Uma publicação que corre as redes sociais acusa a Organização das Nações Unidas de ter promovido, no seu site oficial, um artigo que defenderia “os benefícios da fome”. O artigo existiu mesmo e esteve no site da organização, embora tenha sido retirado da página. Mas porquê?

“O pessoal da ONU parou de destruir o mundo por alguns minutos para publicar um artigo (instantâneo a seguir) justificando seu comportamento e explicando os “benefícios” advindos da fome mundial que eles criaram”. A acusação feita dirige-se à ONU que, de facto, em 2008 publicou o artigo do professor (entretanto reformado) de Ciências Políticas da Universidade do Hawai George Kent na revista UN Chronicle.

No texto, Kent defendia “a fome tem um grande valor positivo para muitas pessoas. De fato, é fundamental para o funcionamento da economia mundial”. “Ninguém trabalha mais do que pessoas famintas. Sim, pessoas bem nutridas têm maior capacidade de atividade física produtiva, mas pessoas bem nutridas estão muito menos dispostas a fazer esse trabalho”, argumentava ainda.

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Catorze anos depois da publicação, o conteúdo do artigo suscitou críticas que a UN Chronicle resolveu retirando o texto que estava online — nesta página que agora dá erro. Argumentou, no início de junho numa publicação no Twitter, que o fazia porque o artigo teria sido escrito como uma “tentativa de sátira” e que “nunca foi escrito para ser levado à letra”, mas que mesmo como sátira “tinha falhas”, daí ter sido retirado.

Mas o seu autor também negou, por sua vez, a conclusão que a ONU tirou sobre o seu próprio artigo. À AFP, o académico disse que “não estava a tentar ser engraçado” e que não tem memória de ter feito “nenhuma menção a sátira” quando enviou o artigo para publicação. Nas declarações feitas no início deste mês Kent disse que pretendia “chamar a atenção” para a importância de “ver como a fome e a pobreza beneficiam quem não tem fome nem é pobre. O meu artigo de 2008 pretendia chamar a atenção para esse tema”, explicou detalhando que pretendia mostrar que exista quem não queira acabar com a fome porque beneficia da condição de pobreza dessas pessoas.

George Kent é, aliás, autor de vários artigos que foram publicados ao longo dos anos sobre questões de nutrição. E as Nações Unidas têm como segunda prioridade do seus 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável o combate à fome, alertando para o facto de o mundo não estar “no caminho certo para alcançar o objetivo “Fome Zero” em 2030. Se as tendências recentes de mantiverem, o número de pessoas afetadas pela fome ultrapassará 840 milhões até 2030″.

De acordo com as estimativas mais recentes da organização, 690 milhões de pessoas passam fome, 8,9% da população mundial.

Conclusão

Não é verdade que a ONU tenha promovido um artigo a defender os benefícios da fome. O artigo do professor George Kent, da Universidade do Hawaim foi inicialmente publicado em 2008 e retirado do site da UN Chronicle 14 anos depois, após muitas críticas que surgiram ao seu conteúdo. A organização entendeu retirá-lo devido às más interpretações que estava a suscitar, alegando que as pessoas não tinham percebido a sátira. Também dizia que o artigo continha erros. O seu autor nega que se tratasse de uma sátira e diz que era sim um alerta para a existência de beneficiários da fome de algumas populações que tudo fazem para que essa condição não seja alterada. O artigo que foi publicado pela revista da ONU não era, por isso mesmo, apologista da fome, com o seu autor a assinar vários documentos sobre esta problemática e a questão ser também a segunda prioridade da agenda do desenvolvimento sustentável das Nações Unidas.

Segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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