Seja qual for a cor clubística do leitor, concordará que nem todos os craques têm de ser treinadores ou dirigentes de elite, embora seja verdade que um jogador mediano se pode tornar num excelente treinador ou dirigente.

Rui Costa, “o maestro” – como ficou conhecido no mundo do futebol na década de 90 – a par de Luís Figo, João Pinto, Sérgio Conceição e tantos outros, foi um jogador de classe Mundial. Cristiano Ronaldo faz parte de uma geração mais jovem e figura num patamar ainda mais elevado, onde somente têm lugar alguns predestinados que merecerem um artigo à parte.

Sérgio Conceição e Rúben Amorim, desde muito cedo, se interessaram pela carreira de treinador e hoje são valores confirmados nessa área. Por seu turno, Rui Costa mostrou uma veia mais vocacionada para o lado corporativo de um clube: numa primeira fase, enquanto Diretor Desportivo do Sport Lisboa e Benfica, passando em 2020 a ocupar o cargo de Vice-Presidente e em julho de 2021 – devido à detenção de Vieira – assumiu a Presidência do clube coração, ainda que de forma interina.

Alguns meses depois, o “maestro” viria a vencer as eleições antecipadas com uma goleada de 84% dos votos, mas caiu-lhe no colo um clube mergulhado numa crise de resultados desportivos e, mais grave, associado indiretamente a diversos processos judiciais fora de campo. Quem melhor que o “discípulo” de Vieira para resgatar o clube histórico da sombra e devolver a mística e identidade ao Benfica?

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No plano europeu, o clube do “King” Eusébio conseguiu o apuramento para os “oitavos de final” da Liga dos Campeões, ainda que beneficiando do pior Barcelona dos últimos 30 anos. Porém, na principal competição interna – a Liga NOS – os maus resultados culminaram com a rescisão, por mútuo acordo, com Jorge Jesus depois de um humilhante afastamento da Taça de Portugal frente ao rival FC Porto, em pleno Estádio do Dragão, e de alegadamente ter ocorrido um “motim” interno contra o técnico no rescaldo da derrota.

O “bombeiro de serviço”, Nélson Veríssimo, voltaria a liderar a equipa técnica depois de uma primeira experiência após o despedimento de Bruno Lage. O melhor registo que conseguiu foram duas vitórias, uma na Luz e outra fora, com a equipa a demonstrar sempre muito fraca qualidade em campo e pouco entrosamento entre setores. A última jornada para o campeonato, quarta-feira à noite no Estádio da Luz, terminou com mais uma derrota por 1-2 perante um Gil Vicente taticamente muito bem organizado de trás para a frente, que soube sempre adaptar-se às exigências do jogo e deixou o Benfica a 12 pontos do líder FC Porto, colocando um ponto final nas (poucas) esperanças em conquistar o título.

Na sequência de um imenso coro de assobios e fortes insultos, no final da partida, dirigidos não só ao plantel e equipa técnica mas também a Rui Costa, o líder máximo do Benfica dirigiu-se à nação benfiquista na Sala de Imprensa. Com semblante visivelmente carregado e tenso voltou a apelar à união da massa associativa e criticou alguns lances de arbitragem que terão lesado “as águias” nos últimos jogos, ao mesmo tempo que admitia de forma pouco enérgica a necessidade de melhorar o rendimento desportivo.

Ainda que Artur Soares Dias possa ter cometido um erro grave ao anular um golo limpo à equipa da casa, a derrota frente ao Gil Vicente justifica-se muito mais pelo inexplicável sub-rendimento de muitos ativos da equipa principal do que pela arbitragem no seu todo. Enquanto dirigente de uma nova geração, esperava-se que Rui Costa pedisse desculpas aos adeptos e sócios pelo fraco rendimento dos jogadores em campo e garantisse a tomada de medidas internas para mudar, no imediato, a realidade do clube.

Nos últimos anos, o maior clube português em termos associativos, oscilou entre uma política de aposta massiva nos talentos do Seixal – que resultou na perda do pentacampeonato para um FC Porto em crise financeira – e um investimento de 100 milhões de euros, em ano de eleições, em atletas com poucos créditos firmados.

Para recuperar a identidade e honrar a história centenária do Benfica, Rui Costa e a sua estrutura necessitam de levar a cabo uma remodelação geral do plantel que deve incluir uma aposta gradual e sensata na formação, contratações seletivas de acordo com realidade económica pós Covid-19, a contratação de um técnico com provas dadas, blindar o balneário ao exterior e recuperar, para o seio do clube, a autoridade de algumas figuras históricas.

O Sport Lisboa e Benfica, tal como qualquer um dos grandes, será sempre objeto de escrutínio pela comunicação social, mas não será certamente por esse ruído exterior que, há muito, deixou de se ver bom futebol no Estádio da Luz. Rui Costa, enquanto Presidente, tem muito trabalho pela frente, só resta saber se o “maestro” consegue afinar a orquestra!