“Macaco vê”, diz o povo a respeito de algumas pessoas, “macaco obtém.”   O provérbio alude a um padrão de comportamento em que o intervalo de tempo entre ter uma percepção, formular um desejo e concretizar esse desejo é muito reduzido, e até inexistente.   Um babuíno avista um camelo e admira a sua solução engenhosa para a retenção de líquidos; no mesmo minuto considera a compra de próteses ou cantis.   Um hominídeo contempla à distância um cortador de relva raro; logo a seguir desloca-se até uma loja que os vende raros e torna-se proprietário de um cortador de relva.  Um mandril depara-se com alguém que exprime uma opinião; imediatamente adquire algumas para si, e exprime-as.

Queixamo-nos destes macacos obtinentes, em especial quando pretendemos surpreendê- los com a oferta de uma coisa que lhes faça falta ou lhes dê prazer, como seja um cantil, um cortador de relva ou uma opinião.   A mera tentativa de sugerir a possibilidade de poderem vir a ter qualquer coisa que não tenham antes desejado desperta em si um desejo novo muito intenso, a cuja satisfação procedem o mais expeditamente e o mais secretamente possível.  Porque nos acontece a nós, macacos menos obtinentes,  sermos menos rápidos que eles, estamos sempre condenados a satisfazer-lhes comicamente desejos já satisfeitos.    Na verdade, só um macaco obtinente pode satisfazer capazmente os seus próprios desejos: só ele está à sua própria altura.

A pouca paciência que tem para quaisquer intervalos entre formular um desejo e concretizar esse desejo indica que para a classe dos macacos obtinentes o mundo é movido à força de vontade ou, mais exactamente, é movido pela força da sua vontade.   Qualquer impedimento ou surpresa, qualquer atrapalhação da sua vontade, é sentido como uma ofensa ao modo como as coisas são, e às leis que regulam esse modo de ser.  Nenhum dos seus desejos pode ficar por isso por muito tempo em situação irregular, pendurado por assim dizer entre a vontade e a loja.

Os macacos obtinentes acreditam profundamente que tudo depende de si;  que a sua vontade é a causa de tudo o que acontece; que os seus desejos são a causa da sua vontade; e que a facilidade com que satisfazem os seus desejos é o modelo para toda a acção política e qualquer teoria moral.   Para quem, como os macacos obtinentes, ver é a garantia de querer obter, de facto, a política só pode ser o meio de satisfazer desejos no mais curto intervalo de tempo possível, a começar pelos próprios;  e a teoria moral só pode ser a maneira de justificar aquilo que se faz para evitar atrasos na satisfação dos vários desejos, a começar pelos próprios.   Ambas são exemplo daquilo a que poderíamos chamar o puritanismo contemporâneo;  da atitude que consiste em, mal nos ocorra um desejo, ir a correr legalizar a sua situação.

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