Ao contrário da ferrovia, onde o Governo tem vindo a pressionar o PSD para validar o lançamento do concurso para o primeiro troço da linha de alta velocidade em janeiro, os principais concursos na área da energia — os quais foram anunciados para o final de 2023 — vão ficar em suspenso à espera de um novo Executivo. Estão nesta condição os concursos para a potência eólica no alto mar, para a Turbogás e ainda para a atribuição de novas concessões de lítio, confirmou o Ministério do Ambiente e Ação Climática.

A atual equipa que ocupa a pasta da Energia está a desenvolver trabalho preparatório para que estes dossiês possam avançar rapidamente após as eleições. É certo que concursos como o relativo à potência eólica em alto mar e o modelo para a central da Tapada do Outeiro vai depender também de quem vier a ocupar o poder em São Bento, sendo mais expectável a continuidade destes projetos num cenário em que os socialistas continuam no Governo.

O Ministério do Ambiente e Ação Climática (MAAC), liderado por Duarte Cordeiro (um apoiante de Pedro Nuno Santos) e com Ana Fontoura Gouveia na secretaria de Estado, quer deixar preparado um modelo de pré-qualificação e licitação para as eólicas offshore naquele que será o maior concurso de potência elétrica renovável desde os leilões para centrais solares em 2019 e 2020. São 3,5 gigawatts de potência distribuída por três áreas ao largo de Viana do Castelo, Figueira da Foz e Leixões num concurso que suscitou manifestações de interesse de 50 operadores. Associado a este procedimento estão investimentos de milhares de milhões de euros e a ambição de construir um cluster de equipamento e sua manutenção a partir dos portos.

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Em resposta ao Observador, o MAAC assume que o “calendário previsto para o lançamento do leilão eólico offshore foi alterado em resultado da atual situação política. O procedimento encontra-se na fase de diálogo com os promotores. Na sequência desta fase, o Grupo de Trabalho elaborará uma recomendação de modelo de pré-qualificação e licitação, bem como eventuais alterações legislativas que se revelem necessárias. Será competência do próximo Governo determinar os termos das fases de pré-qualificação e licitação, proceder a eventuais alterações legislativas e lançar as fases de pré-qualificação e licitação”.

Também o concurso para o novo modelo de exploração da Turbogás, cujo contrato de aquisição de energia termina no final do março, será adiado, o que obrigará a um definir um modelo de transição para manter esta central a gás ligada.

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Estava a ser estudado um modelo que ia combinar o gás natural com a hibridização (junção de eólicas com fotovoltaica) para preparar a descarbonização da central para gases renováveis. Mas mais uma vez, a atual situação política leva o MAAC a adiar aquilo que considera ser “uma decisão estrutural, com impacto durante pelo menos 10 anos”. O Governo acrescenta que “está a finalizar uma solução transitória para assegurar a continuidade da operação da Central até à conclusão do procedimento que venha a ser aberto para a escolha de um novo operador.”

O concurso nacional para prospeção de lítio, cujo calendário estava previsto para o final de 2023, ficará certamente na gaveta. E neste caso não é apenas a circunstância de o Governo estar em gestão que alterou os planos. Ainda que não se conheçam as suspeitas concretas nesta investigação, já se sabe que os contratos de exploração autorizados pela Agência Portuguesa do Ambiente  — da Lusorecursos em Montalegre e da Savannah em Boticas — estão no centro de um outro inquérito judicial relacionado com a Operação Influencer. Daí que as suspeitas sobre processos possam por em causa a estratégia nacional de lítio definida pelo Governo socialista.

O MAAC esclarece que para “assegurar os mais elevados padrões ambientais e sociais, e de promover o desenvolvimento de uma cadeia de valor nacional, em benefício das populações, o Governo encontrava-se a trabalhar nos critérios de qualificação para o Concurso de Prospeção e Pesquisa de Lítio para as 6 áreas identificadas na Avaliação Ambiental e Estratégica. No atual contexto político, a definição dos termos do concurso deverá caber ao próximo Governo”.

Para além do concurso internacional para prospeção e exploração de áreas previamente identificadas no norte do país e que ocupam 1500 quilómetros quadrados, conforme explicou a secretária de Estado da Energia, Ana Fontoura Gouveia, numa entrevista ao Observador, havia a meta de criação de um cluster industrial que retivesse em Portugal o elo da cadeia que permite maior valor acrescentado.

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O hidrogénio é outro dos dossiês de energia no coração da Operação Influencer. Mais uma vez não se conhecem ainda em concreto as suspeitas do Ministério Público, mas a PGR já fez saber que há um inquérito que investiga factos relativos ao projeto de central de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, apresentado por consórcio que se candidatou ao estatuto de Projetos Importantes de Interesse Comum Europeu (IPCEI). Este projeto acabou por não ir para a frente na sua configuração inicial e com os parceiros originais.

Para já, e no domínio dos gases renováveis, o que está em curso é a realização do primeiro leilão de compra centralizada de biometano e hidrogénio com recurso a eletricidade produzida por fontes renováveis. Este procedimento, diz o MAAC, está “pronto para lançamento: as peças do procedimento estão concluídas, após a incorporação dos contributos obtidos durante a fase de consulta pública, e as condições associadas aos auxílios de Estado estão aprovadas pela Comissão Europeia”. Mas não esclarece se esse lançamento irá ocorrer antes da entrada em funções de um novo Executivo.

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Outro concurso na área da energia que está na calha é o da concessão da rede elétrica de baixa tensão nacional, atualmente quase toda explorada pela E-Redes (empresa do grupo EDP). Aqui a iniciativa do procedimento pertence aos municípios, mas o Governo deixou prontas as regras para lançamento do concurso que será de âmbito nacional. Um concurso que está aliás já atrasado, considerando que vários contratos entre as autarquias e a E-Redes já deviam ter terminado.

Atualizado às 14h00 do dia 9 com nova resposta do Ministério do Ambiente e Ação Climática.