O Governo português regulamentou a aplicação do estado de emergência, definindo as atividades que, obrigatoriamente, se encontram suspensas e as que podem ou devem manter-se em funcionamento pelo facto de prestarem serviços de primeira necessidade ou outros serviços considerados essenciais na presente conjuntura.

Para além das consequências ao nível da saúde publica, a presente pandemia provoca graves consequências económicas e financeiras que atingem a relação empregador/trabalhador. Consciente deste facto, o Governo aprovou, entre outras, uma medida de apoio extraordinária à manutenção dos contratos de trabalho em empresa em situação de crise empresarial: 2/3 da retribuição ilíquida do trabalhador, sendo 70% assegurado pela Segurança Social e 30% assegurado pelo empregador (lay off simplificado).

Acontece, porém, que esta medida apenas é aplicável às empresas que (1) procedam à paragem total da atividade da empresa ou estabelecimento em virtude da interrupção das cadeias de abastecimento globais, da suspensão ou cancelamento de encomendas, e (2) tenham uma quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40 % da faturação, nos 60 dias anteriores ao pedido junto da segurança social com referência ao período homólogo. Prepara-se agora o Governo para aplicar o referido regime também às empresas que (3) foram obrigadas a suspender a atividade por decisão legislativa ou administrativa.

Pergunta-se: e em que situação ficam todas as empresas que se dedicam às atividades que o próprio Governo declarou como de primeira necessidade ou outros serviços considerados essenciais na presente conjuntura, como p. ex. supermercados, farmácias, serviços médicos e de saúde ou postos de abastecimento de combustível?

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Exige o Governo que estas empresas tenham um prejuízo de pelo menos 40% da sua faturação para poderem recorrer aos benefícios do lay off simplificado. Não se vislumbra qualquer razão para que assim seja. Se as empresas que se dedicam a atividades não essenciais podem usufruir imediatamente das vantagens do lay off simplificado, por maioria de razão (a fortiori) as empresas de primeira necessidade deveriam poder, de forma imediata, suspender ou reduzir atividade dos seus trabalhadores e ter direito ao referido apoio financeiro. Acresce que, o apoio financeiro a conceder pelo estado não terá, em muitas das situações, qualquer utilidade prática, porquanto uma parte significativa das empresas já se encontrará, aquando da concessão do benefício, numa situação economicamente inviável, o que terá graves consequências ao nível do desemprego.

É no princípio da confiança e não da desconfiança que o Estado deve exercer as políticas públicas, em especial numa situação excecional como esta. Estamos todos conscientes de que a grande maioria da empresas nacionais entraram ou entrarão em crise por causa da atual pandemia. É um facto notório, público. Continuar a laborar com até aqui era o maior dos desejos dos nossos empresários. Este é o momento em que a indústria e o comércio necessitam de ter o Estado ao seu lado, para que a respetiva atividade produtiva e comercial possa vir a ser retomada. Só assim se podem salvar postos de trabalho.

24 de março de 2020