Se há figura política por quem considero que se tenha de ter respeito e afeto, é o Presidente da República Marcelo  Rebelo de Sousa. Que outro presidente surgiu comovido na capa da revista TIME a confortar uma senhora idosa  que perdeu tudo no incêndio de Pedrogão Grande, o que revelou o seu elevado sentido de Estado, os seus valores  e os seus princípios. Não se esperava outra postura do Presidente da República que não fosse a sua presença no  epicentro da tragédia, e ali cravou a bandeira do Palácio de Belém: a bandeira verde de Portugal, símbolo de  esperança, completa com a esfera armilar, com os castelos, os escudos e as quinas (*).

O Presidente Marcelo Rebelo  de Sousa demonstrou que sabia onde devia estar em dever e em sentimento e emoção. Como não podia deixar de  ser, os seus mandatos têm sido orientados não só por elevados valores de Estado e de Humanidade e também pelo  profundo respeito pela Constituição e tem sido um baluarte de defesa do povo português pela sua formação  constitucionalista.

O discurso do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa na cerimónia do 25 de Abril demonstrou que, ao contrário do que muitos pensam, está bem ciente do enquadramento atual desta democracia de 50 anos e, não  podendo citar todos, referiu alguns dos problemas que mais nos afligem presentemente. Porém, em minha opinião, o seu discurso foi muito insistente no passado, o que não deixa de ser importante para que não aconteça que “a  política seja o caminho para que homens sem princípios possam governar homens sem memória” (Voltaire), mas discursou pouco acerca do futuro.

Jano é o deus romano dos inícios, das decisões e escolhas, e era isto que pelo  menos eu esperava do Presidente da República: em discurso mais focado no que na sua opinião deverão ser os  inícios, as decisões e escolhas desta democracia, embora não tenha deixado de sublinhar que o primeiro passo é a  Democracia e logo a par a Liberdade, Liberdade de Escolha. Pelo contrário, foi a sua face que olha para trás que  dominou o seu discurso. No entanto, parece-me difícil discursar sobre 50 anos de democracia sem dissociar o  passado do presente e foi sobre este tema que quase se esgotou a maior parte do tempo do seu discurso.

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Olho para  as duas faces de Jano que parecem fazer evocar em Marcelo Rebelo de Sousa, uma o Presidente da República e a  outra, o cidadão Marcelo Rebelo de Sousa. Do primeiro, parece-me que tem sido um dos nossos melhores  presidentes no referente à vigilância da constitucionalidade dos diplomas elaborados pelos deputados votados na  Assembleia da República e tantas outras iniciativas marcantes que até onde foi possível, garantiram a estabilidade  em Portugal, necessária para o normal funcionamento das instituições públicas e privadas, empresas e cidadãos,  sempre com postura imparcial.

Do cidadão Marcelo Rebelo de Sousa, e caso assim o queira, esperam-se ideias,  iniciativas e posturas próprias de um cidadão livre e democrático. Mas confesso, e talvez seja defeito meu, que por  vezes tenho dificuldade e distinguir os dois. Se o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa é a figura incontornável e  representante da mais importante responsabilidade do Estado no enquadramento acima referido, o cidadão Marcelo Rebelo de Sousa parece exprimir a sua opinião e comentários, a que obviamente tem direito, nas  circunstâncias menos propícias em que também está a exercer as funções de Chefe de Estado e parece espoletar a  polémica e a desestabilização na sociedade política, nas empresas e nos cidadãos.

Já se está a ver que onde quero  chegar é à referência aos direitos humanos num país árabe onde direitos humanos “é como falar árabe” nesse país,  às “Reparações pelo Colonialismo”, conceito no qual não se sabe se em primeiro lugar estão incluídas as reparações  aos portugueses que regressaram a Portugal no processo atabalhoado de Descolonização, já para não falar dos  episódios do “decote” e da “senhora que era muito pesada para a cadeira” (espontaneidades inocentes, características do cidadão Marcelo Rebelo de Sousa). Existe algum país imperialista que não tenha salvaguardado  as suas relações económicas com as suas ex-colónias? E que mantenha a face voltada para essa época?

Em minha  opinião as referências às “Reparações pelo Colonialismo” são questões que devem ser debatidas entre o Presidente  da República e o Governo em funções, antes de serem apresentadas à opinião pública, pois correm o risco de serem  interpretadas como certas pelo Estado Português através do seu mais alto dignatário, ou então são considerações  do cidadão Marcelo Rebelo de Sousa que, proferidas pelo Presidente da República devem de imediato ser  sufragadas democraticamente. Pessoalmente sou mais a favor da face de Jano que olha para o futuro e para a  resolução dos problemas atuais e como referiu o Presidente da República e os que já estão por resolver há muito  (demasiado) tempo e que por isso abriram a porta a ideologias antidemocráticas que se vieram juntar às existentes  embora em enquadramentos políticos diferentes.

(*) – Em vez do “semáforo” – já revogado – que durante algum tempo ilegitimamente figurou em todos os  documentos oficiais em minha opinião altamente ofensivo para o povo português…