Costumo debater com os meus alunos o tema “onde a componente de impulso na compra está mais presente e é mais significativa” – se perante um linear de hipermercado, ou se em frente a um monitor em casa. Geralmente, as opiniões dividem-se e os argumentos a favor e contra cada uma das opções são igualmente consistentes. As diferenças entre estas duas tipologias de compra são talvez o aspeto a que produtores e distribuidores deveriam prestar mais atenção nestes tempos atribulados que vivemos.

Desde há muito que nos habituámos a aceitar que a incerteza fazia parte da nossa existência, mas, de facto, nunca como agora ela esteve tão presente em tantas vertentes das nossas vidas.

Na realidade nenhum de nós consegue antecipar, com algum nível de confiança, como vai estar a viver nos tempos mais próximos, nem sequer prever a altura em que tudo voltará, se voltar, à situação que antes nos habituámos a chamar de normal.

O mundo da gestão não ficou imune a esta revoada de alterações, que acelerou tendências que já tínhamos identificado, mas que, mais importante, criou comportamentos naqueles que são o foco da atenção de todos os que trabalham na área do grande consumo – os consumidores/compradores. Se a nível do consumo, as mudanças terão sido um pouco mais que marginais, com ligeiras alterações nos padrões existentes, a nível da compra, as mudanças foram, em muitos aspetos, radicais e com impactos avassaladores nos processos de satisfação de necessidades.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Talvez o exemplo mais significativo desta mudança seja a transferência brutal que se verificou da compra em grandes superfícies para as lojas online, numa altura em que os processos de encomenda em lojas virtuais e a logística física que lhe está adjacente estão, salvo melhor opinião, numa fase incipiente de desenvolvimento e de otimização da sua eficiência. O resultado imediato foi o escalar dos tempos de espera para entregas e uma manifesta incapacidade de resolver questões triviais, como ruturas de stock ou substituição por produtos alternativos.

Sem dúvida que o aspeto fulcral desta mudança, e o maior desafio que lhe está adjacente, é a forma como vai evoluir a compra online, por forma a dar uma resposta eficaz e eficiente às novas necessidades dos consumidores.

A distribuição moderna assenta, atualmente, em enormes centros de distribuição, com um complexo sistema de gestão de stocks e encomendas, e em lojas de média e grande superfície, que têm evoluído no sentido da maximização da área de vendas e da minimização da área de armazenagem, possíveis pela otimização dos processos logísticos que têm sido adotados. O problema que se põe aos operadores é que nenhuma destas estruturas está particularmente vocacionada para a satisfação de encomendas online.

Estarão as empresas de distribuição moderna preparadas para, ou interessadas em, terem centros de expedição capazes de enviarem de forma eficiente o número exponencialmente crescente de encomendas que recebem diariamente de todos os seus clientes individuais? Será comportável, em termos de rentabilidade, continuar a satisfazer de forma um pouco mais que arcaica estas encomendas? Deverão, em alternativa, as encomendas ser satisfeitas pelas várias lojas, com uma estrutura otimizada criada para esse efeito, reduzindo os tempos de deslocação e custos de entrega? Aparecerão no futuro novas plataformas, independentes dos operadores atuais, especializadas nos vários vetores da compra online?

As dúvidas são imensas, mas uma certeza podemos todos ter: abrem-se com esta nova realidade oportunidades colossais e quem as souber aproveitar criará novos paradigmas de resposta ao comprador/consumidor, que consolidarão vantagens concorrenciais que ditarão novos posicionamentos e cenários competitivos futuros.

Tentando arriscar uma conclusão, diria que a questão central com que todos hoje nos debatemos é a de saber sobre a perenidade destas mudanças: vieram elas para ficar, como resultado de uma forçada alteração do nosso modo de vida, ditado por novas exigências e prioridades, ou, pelo contrário, estamos só a atravessar uma fase passageira de alterações pontuais e tudo voltará a algo muito próximo do que já vivemos.