetura de Lisboa” desde 2010.
Em entrevista ao Observador, em novembro, Dalila Rodrigues assumiu que valoriza a tutela estatal na gestão do património do Estado Português, vendo “com preocupação a empresarialização de património com tanta importância e significado”, opondo-se veemente à centralização. Além disso, defende a lei da autonomia dos monumentos, salientando como é necessário trabalhar na resignificação de certos monumentos, apropriados noutras épocas pelos discursos propagandísticos e que, caso necessário, devolveria obras de arte aos respetivos países de origem. Para o futuro, diz, é preciso valorizar o património e os seus recursos humanos, gerir com equilíbrio o turismo massificado e compreender as alterações climáticas como um desafio fundamental na preservação patrimonial. Antecipando o fim do mandato sobre os dois monumentos de Belém, confessava que a mudança nunca representaria um dilema: “De qualquer forma, tenho uma carreira académica e não terei qualquer resistência a mudar de vida.”
Dalila Rodrigues: “A Torre de Belém não pode continuar a garantir funcionamento em permanência”
O desafio primário da sucessora de Pedro Adão e Silva no Palácio da Ajuda passará, desde logo, por provar que a direita não desvaloriza a pasta, uma vez que os governos do PSD têm tendencialmente remetido a Cultura para uma secretaria de Estado. O programa eleitoral da Aliança Democrática referia querer “aumentar em 50% o valor atribuído à cultura no OE, ao longo dos próximos 4 anos”, reconhecendo o “subfinanciamento enraizado” do setor.
Entre as primeiras provas de fogo para perceber a agilidade do novo Governo estarão os concursos de apoio sustentado às artes, na modalidade bienal (2025-2026), que terão que abrir até ao final de abril, de acordo com a declaração anual da Direção-Geral das Artes divulgada esta quarta-feira. São seis os concursos a abrir este ano: incluindo Teatro, Dança, Música, Ópera e Artes de Rua.
Por definir está a posição relativamente às alterações ao Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura, aprovadas pelo Governo socialista este mês, e que preveem a redução das taxas contributivas e a facilitação do acesso ao subsídio de suspensão de atividade cultural. O programa eleitoral da coligação liderada por Luís Montenegro não contemplava este instrumento.
A posição em relação às decisões que envolvem a gestão do património também vão estar sob redobrada atenção, motivada por recentes discussões (como o caso Domingos Sequeira), mas também porque é uma das áreas mais acarinhadas pela nova ministra. Os investimentos e apoios na área audiovisual (nomeadamente tudo o que envolve incentivos como cash rebate) estarão também entre os temas centrais.