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André Maia/Observador

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Retrato da mini-Turquia em Dortmund, tão grande como Lisboa e Porto juntos. É neste ambiente que Portugal faz o segundo jogo do Euro

Muitos, apaixonados e dedicados. Os turcos dominam a região de Dortmund, onde Portugal vai jogar precisamente contra a Turquia. O retrato de uma comunidade quase tão grande como Lisboa e Porto juntos.

O distrito de Lisboa tem mais de dois milhões de habitantes. Para sermos mais precisos, são 2.275.385 pessoas que todos os dias acordam na capital portuguesa. Mais acima, o Porto tem um pouco menos: 1.785.405 pessoas vivem no distrito da cidade invicta. No total, nestes dois distritos, dizem os Censos de 2021, vivem pouco mais de quatro milhões de cidadãos. São 4.060.790, quase metade da população de todo o nosso país. Quase o mesmo número de turcos a viver na Alemanha. De acordo com os números dados ao Observador pelo Consulado Turco em Essen, o segundo maior do país germânico, haverá cerca de 3 milhões de cidadãos turcos — entre naturais e descendentes — a viver em solo germânico. 

É precisamente na região deste consulado que a Seleção Portuguesa vai jogar no próximo sábado, em Dortmund, frente à Turquia. Tal como aconteceu com a Geórgia, a equipa portuguesa vai ter uma espécie de deslocação fora, qual jogo a duas mãos, mas sem segunda ronda. A Área Metropolitana da Renânia do Norte-Vestfália é mesmo considerada a região com mais turcos da Europa logo a seguir à própria Turquia, com entre 300 a 500 mil pessoas. Podemos esperar, portanto, um autêntico ambiente de Liga Turca — conhecida pelos ambientes pesados e infernais — no Westfalenstadion. Mas porquê aqui? E que íman terá a Alemanha para puxar tantos imigrantes turcos?

O Yeşiíl Market é totalmente destinado à comunidade turca em Essen

André Maia/Observador

“Trabalho cerca de 17 horas por dia. Aqui, na Alemanha, temos de trabalhar”

Chegamos à porta do Consulado da Turquia em Essen, a maior das cidades em redor de Dortmund. Apesar do relógio tocar apenas nas dez da manhã, o movimento já é muito. Porquê, numa terra que não é capital de estado e que é até ofuscada por outras mais mediáticas à sua volta? Um funcionário explica-nos. “Este é o segundo maior consulado do país inteiro, só atrás de Berlim. Para além disso, fica no meio de outros dois, o de Colónia e o de Münster. É mais central”. E essa centralidade nota-se no movimento. Tanto que o segurança à porta não tem mãos a medir e tenta acelerar quem demora mais na entrada. “É um dia de muito trabalho. Como pode ver, está sempre a chegar gente”, justifica-se o responsável pela comunicação do Consulado para o facto de o cônsul-geral não poder falar connosco. Isso não será um problema, porque o que não falta em Essen e nas cidades vizinhas são imigrantes turcos dispostos a conversar.

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[Já saiu o sexto e último episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio, aqui o segundo, aqui o terceiro, aqui o quarto episódio e aqui o quinto episódio.]

Ao almoço, quando perguntámos a um grupo de alemães onde é que os poderíamos encontrar, a resposta teve banda sonora de risos e foi um: “Em todo o lado”. Em cada esquina, um restaurante de kebab. Uma lojinha de recordações. Uma de reparações de telemóveis. Cada uma com alguém oriundo da Turquia. Marcámos rota então para o Yeşiíl Market, um supermercado turco no bairro de Altendorf. Lá dentro, num espaço ainda consideravelmente grande, apenas sete pessoas a fazer compras. Falámos com todas. Todas turcas. Os funcionários o mesmo, todos eles com origem na Turquia, e todos com outro denominador comum: a dificuldade em falar inglês. Ali, só turco ou alemão, tal como nas paredes enfeitadas, com bandeiras da Turquia ou posters de paisagens do país. Cedo percebemos que este bairro tinha grande predominância turca e por isso bastou atravessar a estrada para encontrar nova oportunidade de conversa.

Muammer Çelik (à esquerda), é dono do restaurante Başkent. Está na Alemanha desde 2009

André Maia/Observador

No restaurante Başkent limpava-se a casa depois do almoço, já a pensar no jantar. Apesar do momento de azáfama, houve tempo para falar com o gerente. “Falar” o possível. Muammer Çelik tem 48 anos e veio da Turquia há 15, mas não percebe inglês. Outro funcionário, também turco, faz de tradutor da já longa história da família de Çelik. “Os meus antepassados vieram para cá há mais de 60 anos. É uma vida. Depois vim eu, sendo que os meus filhos já nasceram aqui. Mas tudo começou há 60 anos”, conta-nos. Mas porquê aqui? O que tem a Alemanha para ser tão atrativa para os turcos?

De acordo com dados da OCDE de 2022, a Alemanha era o país da Europa com mais pessoas com cidadania turca depois da própria Turquia. A diferença para o segundo destino, a França, é absurda: são seis vezes mais imigrantes. “A qualidade de vida aqui na Alemanha é superior à da Turquia. Há quem queira vir para enriquecer, até porque há gente em situações muito difíceis. Aqui consegues ter uma casa grande, ter trabalho, férias. Para além disso, quase todos temos cá família. É por isso que escolhemos sempre a Alemanha”, explica Muammer, elencando as vantagens.

Mas não tudo são rosas. Para se colher os frutos, há que semeá-los: “A minha não se tornou automaticamente um luxo por vir para cá. Tenho um restaurante para gerir e trabalho muito nesse sentido. Faço aproximadamente 15 a 17 horas por dia. Se estamos cá, temos de trabalhar”, diz, numa resposta que vai também direta para a última polémica da política portuguesa, quando André Ventura, do Chega, disse no Parlamento que os turcos são “lentos”.

Turquia (Grupo F). A magia de Güler e companhia para subir a Montella com toque transalpino

Tanto que não haverá muito tempo para ir ao futebol. “Claro que estou a torcer pela Turquia e queria muito ir, mas não posso. Isto é o meu negócio, não o posso fechar assim”, explica. Mas admite: “Gostava de ver o Cristiano Ronaldo. Na minha opinião, continua a ser o melhor jogador de futebol do mundo. Aliás, na Turquia respeitamo-lo muito. Mas estou confiante numa vitória da Turquia”.

Serhat Saygili é jogador-treinador no SW Marienfeld

André Maia/Observador

“Na Alemanha tens uma vida boa. Um trabalho. Uma vida”

Estamos em Marienfeld, pequena vila do mesmo estado de Dortmund. Um plantel treina com grande intensidade num dos três campos relvados para o próximo jogo, importante, que vem já aí. É a equipa que mete Marienfeld no mapa do futebol. Umas ruas mais abaixo, treina também à mesma hora a Seleção Portuguesa de Futebol, mas aqui estamos mesmo a falar do SW Marienfeld, a única equipa desta pequena povoação. É lá que encontramos, com a camisola número 6 vestida, Serhat Saygili. Para além de ser jogador, também é treinador da equipa e ainda sósia do futebolista İlkay Gündogan nas horas vagas. “Somos parecidos, sim, admito. Aliás, já me chegaram a pedir fotos na rua”, confessa.

O cabelo, a barba, a face, mas também as origens. Serhat e Gündogan partilham as raízes turcas, algo também muito comum na história recente do futebol germânico: Mehmet Scholl, Emre Can, Mesut Özil, entre outros, fazem parte do leque de muitos jogadores com origem na Turquia. E são mesmo as origens que o fizeram vir para a Alemanha, depois de ter nascido em Ancara: “Não sei porquê a Alemanha. Não é pela língua, porque é uma língua difícil de aprender. É mais pelos nossos antepassados. O meu avô veio para cá nos anos 50. Depois o meu pai”. Depois veio Serhat, que já trouxe ao mundo uma quarta geração de “Saygilis”, com o filho pequeno que já tem. E o menino parece ter o mesmo destino do pai, já que voltar à Turquia não está no horizonte.

Serhat Saygili, o sósia de Gündogan, estrela da seleção alemã, também com ascendência turca

André Maia/Observador

“Talvez até possa voltar, mas só daqui a muitos anos, uns 10, pelo menos. Tenho um filho, é uma criança. E não é fácil voltar para a Turquia. Os turcos não aceitam muito bem o regresso de turco-alemães, não sei bem porquê”. E não precisa de saber, porque Serhat já decidiu. No que depender dele, vai continuar por cá. “Eu amo a Alemanha. Os alemães são boas pessoas. Eu tenho aqui uma casa, trabalho e não quero sair”. E até tem mais do que um trabalho. Para além de jogar no SW Marienfeld, de forma amadora, é engenheiro eletrotécnico. À semelhança de Muammer, do restaurante Başkent, trabalha mais do que o recomendado, 14/16 horas, mas neste caso pode fazer uma pausa para ver o Turquia-Portugal: “Sábado vou para Dortmund procurar bilhetes. E se encontrar um a preço humanamente decente, vou comprá-lo, claro. Se ganharmos, as ruas vão explodir, vai estar toda a gente na rua”.

Serhat está confiante e faz um prognóstico de 2-1 para a Turquia. Resta esperar por sábado para saber quem é o vencedor, mas num duelo já ganhou: a sua comunidade vai estar em peso no jogo e os turcos são mesmo a segunda equipa a jogar em casa neste Europeu.

 
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