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Winter Sets In As Kyiv Residents Prepare For Further Russian Attacks
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Os primeiros ataques russos incidiram sobre edifícios residenciais, hospitais e escolas. Depois, visaram estruturas críticas para a produção e distribuição de energia, água e aquecimento na Ucrânia

Getty Images

Os primeiros ataques russos incidiram sobre edifícios residenciais, hospitais e escolas. Depois, visaram estruturas críticas para a produção e distribuição de energia, água e aquecimento na Ucrânia

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Cozinhar com velas, usar gelo na casa de banho. Como lidam os ucranianos com o frio durante os apagões?

Gelo das varandas é descongelado para usar na retrete. Vasos de barro e uma vela aquecem uma divisão. Tendas servem para minimizar o desconforto do frio. Antigo ministro conta como é viver em Kiev.

Tymofiy Mylovanov não sabe o que se passa em Odessa. Está em Kiev. Na capital ucraniana, a 7 de dezembro, as temperaturas negativas variam entre os -1ºC e os -5ºC graus. A preocupação do atual presidente da Escola de Economia de Kiev é genuína e, durante a conversa por zoom com o Observador — muitas vezes sem imagem porque a energia é insuficiente para manter áudio e vídeo —, interrompe o diálogo para ir ver como está o tempo na cidade costeira a 500 quilómetros de distância. A imagem não regressa, o som sim, e sente-se o alívio na sua voz. “As temperaturas são positivas, estão à volta do zero, portanto eles estão bem.”

Tymofiy Mylovanov foi ministro da Economia da Ucrânia entre 2019 e 2020 (quando Oleksiy Honcharuk era primeiro-ministro). Não aceitou os cargos que lhe foram oferecidos no mandato de Denys Shmyhal, atual primeiro-ministro, e regressou aos Estados Unidos, onde é professor associado da Universidade de Pittsburgh. Quatro dias antes da guerra, regressou a Kiev. Agora, no meio dos apagões e das falhas de energia, vive como qualquer outro habitante de Kiev que tem de aprender a lidar com temperaturas desconfortáveis dentro de casa, a ter a torneira da água seca ou a ter de inventar formas criativas para cozinhar.

A sua preocupação com Odessa tem a ver com as temperaturas negativas e com o prejuízo que isso pode trazer à cidade se os canos congelarem por falta de aquecimento. No mais recente ataque de mísseis, Odessa ficou sem energia. “Eles estão bem, mas se as temperaturas descerem a valores negativos, por exemplo a -4ºC, terão de descarregar a água dos canos. Se não o fizerem, a água torna-se gelo, os canos ficam destruídos, e as casas não serão habitáveis, a cidade inteira não será habitável durante vários anos.”

Snow in Kyiv Daily Life In Ukraine, Nearly 9 Months Since Russian Invasion

Kiev depois de um nevão

Future Publishing via Getty Imag

Na capital da Ucrânia ainda não tinha havido temperaturas negativas. “A primeira vez foi esta [a última] segunda-feira. Foi a primeira vez que tentaram atacar durante temperaturas negativas, estavam cerca de -7ºC em Kiev. No entanto, todos os mísseis apontados à cidade foram intercetados, mas Odessa ficou sem luz”, conta Mylovanov.

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A situação repete-se em vários pontos da Ucrânia. “A Rússia ataca todas as principais cidades, todos os grandes centros. No princípio atacavam apenas a eletricidade, mas agora têm como alvo também a água e o aquecimento, e o tipo de infraestruturas de eletricidade que são fundamentais para o aquecimento e a água”, explica o economista, que além de aquecer a sua casa também tem de pensar como manter a Escola do Economia em condições para os alunos que continuam a frequentar as aulas. No dia em que o entrevistámos, faziam exame intercalar de matemática.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre a forma como os ucranianos estão a derrotar o frio imposto por Putim.

Vladimir Putin quer congelar os ucranianos?

“Falta de água significa higiene, água para beber e casas de banho. Fica nojento e desagradável muito, muito depressa. Com aquecimento significa que se pode descongelar os canos”, esclarece Tymofiy Mylovanov. Caso contrário, o efeito é semelhante ao de deixar uma garrafa de cerveja esquecida no congelador. Quando o líquido congela, aumenta de volume e parte o vidro. O processo é o mesmo só que o que fica destruído são os canos que levam água às torneiras de casa e os que levam os dejetos para as estações de tratamento de águas residuais.

Em sua casa, Mylovanov chegou a optar por usar o gelo que se acumulava na varanda. Depois de descongelado, era usado para as descargas na casa de banho. Agora, ele e os restantes moradores já se habituaram à ideia de ter de acumular água quando ela corre nos canos para evitar surpresas desagradáveis quando falha.

Press confrence of speakers of Ukraine 30. Economy Without Oligarchs Forum in Kyiv

Tymofiy Mylovanov, antigo ministro da Economia, vive em Kiev e é presidente da Escola de Economia da capital ucraniana

Future Publishing via Getty Imag

Fritar ovos com velas? É possível e faz-se em Kiev

As falhas de energia em Kiev têm vários problemas associados. Um deles é a capacidade de cozinhar. “A minha sogra tem uma lata muito pequena, uma lata de cozinhar, põe-na no fogão, com três velas por baixo. E as três velas são suficientes para cozinhar e fritar ovos ou outras coisas. E consegue ter comida quente”, conta ao Observador Mylovanov, que dois dias antes tinha visitado a mãe da sua mulher.

Muito do que viu acabou publicado no Twitter onde mantém um diário de como é o dia a dia em Kiev durante a guerra. O próprio diz fazer questão de alimentar aquelas publicações para que haja registo do que se passa na cidade. A sogra aproveita, por exemplo, a varanda onde as temperaturas rondam os 0ºC para conservar comida quando não há energia para usar o frigorífico.

Quando consegue aquecer água — na maioria dos apartamentos em Kiev, os fornos e as placas são elétricas — fá-lo em grande quantidade. Depois, guarda o líquido em termos e fica com água quente para poder beber chá e tomar um pequeno-almoço quente durante várias manhãs.

Quando cozinha, a regra é a mesma. Aproveitar a energia ao máximo para quando as luzes falharem. Um dos truques da sogra de Mylovanov é guardar repolho em água salgada: a fermentação acontece e o repolho transforma-se numa versão ucraniana de chucrute que dura quase uma vida inteira.

A woman and a child look at the left-bank districts of Kyiv Winter Sets In As Kyiv Residents Prepare For Further Russian Attacks

Os ataques da Rússia às infraestruturas ucranianas têm deixado a capital sem energia em muitos períodos da guerra

SOPA Images/LightRocket via Gett

"A minha sogra tem uma lata muito pequena, uma lata de cozinhar, e ela põe-na no fogão, e tem três velas por baixo. E três velas são suficientes para cozinhar ovos ou outras coisas. E consegues ter comida quente."
Tymofiy Mylovanov

Uma bateria, um bule elétrico e um fogão de madeira

Em casa de Tymofiy Mylovanov, um prédio de Kiev onde metade dos inquilinos conduz Mercedes e BMW, a solução encontrada foi outra. “Comprámos uma bateria, uma grande bateria, a que podemos ligar um bule de chá elétrico. Também estou a pensar em comprar um pequeno fogão a gás, como os de campismo, não são caros, custam uns 50 dólares, e já temos um pequeno fogão de madeira. É muito, muito pequeno, comprámos algum carvão, não gasta muito, e conseguimos cozinhar nele.”

O bule elétrico faz as vezes da cafeteira turca, do tempo da União Soviética, que a sogra usa para aquecer água. O final é o mesmo, ter água quente armazenada para poder beber chá e tomar pequenos-almoços minimalistas, mas quentes, como panquecas e papas de aveia.

Faltam-nos algumas coisas”, conta o antigo ministro, falando desta nova forma de viver. “Falta-nos, por exemplo, uma boa frigideira para cozinhar e o fogão a gás, mas estamos bem com esta bateria que gera energia durante o tempo suficiente para cozinharmos. Temos o suficiente na bateria para fazermos umas quantas refeições e vários bules de chá”, relata ao Observador.

Outro problema nos edifícios, quando há apagões, é ficar completamente escuro. E é preciso subir escadas, muitas escadas. No dia em que visitou a sogra, que mora num sétimo andar, Tymofiy Mylovanov deparou-se com um engenho que o deixou espantado. Os vizinhos instalaram luzes nos corredores para lidar com os apagões: um pequeno diodo (dispositivo semicondutor) alimentado por pilhas, suficiente para garantir que ninguém tropeça e com capacidade para se manter iluminado durante mais de um ano.

Snowfall in Kyiv Snowfall in Kyiv

A Praça Kontraktova é um dos pontos de passagem dos moradores de Kiev, mesmo quando as temperaturas descem a valores negativos

Anadolu Agency via Getty Images

"Comprámos uma bateria, uma grande bateria, a que podemos ligar um bule de chá elétrico. Também estou a pensar em comprar um pequeno fogão a gás, como os de campismos, não são caros, custam uns 50 dólares, e já temos um pequeno fogão de madeira. É muito, muito pequeno, comprámos algum carvão, não gasta muito, e conseguimos cozinhar nele." 
Tymofiy Mylovanov

Cobertor elétrico, uma tenda e banha de animais

Ao princípio custa, mas depois torna-se hábito. Tymofiy Mylovanov mantém um espírito tão otimista quanto possível: “É desagradável. Ajustar a rotina é desagradável, mas uma vez que te tenhas ajustado é OK.”

Dentro de casa, com o inverno a mergulhar o país em temperaturas geladas, os primeiros dias foram complicados. “A falta de eletricidade não é o maior problema per se. A falta de água é um problema: precisamos de bebê-la e precisamos dela para as casas de banho. Mas, agora, depois daquele ataque de há duas semanas, toda a gente começou a acumular muita quantidade de água, por isso vamos ficar bem… A não ser que eles atinjam os esgotos e aí não podemos fazer descargas. Aí, a cidade torna-se inabitável.”

“Eles” é sinónimo de russos, palavra que Tymofiy Mylovanov quase não usa.

Esse é um dos piores cenários possíveis que se tornaria muito rapidamente em catástrofe humanitária. “Se os esgotos não estiverem a funcionar, e não pudermos fazer descargas… mas não estamos aí, ainda. E penso que não terão tempo suficiente para isso antes de o inverno chegar ao fim. Não é assim tão fácil de conseguir fazê-lo.” São precisos muitos ataques sistemáticos que a Rússia, na opinião do economista, simplesmente não conseguirá fazer.

Se a água é a falha mais difícil de resolver, a falta de energia também causa muitos problemas. “A eletricidade é importante para qualquer tipo de aquecimento. Todos precisam de alguma eletricidade, e, a não ser que tenhas geradores, os apartamentos ficam muito, muito frios. No primeiro, no segundo dia, os apartamentos mantêm as temperaturas porque as paredes estão quentes — a maioria dos nossos apartamentos são de tijolo e cimento. Se estiverem a 19 ou 20ºC, conta Mylovanov, a temperatura cai um ou dois graus ao longo de várias horas.

“De manhã, os apartamentos estão a 15º ou a 16ºC o que é OK. Ficam assim durante um bocado, mas depois a temperatura começa a cair para 13ºC e aí começa a ficar desconfortável. Eventualmente, ao segundo ou terceiro dia, fica mesmo muito desconfortável.” No apartamento onde vive com a mulher, ainda não precisou de montar uma tenda, embora essa hipótese possa vir a ser usada.

“Comprámos um cobertor elétrico, não requer muita energia, são 60 volts, como uma lâmpada das antigas. Podemos usá-lo para sempre. E só precisamos de o carregar durante uma hora ou duas para conseguirmos dormir e depois ele mantém o calor durante várias horas. O nosso plano B também inclui sacos cama, mas essencialmente é com a bateria que aquecemos o cobertor elétrico e que pomos a água a ferver. Vamos ficar bem”, diz com segurança na voz.

No Twitter, quando começaram os relatos de Tymofiy Mylovanov sobre como lidar com o frio, não faltaram sugestões. Montar uma tenda dentro da sala era uma das mais frequentes ou ter uma vela acessa sob um vaso de barro virado ao contrário — o suficiente para manter uma divisão quente ao longo do dia. Melhor do que a vela tradicional é substituir a cera por gordura animal e um pavio, o que garante que o fogo dura muito mais tempo.

Levar animais para casa (não faltam cães e gatos sem donos na rua) é outra sugestão dos seus seguidores, já que também eles estão a congelar nas ruas da capital.

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Fila para receber sopa, distribuída pelas autoridades. Um dos centros de aquecimento de Kiev para manter os cidadãos quentes

Getty Images

"Falta de eletricidade não é o maior problema per se. Água é um problema: bebemos água e precisamos dela para as casas de banho. Mas agora, depois daquele ataque de há duas semanas, toda a gente começou a acumular muita quantidade de água, por isso vamos ficar bem. A não ser que eles atinjam os esgotos e aí não podemos fazer descargas. Aí a cidade torna-se inabitável. "
Tymofiy Mylovanov

Centros de aquecimento e a vida na Escola de Economia

Além das soluções individuais, as autoridades da região também procuram minimizar os problemas do frio. “O primeiro foco das autoridades de Kiev foi arranjar equipamento independente que gere energia, como geradores, para as infraestruturas críticas. Em segundo lugar estão a criar os centros de aquecimento onde as pessoas podem ficar e manter-se quentes”, conta Mylovanov.

São os centros de invencibilidade, como lhes chamou o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, quando anunciou, no final de novembro, que iria ser criada uma rede com 4 mil postos ao longo do país. “Centros de invencibilidade especiais serão criados na Ucrânia para fornecer eletricidade, aquecimento, água, Internet, ligações de telemóvel e uma farmácia, gratuitamente e 24 horas por dia.”

Já na escola a que Mylovanov preside, a vida é o mais normal possível, mas os donativos continuam a ser importantes. “O edifício está aquecido, toda a gente vem para aqui e temos um gerador independente. Nem sempre é conveniente porque temos de ir para os abrigos. Mas há aulas, há seis salas sempre a funcionar, as que são consideradas críticas. Antes da guerra, eram 12. Os miúdos estão a estudar. Neste momento, estão a fazer um exame de matemática.” Um teste que é feito depois de nove meses de guerra e dois anos de pandemia. Apesar disso, a percentagem de alunos que aparece nas aulas em pessoa (são híbridas) ronda os 70%, quando noutras faculdades do país o valor fica pelos 10%.

“É o novo normal. Os miúdos ajustam-se mais facilmente do que os adultos. Para a Educação, a pandemia foi mais difícil do que a guerra. Na guerra, todos se querem abraçar, estar juntos, vêm para as escolas, a nossa assiduidade é alta. Na pandemia, as pessoas tinham medo umas das outras. É diferente”, esclarece o economista. “Aqui temos medo dos russos, da morte, dos mísseis, mas não temos medo uns dos outros. Amamo-nos. Estamos desejosos de estar juntos, de nos apoiarmos. É muito diferente”, diz Mylovanov, que se sente “muito bem” com pessoas à sua volta. “É uma energia positiva, com toda a gente a sorrir. Estamos a apoiar-nos. O sentimento é muito diferente do da pandemia.”

Quanto aos donativos, todos os dias recorda no Twitter que a universidade precisa deles. “Se as pessoas puderem, devem doar. Mesmo que sejam só 5 euros, 5 dólares, isso importa. Muitos 5 euros, todos juntos, tornam-se muito. E é assim que vocês se tornam parte de nós. Cada pessoa que contribui com 5 euros faz parte do quente nas nossas casas, porque temos de pagar pela energia”, argumenta o professor.

Quem fizer um donativo nesse valor, sabe exatamente em que é que está a ajudar: “Podemos fazer o cálculo: 5 euros paga 1 galão de combustível, que são cerca de 3 litros. Três litros chegam para aquecer durante uma hora os primeiros andares da universidade. Ou seja, 5 euros significa uma ou duas horas de aquecimento para os estudantes da Escola de Economia em Kiev durante um ataque ou um apagão. E isto é significativo.”

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Marcas da guerra em Bucha. Um homem vê de perto o estado em que ficaram tanques russos naquela localidade dos arredores de Kiev

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Mais dez ataques e depois chega a Primavera

Com a guerra e a vida em Kiev, Tymofiy Mylovanov aprendeu coisas que não se ensinam nas aulas de Economia. “O que aprendi com estes ajustamentos que tivemos de fazer — é claro que há níveis de frio que simplesmente não conseguimos tolerar — é que, em princípio, conseguimos viver. Muitos humanos viveram assim, ao longo da história da humanidade.”

“A solução pode ser construir um abrigo e ter uma fogueira de lenha dentro dele, mas o mais importante, acredita, é ser capaz de fazer ajustamentos. “Temos de nos habituar e erguer-nos, as pessoas têm de conseguir dar a volta psicologicamente. Ajustar a rotina é desagradável. Se não tens fogo, se não tens lenha, se não tens equipamento para montar um sítio para viver não é divertido.”

Ajuda planear com avanço, mesmo para situações mais extremas, aquelas que acredita que o país não vai ter de enfrentar. Em Kiev, já vê um padrão nos ataques, como, por exemplo, os russos atacarem todas as segundas-feiras. “Penso que não vamos chegar a situações extremas porque a Rússia tem estado a atacar-nos desde outubro e não conseguiram chegar lá. Estamos no início de dezembro, eles falharam desta vez. Eles fazem três ataques sérios por mês, por isso, vamos ter mais dez ataques até à Primavera. Vão conseguir estragar alguma coisa, mas não cidades inteiras. Não têm tempo suficiente.”

Acima de tudo, o antigo ministro, e conselheiro da administração de Zelensky, acredita que o objetivo da Rússia — “aterrorizar as populações” através dos ataques às cidades — não resulta. “Eles fazem presunções porque a sua própria população é submissa e tem medo deles, mas isso não serve para toda a gente. Na verdade, não serve para a maioria do mundo. E, em determinado momento, também vai quebrar na Rússia. A Rússia tem períodos de mudança na sua liderança e muitas vezes é brutal.”

Tymofiy Mylovanov diz mesmo que “a Rússia está num sítio negro, e a sua liderança está num sítio muito negro, e todos eles acabarão mal neste mundo”. A sua pergunta é: quando? “Porque eles estão a aterrorizar o seu próprio povo, a mobilizá-los e a mandá-los para a chacina e perseguem toda a gente que tenha algo a dizer sobre qualquer coisa. Transformaram-se numa máquina de terror. Não acredito que vá resultar.”

Muito diferente seria se fosse uma guerra como as do passado. “Se eles estivessem aqui, a matar-nos, como fizeram há um século, provavelmente seria diferente. Mas eles não têm capacidade para ter militares no terreno e virem aqui matar-nos. Podem bombardear-nos, mas… Os londrinos viveram isto, não ajudou Dresden a render-se, no Vietname não resultou, as pessoas viviam em caves. Podemos acabar a viver em caves, mas não vai funcionar. Teriam de vir aqui e matar-nos, mas isso não vai acontecer.”

Tymofiy Mylovanov é agora um homem diferente. Não se tornou imune — não perdeu a sensibilidade —, mas não se choca com tudo aquilo que o fazia indignar-se no início da guerra. “O foco muda. As minhas emoções são mais cruas, mas também mais honestas. Mas também me foco em coisas que realmente interessam. Vejo uma maternidade que foi destruída por um tanque e penso: e então? Mas vejo uma pessoa ou um cão com frio na rua e o meu coração parte-se e tento ajudar.”

Há um ano, diz o economista, pensaria que a maternidade bombardeada era um problema, pela simbologia. “Agora sei que não está ninguém lá dentro e ninguém ficou ferido. Ao invés disso, há um pequeno cão na rua que está a congelar.”

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Artista Banksy passou pela Ucrânia e deixou as suas ilustrações urbanas em prédios destruídos pelas bombas

Getty Images

"As minhas emoções são mais cruas, mas também mais honestas. Mas também me foco em coisas que realmente interessam. Vejo uma maternidade que foi destruída por um tanque e penso: E então? Mas vejo uma pessoa ou um cão com frio na rua e o meu coração parte-se e tento ajudar. Há um ano, pensaria que a maternidade bombardeada era um problema, são símbolos, mas agora, sei que não está ninguém lá dentro e ninguém ficou ferido. Ao invés disso, há um pequeno cão na rua que está a congelar. "
Tymofiy Mylovanov

O que o preocupa são as trevas que vê crescer. A sociedade na Rússia, defende, permitiu que o lado negro que existe em todos os seres humanos se desenvolvesse e consumisse a sua sociedade. “Não é apenas o Kremlin que dá ordens. Há 40, 50 milhões de pessoas sinceramente satisfeitas”, entende Mylovanov.

Essa maldade, defende, é uma ameaça existencial à Humanidade maior do que as alterações climáticas. “Vimos isso com os nazis e, de certa forma, permitimos que crescesse na Rússia. Claro que se trata de uma responsabilidade coletiva e precisam de ter um longo período para corrigir isso, mas o mundo devia estar muito mais alerta. Estas coisas podem matar-nos e estão literalmente a matar-nos e a matar pessoas neste momento.”

Olhando para dentro, sente-se uma pessoa melhor e acredita que a Ucrânia vai ultrapassar toda a situação atual. “Está frio. E então? Estamos bem. Não é o inverno mais excitante, mas os humanos viveram nestas condições.”

Sobre si próprio, Tymofiy Mylovanov diz achar está a ficar uma pessoa mais bondosa. “Agora consigo compreender melhor as velhotas ucranianas que toda a vida alimentaram os cães e os animais. Agora quero alimentar todos os animais. Eles estão traumatizados. Vamos conseguir ultrapassar isto. Não há promessas de que vá ser divertido, mas vamos ultrapassar. Vamos ajudar-nos uns aos outros e o mundo vai ajudar-nos.”

 
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