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David Redfern/Redferns

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Salve, mestre: dez canções e uma playlist para celebrar os 80 anos de Gilberto Gil

Este domingo, Gilberto Gil torna-se octogenário. Pensámos em possíveis prendas ao mestre da canção e decidimos destacar 10 temas e fazer uma playlist, em jeito de homenagem e resumo de carreira.

Alegria, alegria, talvez lhe cante o velho amigo Caetano Veloso. Gilberto Gil, mestre da música brasileira, artesão da canção em língua portuguesa, o homem que compôs tudo de todas as maneiras, criando universos novos pelo caminho, faz 80 anos este domingo, 26 de junho.

Que melhor homenagem a Gil, figura maior da canção, fundador do tropicalismo, antigo ministro da Cultura do Brasil, autor de uma carreira plural que viajou do samba ao baião, da bossa-nova ao funk, do rock ao disco tropical, do que ouvi-lo? Fizemos uma playlist de 30 canções e escolhemos dez para celebrar um percurso musical brilhante (e que ainda não terminou).

“Procissão” (1965)

Foi, a par de “Roda”, a primeira grande carta de apresentação de Gilberto Gil ao Brasil. Primeiro single lançado pelo músico numa grande editora, seria mais tarde incluído em Louvação, primeiro álbum de Gil, editado em 1967. Com o imaginário de uma procissão católica no mítico sertão nordestino em pano de fundo — que o baiano conhecia bem, pela origem e por ter crescido a ouvir o “rei do baião” e príncipe de Pernambuco, Luiz Gonzaga —, é uma canção falsamente religiosa. Na verdade, se atentarmos à letra, Gil carrega consigo a influência da bossa nova de João Gilberto mas aproveita o balanço para uma crítica marxista à religião. Curiosamente, faria pouco depois uma nova versão do tema, mais elétrica e festiva.

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Eu também tô do lado de Jesus
Só que acho que ele se esqueceu
De dizer que na Terra a gente tem
De arranjar um jeitinho p’ra viver
(…)
Meu sertão continua ao Deus dará
Mas se existe Jesus no firmamento
Cá na Terra isso tem que se acabar

“Aquele Abraço” (1969)

Um ano depois desse marco do tropicalismo que foi o disco Tropicália Ou Panis Et Circensis, aventura de rapaziada disruptiva e inconformada com a velha guerra cultura brasileira vs cultura estrangeira (estavam lá Caetano Veloso, Gal Costa, Nara Leão, Os Mutantes e Tom Zé, agitados pelo psicadelismo e a vontade de revolver as águas), Gilberto Gil lança uma das grandes canções da sua carreira e um dos seus grandes sucessos. “Este samba vai para Dorival Caymmi, João Gilberto e Caetano Veloso”, anuncia, enviando abraços para a torcida do Flamengo (provocação de devoto do Flu?) e despedindo-se do seu Brasil querido já em preparativos para o exílio político.

A todo o povo brasileiro:
aquele abraço

“Chiclete com Banana” (1972)

É o samba-rock, meu irmão. Do disco Expresso 2222, que marca o regresso do músico após três anos exilado em Londres — e  onde também encontramos a magnífica “Back in Bahia” —, viajamos até “Chiclete com Banana”. É um bombom mestiço, apologia da mistura de culturas, de chicletes misturadas com bananas, bepop no samba, Miami e Copacabana, boogie-woogie de pandeiro e violão, tio Sam de frigideira numa batucada brasileira.

“Refazenda” (1975)

Se só tiver tempo para ouvir três discos completos de Gilberto Gil, talvez faça sentido começar por Refazenda (1975) e prosseguir daí para Refavela (1977) e Realce (1979). É uma trilogia profundamente inspirada, um trio de álbuns que apresenta Gilberto Gil em pico de criatividade, com algumas experiências interessantes (um disco com Jorge Ben Jor, um álbum gravado em Los Angeles com o produtor Sergio Mendes ou Refestança com Rita Lee), mas menos indispensáveis, pelo meio. Um regresso apaixonante de Gil à Bahia e ao Sertão, ao baião de Luiz Gonzaga, ao velho imaginário do Nordeste transposto para grandes canções, de arranjos ilusoriamente simples. O tema que dá título ao disco é imperdível.

“Ela” (1975)

Ainda imersos em Refazenda, recuamos duas faixas e vamos ao arranque do disco. A letra é bem mais curta, as palavras vão-se repetindo, as vozes confundem-se e Gilberto Gil, marujo-navegador nesta festa de percussões e melodias, faz a sua dedicatória:

Ela
Eu vivo o tempo todo com ela
Ela
Eu vivo o tempo todo p’ra ela
Minha música
Musa única, mulher
Mãe dos meus filhos, ilhas de amor

Gilberto Gil GILBERTO GIL IN CONCERT AT THE OLYMPIA IN PARIS Caetano Veloso & GIlberto Gil Perform In Sao Paulo Sergione Infuso Music Archive

Gilberto Gil leva já 63 anos de carreira

Frédéric REGLAIN/Gamma-Rapho via Getty Images

“Refavela” (1977)

Se o balanço rítmico foi sempre de quem tinha ginga no corpo, em Refavela, álbum de 1970, tudo se acentua. O africanismo irrompe canções dentro, o Afro-brasil canta-se e dança-se orgulhosamente. Regressado ao Brasil de uma viagem à Nigéria, onde se enamorou pela música de Fela Kuti e onde participou na segunda edição do Festival Mundial de Arte e Cultura Negra, em Lagos, Gil voltou às raízes africana e fez uma obra-prima. Dúvidas? Comecemos por tirá-las com o tema-título:

“Ilê ayê” (1977)

Podiam estar aqui muitas outras canções de Refavela, não faltariam candidatos. “Sandra”, “Era nova”, “Patuscada de Gandhi  – Afroxé filhos de Gandhi”… mas esta “Ilê ayê”, uma versão do cântico de Paulinho Camafeu, é impossível de ignorar, é Gil a “mostrar p’ra você” o mundo negro, a perguntar “que bloco é esse?” e responder, a reivindicar origens com orgulho (“Somo’ crioulo doido / somo bem legal / temos cabelo duro / somo’ black power“), é desbunda e homenagem ao Ilê Aiyê, o primeiro bloco carnavalesco afro do Brasil, fundado em 1974. Dancemos com ele.

“Toda Menina Baiana” (1979)

De Refazenda e Refavela, passamos para Realce. Logo à primeira canção do disco (o belo tema que lhe dá título) percebemos que é um mundo novo, os anos 80 a chegar, a produção e os arranjos brilhantes a puxarem lustro às canções, as caixas de ritmos a darem euforia dançante ao esqueleto melódico da composição. Foi um álbum quase todo gravado nos Estados Unidos da América, com o apoio do guitarrista Steve Lukather dos Toto, do baterista Rick Schlosser (colaborador Van Morrison e Rod Stewart), do teclista Michael Roddicker (colaborador dos Bee Gees e de Quincy Jones, elemento fundamental para o som do álbum) e do músico Jerry Hey (Michael Jackson e Earth, Wind and Fire) para os arranjos de metais.

“Não Chore Mais”, uma versão de “No Woman, No Cry” — que se tornara um êxito na voz de Bob Marley, que Gil idolatrava —, traz aroma reggae ao álbum. Mas a grande pérola é, claro, “Toda Menina Baiana”, êxito maior de Gil, exemplo mais feliz desta produção e arranjos dançantes, canção que pode ser tocada até à exaustão sem provocar cansaço, com as palmas, percussões e coros a levarem-nos para um Carnaval eterno.

“Palco” (1981)

Várias outras canções de Gilberto Gil dos anos 80 poderiam estar aqui. Por exemplo, “Andar Com Fé” (do disco Um Banda Um, de 1982), “Funk-se quem puder” e “Mar de Copacabana” (de Extra, de 1983) ou “Nos Barracos da Cidade (Barracos)”, de Dia Dorim Noite Neon. Mas as escolhas não são ilimitadas e a opção recai em “Palco”, belíssimo exemplo do mergulho de Gilberto Gil no balanço do groove e nas águas disco-funk no disco Luar. No ano em que o amigo Jorge Ben lança o espantoso (e subvalorizado) Bem-Vinda Amizade, o Brasil põe os óculos escuros e vive o arranque dos anos 80 com o mesmo espírito mas com mais pinta do que o resto do mundo. Dúvidas? Basta ouvir.

“Esotérico (Ao Vivo)”, com Caetano Veloso (2016)

De algum modo é batota: embora seja uma versão, revelada em 2016 e gravada no ano anterior ao vivo, é de um velho tema de Gilberto Gil, incluído no álbum Um Banda Um, de 1982. É claro que poderíamos ter ido às canções originais mais recentes, dos anos 1990 (“Parabolicamará”, “Madalena” e “Pela Internet” seriam boas escolhas). Ou ao balanço reggae — faceta importante da sua obra — de “Eleve-se Alto ao Céu”, de 2002. Ou ainda a “Na Real” e “Tartaruguê”, do disco recente de originais OK OK OK, de 2018. Mas vermos dois grandes amigos já septuagenários a cantarem desta forma em conjunto é comovente. Incluída no álbum Dois Amigos, Um Século de Música, o mesmo nome de uma digressão internacional feita por Caetano e Gil em 2015, é a beleza no seu estado mais simples: violão e vozes experientes a elevarem a canção aos céus.

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