Sabe Senhor Primeiro-Ministro,

Há dias, um ministro do seu governo, desafiou os enfermeiros a dar a cara.

Não deve ser de ânimo leve, que se chama cobarde a 70 mil profissionais. Pode ser má interpretação minha e o seu ministro não chamou cobarde, quis sim deixar uma ameaça velada a quem denuncia a insegurança dos portugueses. Seja como for, é mau, é feio e, acima de tudo, é muito ingrato.

Saiba que, a Ordem dos Enfermeiros não partidariza nenhuma situação. O nosso único partido, no desempenho das nossas funções, é o juramento que efectuamos no fim do nosso curso. Posto isto, pela lealdade institucional que devemos ao Governo e à Assembleia da República, aguardei serenamente pelo Prós e Contras desta semana para dar a cara e confrontar o senhor ministro da Saúde. Ironicamente, o Dr. Adalberto Campos Fernandes não deu a cara no programa, mas eu entendo. A cara dá-se no hospital, dá-se na urgência, a cara dá-se a doentes que agonizam de dores e  empresta-se o corpo a familiares transtornados com a sua perda. É aí que os profissionais de saúde estão a dar a cara! Pese embora, tanto quanto julgo saber, o Senhor ministro da Saúde não estar na prática clínica, admito que veja que dar a cara é no local próprio e no sítio certo, e a quem precisa, assim como dão milhares de enfermeiros portugueses todos os dias nos hospitais espalhados por este país.

Para nós, que temos a função de melhorar as políticas de saúde, a cara não pode ser dada apenas onde temos a certeza que teremos um suporte parlamentar e uma ovação independentemente da barbaridade que digamos. Isto é o que me faz lamentar mais que ontem o Senhor ministro da Saúde tenha virado a cara ao País quando Portugal anseia por explicações.

Como sempre dei a cara pelo SNS nos últimos 23 anos da minha vida e nunca seria capaz de “enviar” alguém para dizer aquilo que a mim não me convém, hoje sou eu que escrevo lembrando ao Senhor Primeiro-Ministro, que bem sabe a importância dos enfermeiros na sociedade, que o nosso ministro também é conhecedor do papel preponderante que os enfermeiros têm no Sistema de Saúde e sabe isso melhor do que aquilo que a teimosia e a dependência aos interesses políticos lhe permitem assumir.

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Na política, de facto, não pode valer tudo. Quando estamos a falar de vidas e de dignidade, é preciso olhar para imagens que foram tornadas públicas e ter compaixão. Se o ministro da Saúde não a tem, se aquele a quem deveriam impressionar mais as falhas do sistema que tutela nada diz, não demonstra remorso ou interesse, nega o que lhe está em frente aos olhos e o que lhe chega aos ouvidos para fazer de conta que está tudo bem, então, Senhor primeiro-ministro, não lhe resta outro caminho senão assumir que já não faz parte da solução.

Negar o óbvio não resolve o problema, só nos permite viver enganados por não vermos o sofrimento.

Presidente da Secção Regional do Norte da Ordem dos Enfermeiros