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MÁRIO CRUZ/LUSA

MÁRIO CRUZ/LUSA

Comunicação Social à deriva

No sexto aniversário do Observador, um dos seus fundadores, António Carrapatoso, escreve um ensaio sobre os problemas e os desafios da Comunicação Social, que anda há muitos anos à deriva.

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Os Ensaios do Observador juntam artigos de análise sobre as áreas mais importantes da sociedade portuguesa. O objetivo é debater — com factos e com números e sem complexos — qual a melhor forma de resolver alguns dos problemas que ameaçam o nosso desenvolvimento.

A Comunicação Social há muitos anos que anda à deriva. Nesta última década, o sector pouco evoluiu, perpetuou-se na crise e, sem a parte correspondente à televisão e à rádio de entretenimento, tornou-se deficitário no seu todo. Nestas circunstâncias é quase (mas só quase, como iremos ver) um mistério como tantas empresas e projectos foram conseguindo sobreviver, alguns perto da ruptura, permanecendo sem grandes mudanças internas ou alterações profundas do seu modelo de negócio.

A já existente fragilidade da Comunicação Social foi ampliada pela pandemia de Covid-19. É certo que esta gerou maior procura pela informação e, portanto, em muitos casos maiores audiências. Mas esse movimento foi acompanhado de uma quebra histórica nas receitas, reflexo da situação dos anunciantes que, perante uma economia parada, optaram por suspender a publicidade aos seus produtos. Num momento em que tanto foi necessária, a Comunicação Social viu novamente a sua sustentabilidade abalada. E, nesse contexto, renovou-se a urgência de debater o seu presente e a sua viabilidade futura.

O estado do sector

Praticamente não existem em Portugal, no sector da Comunicação Social, projectos ou empresas claramente saudáveis e rentáveis, sejam grandes ou pequenos, e que ao mesmo tempo evidenciem estratégias robustas e de crescimento que respondam cabalmente aos desafios do futuro. Todas as empresas ou grupos de comunicação estão, de certa forma, em dificuldades, ou no mínimo com muitos desafios. O que não quer dizer que não existam empresas viáveis. Os maiores grupos conseguem ainda ter resultados positivos significativos, no seu conjunto a decrescer nos últimos anos, porque têm TV (e num dos casos também rádio de entretenimento). Mas duvida-se que esses resultados remunerem devidamente o capital investido, estando ainda bastante ameaçados pelo previsível declínio da TV tradicional. Em 2019, o EBITDA (resultado operacional) acumulado das empresas de Comunicação Social, excluindo as actividades de TV e rádio de entretenimento, terá sido negativo — ou seja, esta parte do sector regista, no seu conjunto, um prejuízo operacional.

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Nos últimos dez anos, a situação da nossa Comunicação Social piorou com a redução, para cerca de metade, do total das receitas líquidas que lhe são acessíveis — publicidade/ eventos, receitas obtidas dos operadores de telecomunicações, chamadas de valor acrescentado, papel, assinaturas, etc.. Actualmente, na sua totalidade, estas não ascenderão a mais do que 600 milhões de euros, representando a publicidade acessível para os órgãos de comunicação nacional cerca de 60% deste valor e, por outro lado, as assinaturas digitais ainda apenas cerca de 1%. De notar que uma parte significativa destas receitas está mais ligada às actividades de entretenimento do que de informação. E que não se antecipa grande crescimento do total das receitas para os próximos anos, algumas das suas componentes irão mesmo continuar a registar decréscimos e outras, como as assinaturas, espera-se que venham a registar um crescimento substancial.

A Comunicação Social portuguesa há muito que não é suficientemente independente (dos governos, dos poderes económicos/ empresariais, dos bancos, de alguns anunciantes e de alguns tipos de accionistas). Em grande parte, devido à sua debilidade económica, mas também devido à inexistência nestas matérias da “imprensa livre” de uma forte cultura democrática.

Consequentemente tornou-se, nestes últimos anos, cada vez mais difícil manter equipas de redacção de informação alargadas e aumentar a qualidade e profundidade do trabalho editorial. O facto de projectos interessantes e motivadores não abundarem e a redução verificada nos salários no sector, pois as empresas têm pouca margem para praticar salários superiores, prejudicam a capacidade de atrair para a carreira aqueles que revelam maior potencial e de reter os que já detêm maiores qualificações e experiência, que muitas vezes acabam por prosseguir outros percursos profissionais.

Tão ou mais importante do que reconhecermos tudo isto é constatarmos que a Comunicação Social em Portugal não se tem vindo a afirmar e a consolidar como uma instituição qualificada da nossa democracia. Nesse sentido, não se encontra em melhor situação do que muitas outras instituições democráticas, elas também com desempenho insuficiente (como a instituição política, sindical, corporativa, da justiça, da escola pública, regulatória e outras). Ou seja, a Comunicação Social não conseguiu, portanto, cumprir com distinção e reconhecimento social o seu mais nobre e indispensável papel de informar, interpretar, explicar e traduzir, provocar, antecipar, escrutinar e investigar, com qualidade e abrangência, e na maior independência. A Comunicação Social portuguesa há muito que não é suficientemente independente (dos governos, dos poderes económicos/ empresariais, dos bancos, de alguns anunciantes e de alguns tipos de accionistas). Em grande parte, devido à sua debilidade económica, mas também devido à inexistência nestas matérias da “imprensa livre” de uma forte cultura democrática.

Muitos dos principais responsáveis das empresas do sector atribuem maioritariamente as culpas desta tão crítica situação ao facto de o mercado ser pequeno (e de facto é, não só em termos absolutos como em termos relativos face ao PIB). E, recentemente, de ter ficado ainda mais reduzido pela progressiva substituição do papel pelo digital, assim como pelo maior protagonismo das plataformas digitais internacionais (Google, Facebook, Netflix, HBO, Spotify, etc.), que retiram receitas de publicidade ao sector, na medida em que utilizam conteúdos de outros, ou seja, da Comunicação Social nacional, de forma basicamente gratuita. Na realidade isso só explica uma parte dos problemas existentes, não obstante o eventual abuso por parte das plataformas internacionais ser assunto importante que deve ser tratado a nível europeu e com o nosso contributo.

Os três vectores que explicam como se chegou aqui

As maiores responsabilidades pela frágil situação da Comunicação Social, e respectiva falta de dinâmica de mudança, radicam em três vectores que estarão mais sob o nosso controlo do que a pequenez do mercado ou a actuação das plataformas internacionais. Primeiro, os interesses e comportamento do poder político. Segundo, a falta de uma adequada regulação, que não deveria permitir que o mercado funcione em concorrência distorcida. Terceiro, a incapacidade demonstrada pelas próprias empresas do sector para se reestruturarem.

Comecemos pelo primeiro. O poder político, por norma, procura interferir na estrutura do sector e nas suas actividades informativas editoriais, muitas vezes de forma pouco transparente e em benefício próprio. Ora, existe uma promiscuidade bastante elevada entre o poder político e a Comunicação Social portuguesa, praticando-se muitas vezes um jornalismo de recados, que se nota em particular, mas não só, nos órgãos de comunicação mais antigos e que são considerados do sistema. A proximidade e intimidade entre certos jornalistas e governantes de topo é excessiva.

Aparentemente, o poder político prefere a existência de uma Comunicação Social mais dócil e frágil, assente num grupo reduzido de actores com muito peso e com quem possa dialogar discretamente, directa ou indirectamente. Essa situação facilita que o poder político, em certos momentos, possa “combinar as coisas”, influenciar e controlar, trocar favores, permanecendo ao mesmo tempo capaz de continuar a condicionar os maiores negócios do sector, como já aconteceu no passado ou em episódios mais recentes. A prazo, esta relação entre política e Comunicação Social é insustentável para o bem do sector.

Não nos podemos também esquecer que o poder político ainda tem um poder acrescido por, de uma forma substancial, controlar os activos que o Estado possui na Comunicação Social e que no seu todo envolvem um orçamento e um número de colaboradores que ultrapassam os números de qualquer grupo privado do sector. Estamos a falar de custos anuais da ordem dos 230 milhões de euros e cerca de 1600 colaboradores (grupo RTP), implicando estes um custo anual de cerca de cerca de 80 milhões de euros (R&C de 2018), essencialmente financiados pelos contribuintes. Ou seja, o Estado continua a ser o maior grupo da Comunicação Social portuguesa o que, a seu tempo, valerá a pena voltar a discutir se tal faz verdadeiramente sentido quando tudo se alterou, desde a significativa redução das receitas do sector aos ordenados dos seus profissionais passando pela emergência de formas alternativas de plataformas de comunicação.

O segundo vector principal que explica o estado do sector reside em não se ter criado uma estrutura de regulação (regulador e legislação) suficientemente independente e dinâmica. Verdade seja dita, o poder político também nunca nisso esteve muito interessado. A regulação deveria assumir-se sem componente partidária, mais contemporânea, não burocrática, focada no essencial, articulada com a estrutura de regulação da autoridade da concorrência. Deveria procurar estabelecer as condições para que a Comunicação Social possa desempenhar da melhor forma o seu papel, promovendo a inovação e um mercado aberto e competitivo, a renovação dos actores existentes e o surgimento de novos.

Mas pouco ou nada disto acontece. Ao invés, a regulação existente tende a proteger mais os incumbentes ou os que se revelam já, de certa forma, inviáveis. Ou seja, no mercado da Comunicação Social persistem distorções significativas à concorrência, que são pouco escrutinadas pela regulação.

Desde logo, seria necessário que os maiores actores do sector — que representam 75% do mercado dos 600 milhões de euros e que têm televisão — fossem sujeitos a um maior escrutínio. Naturalmente, não se trata da sua diabolização e o escrutínio de regulação deverá incindir sobre todos. Trata-se de assinalar que estes têm vantagens acrescidas derivadas da sua escala, da capacidade de atraírem mais fontes de notícias, de poderem recrutar e manter mais jornalistas de topo e mais colaborações externas, do seu poder negocial face a anunciantes e agências de meios, do seu “cross-selling” ao beneficiarem de elevadas sinergias na venda conjunta de publicidade e na autopromoção pelas múltiplas plataformas de que dispõem. E, finalmente, a sua grande capacidade de influência e relação próxima junto dos poderes instituídos.

O poder político ainda tem um poder acrescido por, de uma forma substancial, controlar os activos que o Estado possui na Comunicação Social e que no seu todo envolvem um orçamento e um número de colaboradores que ultrapassam os números de qualquer grupo privado do sector. Estamos a falar de custos anuais da ordem dos 230 milhões de euros e cerca de 1600 colaboradores (grupo RTP).

Esse maior escrutínio também deveria existir relativamente ao endividamento excessivo de alguns grupos e aos projectos de Comunicação Social que vão subsistindo com prejuízos sucessivos e elevados, ano após ano. Todas estas situações dificultam o surgimento de novos operadores ao afectarem logo à partida a sua viabilidade, e prejudicando uma desejável e maior concorrência no mercado.

O terceiro, e porventura o mais importante, vector que explica o estado actual da Comunicação Social assenta na responsabilidade dos grupos e empresas do próprio sector, que não foram, de uma forma geral, suficientemente capazes de antecipar desafios futuros e de criar as condições que, à partida, os permitiriam vencer. Resistiram a mudar estruturas accionistas ou de poder interno, não se renovaram nem se reestruturaram na medida do necessário, não investiram na tecnologia e em outras áreas como seria imperativo, não evoluíram na sua cultura interna (muitas vezes corporativa), não souberam criar de forma criativa melhores produtos para os clientes, que até poderiam ter provocado uma maior expansão do mercado, nem novos modelos de negócio minimamente sustentáveis. Ficaram, numa grande parte dos casos, estagnados no passado, resistindo à mudança, em vez de a abraçar.

Existem finalmente outros actores que, apesar de com menos impacto, não deixam de deter responsabilidades na situação actual. Nomeadamente bancos que, por interesses políticos próprios ou por pressões políticas externas, foram pouco exigentes na cobrança das dívidas das empresas do sector, não as pressionando para se reestruturarem. E também alguns dos grandes anunciantes (cerca de vinte e cinco representarão a maior parte do investimento publicitário em Portugal) porque muitas vezes não resistem em utilizar os seus investimentos publicitários como moeda de troca, para disporem de uma Comunicação Social mais amiga dos seus interesses ou para de certa forma promoverem os seus próprios dirigentes. Por isso, estes anunciantes preferem frequentemente estabelecer relações privilegiadas, próximas e de cumplicidade com os grandes grupos, algumas vezes (possivelmente) mesmo em concertação com o poder político.

Um caminho para a revitalização do sector

Teria sido natural, nestes últimos dez anos, que alguns grupos e empresas da Comunicação Social tivessem conseguido reestruturar-se, alienando ou não partes dos seus negócios, enquanto outras, desaparecendo, tivessem aberto espaço a muitos novos projectos, à inovação, à renovação e à revitalização do sector no seu todo. Tal não aconteceu porque assim não o permitiram os interesses conjugados e a incapacidade e falta de vontade já mencionados, de um conjunto de intervenientes no sector.

Para que a revitalização aconteça, espera-se por uma série de alterações estruturais. Primeiro, que os poderes instituídos, nomeadamente políticos mas também empresariais, dêem, “fiscalizados” pela Comunicação Social e pela sociedade civil, um melhor exemplo de cultura democrática e de transparência na relação que estabelecem com a Comunicação Social. Segundo, que se desenvolva uma acção de regulação focada no essencial, na criação de um ambiente de sã concorrência e de estímulo à inovação, assente em legislação/ regulamentação mais simples e contemporânea. Terceiro, que cada empresa ou grupo de Comunicação Social viável complete a sua reestruturação e a redefinição do seu negócio, fornecendo também melhores produtos para os seus públicos, ao mesmo tempo resistindo e evitando as pressões políticas e empresariais indesejáveis. Quarto, que os cidadãos valorizem a sua necessidade de informação e reconheçam que também é uma atitude de cidadania contribuírem, através da sua assinatura, para uma Comunicação Social livre e qualificada. Quinto que se repense e reajuste a dimensão e forma de intervenção directa do Estado na Comunicação Social.

No fundo, será muito importante para o país que o espírito e a prática do bom jornalismo, qualificado e independente, que ainda existe entre nós, venha finalmente a prevalecer e que um número apreciável de empresas do sector em verdadeira concorrência e protagonizando os melhores projectos, se venham a tornar fortes, saudáveis e auto-sustentáveis.

A pandemia de Covid-19 e o futuro

Pela actualidade e porque reflecte a situação que atrás referimos, não podíamos concluir este texto sem abordar, com algum detalhe, o tema do momento: o impacto da Covid-19 na Comunicação Social.

A crise sanitária existente e as medidas de fecho de actividades e de confinamento tomadas terão provocado, em Março e Abril, nos operadores de Comunicação Social, uma quebra abrupta de publicidade (incluindo eventos) de cerca de 40% face aos meses homólogos do ano anterior. As receitas de publicidade, como já referido, representarão cerca de 50% a 75% das receitas totais dos operadores, consoante os casos. As outras principais receitas são provenientes das prestações recebidas dos operadores de telecomunicações, do papel, das chamadas de valor acrescentado e das assinaturas. De facto, as assinaturas digitais subiram significativamente em Março e Abril, mas ainda têm um peso menor no cômputo geral.

A previsão é que, a partir de agora, entre Maio e Dezembro de 2020, face ao período homólogo do ano anterior, a quebra de publicidade venha a ser na ordem dos 25% a 30%. Em 2021, dependendo da recuperação da economia, o mercado da publicidade deverá evidenciar uma recuperação face a 2020 na ordem dos 10% a 15%, mas ainda sem regressar aos valores de 2018.

Veio, mais recentemente, o Governo apresentar uma medida específica para o sector: a compra de publicidade antecipada, no valor de 15 milhões de euros, por parte do Estado. Este modelo apresenta-se na fronteira de um subsídio. E seria também desnecessário se um programa de empréstimos como o referido tivesse sido adoptado.

Face a estas perspectivas sombrias, pareceria justificável que as empresas do sector fossem compensadas pela mencionada quebra abrupta das receitas, que ocorreu por força das medidas que o Governo teve de tomar para combater a pandemia. Em particular, porque o sector não podia nem devia suspender as suas actividades e proceder a lay-offs, antes tinha de cumprir em pleno um muito necessário serviço público de informação.

Mas não basta lançar um programa de apoio, seria essencial que qualquer programa específico para a Comunicação Social respeitasse princípios de justiça, de equidade e de proporcionalidade, dos quais se destacam três. Primeiro, que o programa não incluísse a atribuição de subsídios a fundo perdido à Comunicação Social. Segundo, que servisse apenas para apoiar a Comunicação Social face à quebra abrupta de receitas derivadas das medidas de resposta à pandemia, e nunca para resolver os problemas pré-existentes do sector ou para dar um balão de oxigénio a empresas já anteriormente insustentáveis. Terceiro, ser o mais neutro, simples e objectivo possível, não privilegiando uns face a outros, nem prejudicando a situação competitiva existente entre os operadores.

Assim, por exemplo, esperar-se-ia que o programa específico de apoio à Comunicação Social se baseasse num estímulo aos anunciantes para não reduzirem tanto a sua publicidade, dando-lhes uma majoração fiscal. Ou, principalmente, num programa de empréstimos a médio e longo prazo com carência nos primeiros anos, que permitiria às empresas viáveis sobreviverem.

Preferencialmente, esse programa de empréstimos deveria ter como referência para cálculo do valor a atribuir a cada empresa do sector (elegível se com situação líquida positiva), o número de colaboradores existente no final de Fevereiro de 2020 (antes do início da crise), multiplicado por um dado valor per capita (por exemplo, 25 mil euros), com um limite absoluto por beneficiário máximo. Mas, claro, ressalvando a condição importante de que o número de colaboradores a indicar pelas empresas correspondesse ao número de colaboradores que a empresa planeava manter no futuro. Caso esse número viesse a ser reduzido, a empresa teria, de imediato, de liquidar a parte proporcional desse empréstimo.

De início e durante bastante tempo, o Governo nada decidiu sobre esta matéria. Só mais tarde veio a incluir o sector da Comunicação Social como também elegível para o programa geral de empréstimos, já estabelecido para outros sectores. Do mal, o menos. Apesar de o programa geral de empréstimos não se adaptar bem à Comunicação Social, por várias razões: devido ao relativamente reduzido valor passível de ser atribuído a cada empresa face às suas necessidades, porque não está relacionado com o número de trabalhadores e a sua permanência, e porque exige requisitos que restringem a sua aplicação no sector.

Ao mesmo tempo, o Governo permitiu que as empresas de Comunicação Social recorressem ao lay-off e à moratória de empréstimos. No que respeita ao lay-off, trata-se na maior parte dos casos de uma escapatória que prejudica o cumprimento do dever de informar num tempo de pandemia, sendo que qualquer empresa de Comunicação Social focada na informação, bem dimensionada e minimamente viável precisará sempre de todos os seus colaboradores para prestar um bom serviço público — o lay-off será particularmente útil para os grupos que já trazem do passado colaboradores a mais ou estruturas desequilibradas. Da mesma forma, a moratória de empréstimos só será necessária em escala significativa para quem já registava um endividamento excessivo. Aliás, um programa específico de empréstimos, nos moldes acima referidos como desejáveis, tornaria desnecessária qualquer moratória, pois o empréstimo assim obtido ajudaria a ultrapassar qualquer eventual necessidade de reforço de tesouraria em resultado da crise, não beneficiando fraquezas passadas em prejuízo de quem se capitalizou.

Veio, mais recentemente, o Governo apresentar uma medida específica para o sector: a compra de publicidade antecipada, no valor de 15 milhões de euros, por parte do Estado.

Este modelo apresenta-se na fronteira de um subsídio. E seria também desnecessário se um programa de empréstimos como o referido tivesse sido adoptado. Mas o que é mais difícil de aceitar são os critérios que, tudo indica, o Governo irá adoptar para atribuição e alocação a cada um do referido valor de 15 milhões de euros.

Segundo informação presente na Comunicação Social, esses critérios serão o valor das receitas de publicidade facturado por cada grupo ou empresa no segundo trimestre de 2019, a que acrescem as receitas de venda de publicações em banca (esta parte terá sido incluída mais tarde, em resultado de pressões nesse sentido). Estes critérios, se finalmente adoptados, irão privilegiar da mesma forma quem faça informação ou entretenimento, quando a primeira, como serviço público, mereceria ter mais peso. Os critérios também não têm em consideração a dinâmica de crescimento, ou não, das empresas entre 2019 e 2020. Esta falha poderia ser ultrapassada se fosse aplicado ao valor das receitas do segundo trimestre de 2019 um factor de evolução das receitas entre 2019 e 2020, obtido pelo quociente das receitas geradas em Janeiro e Fevereiro de 2020, face às geradas no período homólogo em 2019. Por fim, estes critérios dão um peso injustificável ao papel, um mercado claramente em decréscimo devido a factores independentes da actual crise sanitária.

O resultado deste programa dos 15 milhões de euros, com estes critérios, irá beneficiar em particular os grandes grupos com TV e rádio, e os que mantêm ainda expressão significativa no papel. Em contrapartida, serão relativamente prejudicados todos quantos investiram e estão a crescer, nomeadamente os que lançaram nos últimos anos novos projectos.

No meio deste contexto, nem tudo foi negativo e esta crise sanitária trouxe também aspectos positivos para a Comunicação Social. Desde logo, explicitou ainda mais a situação de crise existente no sector e em particular em algumas empresas já em dificuldades, evidenciando de forma clara a necessidade da mudança. Mais do que isso, foi uma demonstração do mérito e valor criado por muitos jornalistas e equipas onde se inserem, que deram o melhor de si e prestaram um inigualável serviço público.

António Carrapatoso: empreendedor, Presidente do Conselho de Administração Executivo e fundador do Observador

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