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Giorgia Meloni And Dario Allevi Attend A Rally For The Elections In Monza
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Em setembro de 2020, Giorgia Meloni foi eleita presidente do Partido dos Conservadores e Reformistas Europeus. Agora pode ser eleita primeira-ministra de Itália

NurPhoto via Getty Images

Em setembro de 2020, Giorgia Meloni foi eleita presidente do Partido dos Conservadores e Reformistas Europeus. Agora pode ser eleita primeira-ministra de Itália

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Nacionalista confessa, fã de Tolkien e amiga de Órban — mas não fascista. Giorgia Meloni pode ser a nova primeira-ministra italiana

Líder do Irmãos de Itália pode ser próxima PM do país. Da infância sem pai à juventude com a "bíblia" Senhor dos Anéis, esteve sempre na extrema-direita. Tem em Órban um amigo. Garante: não é fascista

Quando, em 1992, com apenas 15 anos, Giorgia Meloni se filiou na Fronte della Gioventù, a Frente Juvenil do Movimento Social Italiano (MSI), fundado em 1946 por oficiais de Mussolini e até hoje considerado um dos maiores movimentos neofascistas da Europa Ocidental, o partido já não organizava Acampamentos Hobbit para os jovens, abrilhantados por atuações da banda La Compagnia dell’Anello, a Irmandade do Anel.

O que não significa que a líder do Fratelli d’Italia, Irmãos de Itália, o partido de extrema-direita que ela própria ajudou a fundar em 2012, na esteira do MSI, não tenha herdado a devoção à saga “O Senhor dos Anéis”, comum ao pós-fascismo italiano pelo menos desde meados da década de 70 do século passado — altura em que se popularizaram as críticas dos progressistas, que rotularam a obra como “um conto de fadas escapista e reacionário”, e a fantasia de J. R. R. Tolkien foi adotada pelos neofascistas, ávidos de novos símbolos e heróis, explicou recentemente na revista Spectator Nicholas Burgess Farrell, jornalista e autor de “Mussolini: A New Life”.

“Nos anos 70, a direita italiana procurava símbolos, uma mitologia para a ajudar a combater a esquerda que fosse uma alternativa ao Império Romano, que estava demasiado associado ao fascismo”, contextualizou ao britânico Times Lucio Del Corso, professor da Universidade de Cassino e coautor de um livro sobre o assunto. “Podemos encontrar heroísmo e luta contra o mal em todo o lado. O que era diferente no Senhor dos Anéis era que a esquerda não tinha reivindicado o livro em Itália, pelo que a direita era livre de tomar posse dele e de o interpretar da forma que quisesse.”

Durante a adolescência no partido, a mulher que agora lidera as sondagens em Itália e é apontada como a mais que provável próxima primeira-ministra do país — e a primeira mulher no cargo — vestiu-se a rigor e fez representações públicas para crianças da obra do escritor britânico, juntamente com outros ativistas, em Roma.

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"Nos anos 70, a direita italiana procurava símbolos, uma mitologia para a ajudar a combater a esquerda que fosse uma alternativa ao Império Romano, que estava demasiado associado ao fascismo. Podemos encontrar heroísmo e luta contra o mal em todo o lado. O que era diferente no Senhor dos Anéis era que a esquerda não tinha reivindicado o livro em Itália, pelo que a direita era livre de tomar posse dele e de o interpretar da forma que quisesse"
Lucio Del Corso, professor da Universidade de Cassino

“A nossa bíblia era o Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien”, contou numa entrevista, em 2002, Meloni, que a cada 3 de janeiro faz questão de assinalar o nascimento do autor nas redes sociais. ‘Ele criou tantos de nós com as suas histórias, tão ricas em valores e significados, que nos ensinaram a acreditar e a sonhar. Obrigado por tudo”, escreveu no Facebook este ano, numa publicação que obteve mais de 6,4 mil likes.

Na autobiografia que publicou em maio de 2021, justamente na altura em que o Irmãos de Itália começou a disparar nas sondagens, Giorgia Meloni, hoje com 45 anos, também se deteve no tema, e contou que o seu personagem favorito não é o herói Frodo Baggins mas o seu sidekick Samwise Gamgee.

“No DNA do Irmãos de Itália não há nostalgia fascista, racista e anti-semita. Não há lugar para nada disso"
Giorgia Meloni, líder do Irmãos de Itália

“Ele era apenas um hobbit, um jardineiro, mas sem ele Frodo nunca teria cumprido a sua missão. Como escreveu Tolkien, são as pequenas mãos que mudam o mundo”, escreveu por seu turno Meloni, que em entrevistas tem feito questão de garantir que a admiração que nutre pelas histórias da Terra Média não têm nada a ver com a apologia do fascismo — que, aliás, é proibida no país desde 1952.

“No DNA do Irmãos de Itália não há nostalgia fascista, racista e anti-semita. Não há lugar para nada disso”, assegura Meloni. Mas a verdade é que têm sido vários os casos tornados públicos nos últimos meses a relacionar os seus militantes e até dirigentes com grupos extremistas e violentos de extrema-direita e os escândalos a envolver elegias a nazis e até jantares comemorativos da Marcha sobre Roma, que a 28 de outubro de 1922 deu início ao regime fascista no país.

Fascismo ou política à italiana?

Num artigo publicado no final de julho no European Conservative — “Giorgia Meloni: extrema-direita ou apenas direita?” —, o italiano Mario Laghos tentou traduzir, para um público anglo-saxónico, a ideologia de Giorgia Meloni, euro-cética nacionalista que despreza o politicamente correto e defende sempre: “A Itália e os italianos em primeiro lugar.”

Sim, explicou o analista político, a líder do Irmãos de Itália é uma “conservadora profundamente cristã”, com “uma tendência para a retórica ardente”, cuja “missão é defender a identidade, a espiritualidade e a família”.

Members Of The Fratelli d'Italia Political Party Hold A Flash Mob Protest Against The Government

Durante a pandemia, Meloni exigiu ao governo que desse mil euros a cada italiano que o solicitasse

Getty Images

E, sim, se for eleita primeira-ministra, Giorgia Meloni vai tentar “proibir a adoção gay”, “usar a marinha italiana para bloquear a costa norte-africana”, “revitalizar os índices de natalidade italianos para diminuir a procura de mão-de-obra migrante” e defender “a herança italiana contra aquilo a que chama os bárbaros do Black Lives Matter que querem derrubar as estátuas de Cristóvão Colombo”.

Mas isso não significa, defende Mario Laghos, que possa ser considerada “fascista” ou “herdeira de Mussolini”, como os jornais britânicos (e não só) a têm apodado.

“Ao falar para uma plateia, em Espanha, Meloni disse que ‘uma enorme quantidade de sangue espanhol e italiano corre nas veias’ dos sul-americanos — o tipo de sentimento que pode fazer com que o jornalista médio do Daily Mail se mexa nervosamente na cadeira. Mas é assim que os italianos são — a minha mãe sempre me disse que tinha orgulho no seu sangue italiano, e eu nunca pensei que ela fosse a reencarnação do Duce”
Mario Laghos, analista político

“Ela não é uma reacionária, as suas posições são robustas e consideradas. Descreve a unidade familiar como ‘essencial para a procriação, a educação e a criação dos nossos filhos, o elemento central do afeto e da solidariedade entre gerações, o primeiro lugar de pertença’”, começa por explicar o analista político, para depois, através do exemplo da própria mãe, explicar as diferenças essenciais entre a fleuma britânica e o sangue quente dos italianos.

“Ao falar para uma plateia, em Espanha, Meloni disse que ‘uma enorme quantidade de sangue espanhol e italiano corre nas veias’ dos sul-americanos — o tipo de sentimento que pode fazer com que o jornalista médio do Daily Mail se mexa nervosamente na cadeira. Mas é assim que os italianos são — a minha mãe sempre me disse que tinha orgulho no seu sangue italiano, e eu nunca pensei que ela fosse a reencarnação do Duce.”

Mil euros para cada italiano e a amizade “suavizada” com Órban

A verdade é que, se nas eleições de 2018 os Irmãos de Itália não foram além dos 4% de votos, agora — quatro anos, várias crises políticas e uma pandemia depois —, as sondagens dão ao partido de extrema-direita mais 20%. O que só poderá significar que uma grande fatia dos italianos se revê no discurso de Meloni, líder do partido desde 2014.

Por muito que possa ter conquistado terreno graças à forma como geriu a oposição durante a pandemia — chegou a escrever uma carta ao então primeiro-ministro, Giuseppe Conte, a exigir que o governo creditasse mil euros de forma imediata e sem fazer perguntas na conta de todos os cidadãos que manifestassem essa necessidade, e quando, no ano passado, Mario Draghi a convidou para fazer parte do novo governo de unidade nacional recusou de imediato —, o facto de Meloni ter posto em marcha uma espécie de operação de “suavização” do Irmãos de Itália também não será alheio à cada vez maior popularidade do partido.

Como disse à France 24 Sofia Ventura, professora de ciência política na Universidade de Bolonha, “em termos gerais, Meloni representa um ponto de referência para protesto, desinteresse” — mas há mais.

“Para nós, o primeiro-ministro húngaro é um modelo que, dando o exemplo, mostra como permanecer orgulhosamente no palco europeu enquanto defende a soberania e a identidade cristã da sua nação, e também defende as fronteiras do seu país da imigração em massa e a economia real do financiamento especulativo”
Giorgia Meloni, líder do Irmãos de Itália

Nesta altura de campanha eleitoral, revelou a imprensa, por ordem da própria líder do Irmãos de Itália, estão interditas as “declarações mais extremas”, as menções à “ideologia fascista” e as “saudações romanas”, de braço estendido e palma da mão virada para baixo, como as que um grupo de militantes do partido foi fotografado a fazer em Nápoles, há menos de um ano, num evento à margem das comemorações do aniversário da fundação do neofascista Movimento Social Italiano.

O próprio discurso de Meloni, sempre tão loquaz, também está mais moderado. Basta ver como no final de julho, em entrevista ao português Nascer do Sol, se referiu ao primeiro-ministro húngaro, líder do partido de extrema-direita Fidesz: “Orbán é atacado há anos pela Comissão Europeia e pela esquerda de forma instrumental, compartilhamos ideias em algumas questões, mas estamos distantes noutras. É por isso que o Fidesz não faz parte do ECR [o Grupo dos Conservadores e Reformistas Europeus, a que Giorgia Meloni preside desde setembro de 2020]”.

Giorgia Meloni greets the Hungarian Prime Minister Viktor

A amizade com Viktor Órban é antiga. “Para nós, o primeiro-ministro húngaro é um modelo", disse Meloni em 2019

SOPA Images/LightRocket via Gett

Em 2019, depois de Viktor Órban ter discursado em Roma num comício do Irmãos de Itália, a italiana tinha sido muito menos contida na sua admiração por um dos seus aliados mais próximos na Europa, com um historial de anos de participações em campanhas eleitorais e trocas públicas de palavras de apoio e incentivo. “Para nós, o primeiro-ministro húngaro é um modelo que, dando o exemplo, mostra como permanecer orgulhosamente no palco europeu enquanto defende a soberania e a identidade cristã da sua nação, e também defende as fronteiras do seu país da imigração em massa e a economia real do financiamento especulativo”, disse na altura sobre o “amigo” em entrevista ao jornal húngaro pró-governo Magyar Nemzet.

A infância sem pai e a recusa de quotas: “Não sou um panda”

Apesar de na imprensa italiana coexistirem várias versões — alguns perfis de Meloni dizem que o pai saiu de casa quando ela tinha dois anos, outros quando tinha apenas um e outros ainda garantem que a relação entre pai e mãe já estava acabada quando a sua gestação foi conhecida —, uma coisa é certa: a líder do Irmãos de Itália, nascida em Roma a 15 de janeiro de 1977, cresceu sem uma figura paterna.

Na casa onde morava, no bairro operário e “vermelho” de Garbatella, em Roma, hoje uma das zonas trendy da cidade, foram praticamente sempre só ela, a mãe, natural da Sicília, e a irmã, que ainda hoje considera a melhor amiga.

“A minha mãe teve muitas dificuldades na vida, criou duas filhas sozinha. Devo-lhe tudo. O julgamento dela é um dos poucos que temo. A minha irmã, por outro lado, foi a minha guia. Ainda hoje é a única pessoa com quem tenho necessidade de falar ao telefone para conversar, para desabafar, não há nada sobre mim que ela não saiba”, contou Meloni numa entrevista à televisão italiana.

"Um pai que não está presente, que desaparece, é um pai que não te ama. Que te rejeita. É uma ferida mais profunda do que um pai que morre"
Giorgia Meloni, líder do Irmãos de Itália

Com o pai, um consultor fiscal natural da Sardenha que deixou a família e se mudou para as Ilhas Canárias, as irmãs passavam apenas duas semanas por ano, nas férias grandes. Até determinada idade, porque depois nem isso: “Quando tinha onze anos, fez-me um discurso que não se deve fazer a uma jovem e eu disse-lhe: ‘Nunca mais te quero ver’”, revelou na mesma ocasião. “Quando ele morreu não consegui sentir realmente emoção nenhuma, era como se ele fosse um estranho.”

Ao Corriere della Sera, a líder do Irmãos de Itália também já tinha confessado a dor de ter crescido sem pai: “Um pai que não está presente, que desaparece, é um pai que não te ama. Que te rejeita. É uma ferida mais profunda do que um pai que morre.”

Apesar de garantir que não gosta de “quotas cor-de-rosa” — “Não sou um panda”, respondeu uma vez, após ter sido questionada sobre medidas de paridade e igualdade —, Giorgia Meloni, que chegou a trabalhar como jornalista durante alguns anos e domina as ferramentas e truques da comunicação com os media, é tudo menos uma política cinzenta — e faz tudo menos guardar reserva da sua vida privada e a autobiografia “Io sono Giorgia” veio apenas enfatizar essa exposição.

“O nome sou eu, por que não haveria de ser?”

Publicado há um ano, “Io sono Giorgia. Le mie radici, le mie idee” (“Eu sou Giorgia. As minhas raízes, as minhas ideias”) colocou Meloni ainda mais na esfera pública, mas não trouxe propriamente grandes novidades ao público italiano.

Na sua autobiografia precoce, escrita aos 44, a líder do Irmãos de Itália voltou a vincar que a defesa da família, da pátria e da identidade religiosa e sexual é uma das suas principais bandeiras. “Eu sou Giorgia. Sou uma mulher, sou uma mãe, sou italiana, sou cristã. Não mo tirarão”, disse em vários discursos (que até se tornaram memes e foram remixados e transformados em música) e escreveu no livro que se manteve durante semanas nos tops das livrarias italianas — mas nunca chegou aos escaparates da Le Torri, uma pequena livraria na periferia de Roma.

Italian Right-wing Party Leader Meloni's Book Signing

"Io sono Giorgia", a autobriografia de Meloni, foi publicada há um ano e rapidamente se transformou num bestseller

Corbis via Getty Images

Alessandra Laterza, proprietária da livraria, a única, em 40 anos, a abrir portas no problemático bairro de Tor Bella Monaca, no sul da capital italiana, foi notícia em maio do ano passado por se recusar a vender a autobiografia da política de extrema-direita. “A minha é uma escolha ética, não vendo sapatos nem roupa, vendo livros”, começou por explicar a livreira, que dias depois teria de ser colocada sob proteção policial, tantas foram as ameaças de morte que recebeu por se recusar a vender “Io sono Giorgia”.

“A abertura de uma livraria em Tor Bella Monaca não responde apenas à necessidade de vender livros, também é uma forma de resistência civil. Se o pensamento de Meloni não me representa, não vejo porque tenho de vender o seu livro e de o colocar na montra, é uma escolha que também decorre dos meus sentimentos: tento, através dos livros, contar um mundo inclusivo, diferente do de certa propaganda política”, justificou-se Laterza, que em 2016 fez parte das listas do Partido Democrático às eleições municipais de Roma — as mesmas em que Meloni, com o apoio da coligação Nós com Salvini, se candidatou à presidência da câmara da capital italiana.

Na altura, Meloni, que estava grávida, foi aconselhada a desistir pelo próprio Silvio Berlusconi, histórico primeiro-ministro italiano que esta semana anunciou que vai ser candidato ao Senado nas eleições de 25 de setembro, em que ela aponta ao Palazzo Chigi.

"Se o pensamento de Meloni não me representa, não vejo porque tenho de vender o seu livro e de o colocar na montra, é uma escolha que também decorre dos meus sentimentos: tento, através dos livros, contar um mundo inclusivo, diferente do de certa propaganda política"
Alessandra Laterza, proprietária de uma livraria em Roma que recusou vender a auto-biografia de Meloni

“Pediram-me que me afastasse porque uma mãe não conseguia gerir um papel tão importante”, recordou em 2020 numa entrevista ao Politico.

Nessas eleições, a líder do Irmãos de Itália obteve 20,62% dos votos; o candidato do Força Itália, de Berlusconi, não foi além dos 10,99%. Agora que correm juntos, no bloco de centro-direita que integra ainda a Liga, de Matteo Salvini, e Nós com Itália, Itália ao Centro, UDC e Coragem Itália, Giorgia Meloni tem ainda mais avanço.

Segundo a última sondagem, publicada a 8 de agosto pela Sky Tg24, os partidos de centro-direita têm em conjunto 48,2% das intenções de voto, mas metade delas são devidas aos Irmãos de Itália, 24,2%. A seguir nem sequer vem o Força Itália (8,9%), mas a Liga Norte, com 14%.

Lega Per Salvini Premier Hold ''Italian Pride'' Demonstration Lega Per Salvini Premier Hold ''Italian Pride'' Demonstration

Com Matteo Salvini, num comício da Liga Norte, em 2019, em Roma

NurPhoto via Getty Images

Suportada por estes números, Giorgia Meloni não teve qualquer pejo em anunciar que, se das urnas saírem resultados idênticos, será a próxima primeira-ministra italiana, a primeira mulher no cargo. “As regras são conhecidas. Ao contrário do que a imprensa tanto gosta, não vou fazer campanha a falar de nomes, estreias e ministros. O centro-direita conhece as regras. O partido que tiver mais votos numa coligação propõe ao presidente do conselho a figura que gostaria de ver indicada como primeiro-ministro”, disse esta segunda-feira, em entrevista à rádio RTL. “O nome sou eu, por que não haveria de ser? O que eu não entendo é: por que não Meloni? Penso que os que votam Irmãos de Itália votam nesta ótica.”

Contra o casamento gay e as adoções homossexuais, sim. Homofóbica, nem pensar

Apesar de ter crescido com dificuldades, Giorgia Meloni conseguiu terminar o liceu com nota máxima. É hábil a fazer das dificuldades forças, disse em várias entrevistas, como aquela em que contou que, durante a adolescência, foi vítima de bullying por causa dos quilos a mais. “Os inimigos são sempre úteis porque te fazem crescer e questionar-te a ti próprio.”

Em vez de prosseguir os estudos e de ir para a universidade — mais uma vez o colorido a afastar qualquer laivo de cinzento do seu percurso —, Giorgia Meloni teve vários trabalhos para ajudar a mãe a pagar as contas. Foi baby-sitter, empregada de mesa e até bartender no Piper Club, uma das mais antigas discotecas de Roma.

Ao mesmo tempo, acumulava cargos e fazia uma ascensão meteórica que, ultrapassadas as presidências das juventudes de partidos como a Aliança Nacional (nome adotado em 1994 pelo MSI) ou Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi, a fez deputada e vice-presidente da câmara baixa do Parlamento italiano em 2006, com apenas 29 anos.

New Berlusconi Government Is Sworn In

Giorgia Meloni (à esquerda) tem 45 anos, faz política há 30

Getty Images

Dois anos mais tarde, no quarto governo de Berlusconi, Giorgia Meloni foi ministra da Juventude. Em 2012 abandonou o Povo da Liberdade e fundou finalmente o seu próprio partido, com Guido Crosetto, Ignazio La Russa e outros ex-militantes daquele e de outros partidos de direita e extrema-direita, como Aliança Nacional e Movimento Social Italiano.

Defensora inveterada do lema “Deus, Pátria e Família” (leia-se “família tradicional”), em setembro de 2016 Giorgia Meloni foi mãe de uma menina, Ginevra, hoje com quase seis anos, da relação que mantém com Andrea Giambruno, jornalista do site TgCom24 (propriedade da Mediaset, de Silvio Berlusconi), que conheceu há cerca de 10 anos, depois de ele a salvar de entrar em direto com uma banana na mão.

Tudo aconteceu nos estúdios da Mediaset, onde Meloni chegou atrasada (e esfaimada) para dar uma entrevista. “Ela chegou cheia de pressa e disse à assistente, a Giovanna : ‘Não comi, tenho tanta fome que vou desmaiar’. E a Giovanna: ‘Mas aqui só há uma banana’. E ela respondeu: ‘Dá-ma’”, revelou o próprio Senhor Meloni, como Giambruno gosta de se auto-intitular, numa entrevista em 2021.

Quando viu que a líder do Irmãos de Itália não se tinha apercebido de que o intervalo do programa Quinta Colonna, de que ele era autor, estava prestes a acabar e que ia entrar no ar a comer a peça de fruta, deu uma corrida: “Apressei-me e tirei-lhe a banana da mão, com um certo fervor. Não sei dizer o que aconteceu, os nossos olhos encontraram-se de uma forma estranha, foi um momento”.

“Não ao casamento homossexual (...) Para nós, as prioridades são outras: apoiar a família tradicional e a taxa de natalidade e defender o direito sacrossanto de uma criança a ter um pai e uma mãe”
Giorgia Meloni, líder do Irmãos de Itália

Desde então, a política e o jornalista, quatro anos mais novo, não voltaram a separar-se. Mas nunca chegaram a casar, nem quando ela engravidou. Numa entrevista em maio do ano passado ao famoso talkshow italiano Verissimo, Giorgia Meloni confessou, entre lágrimas, que, apesar de se considerar imune às críticas e ataques inerentes ao cargo que ocupa, sofreu com a pressão dos haters quando anunciou publicamente a gravidez — justamente no Dia da Família desse ano e depois de participar numa manifestação “pela defesa da família e das crianças” e contra a adoção por casais LGBT.

“Muitos queriam que eu sofresse um aborto”, lamentou-se Meloni, acusada de hipocrisia pelos opositores, por não praticar os valores que apregoa.

Na mesma conversa, questionada sobre se os que a acusam de ser homofóbica têm ou não razão, a líder dos Irmãos de Itália optou pela segunda hipótese. “É falso e verificável porque faço política há trinta anos e em toda a minha carreira não há palavras homofóbicas. Alguns rótulos são colados às pessoas para não terem de as confrontar”, disse a líder do Irmãos de Itália, que em 2015 foi ativamente contra a aprovação de um projeto de lei apresentado pelo Partido Democrático cujo objetivo era garantir aos casais em união de facto e do mesmo sexo os mesmos direitos dos casados.

Silvio Berlusconi And Giorgia Meloni Present "Right To The Future" Government Plan

Meloni foi ministra da Juventude do quarto governo de Berlusconi

Getty Images

“Não ao casamento entre pessoas do mesmo sexo: seria uma enorme despesa para o Estado e uma abertura inaceitável às adoções homossexuais. O Irmãos de Itália lutará no Parlamento contra a lei Cirinnà, que introduz a “adoção do enteado” e abre a porta às barrigas de aluguer”, anunciou Giorgia Meloni via Facebook. “Para nós, as prioridades são outras: apoiar a família tradicional e a taxa de natalidade e defender o direito sacrossanto de uma criança a ter um pai e uma mãe.”

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