Começo por avisar que as palavras seguintes não são para alimentar mais paixões futebolísticas ou comentários desportivos. Há demasiada gente com essa tarefa, muito melhor preparada do que eu e com um conhecimento infinitamente superior sobre o tema. Mais ainda, não sou adepto do clube em questão. No entanto, entendo perfeitamente as pessoas que utilizam o futebol para, pelo menos durante hora e meia por semana, escaparem da realidade das suas vidas. Porque este mundo é cada vez mais injusto, assimétrico e ultimamente parece um hospício em que os terapeutas é que deviam ser os pacientes.

Jorge Nuno Pinto da Costa é um portuense de gema e apaixonado pela cidade. Nascido em Cedofeita, conhece o Porto melhor do que ninguém. Assistiu ao primeiro jogo de futebol no campo da Constituição com o seu irmão José Eduardo, que mais tarde viria a ser um dos mais respeitados médicos legistas portugueses e reputado professor catedrático. Jorge Nuno é igualmente um homem de extraordinária inteligência e cedo percebeu como funciona o desporto e o futebol em particular. Mesmo hoje, apesar de ter uma idade respeitável, continua a ser um administrador desportivo de excelência. Quem o conhece de perto diz que é um homem bondoso, afável e com grande sensibilidade para as artes e nomeadamente a poesia.

Toda a gente sabe que é o presidente com mais títulos e todos reconhecem o pulo que o Futebol Clube do Porto deu desde que é seu dirigente futebolístico. Mas além de ter olho para apostar nas pessoas certas e nas alturas certas, construiu há muito tempo atrás o que deve ser a cartilha do líder de um desporto-espetáculo que move milhões de pessoas e muitos mais milhões em dinheiro. Para além de escolher treinadores ou jogadores, percebeu que o presidente de um clube deve ser um promotor do jogo. Neste aspeto faz-me lembrar figuras como Muhammad Ali, que para além de ser um dos melhores desportistas de sempre, sabia como espicaçar o interesse do público através de frases polémicas. Pinto da Costa faz o mesmo, com a sua voz cáustica e sarcástica, transformando campeonatos que seriam aborrecidos em sucessos de bilheteira, publicidade e jornalismo. Talvez um dia, com a devida distância, os seus adversários e críticos entendam que ele dá o sal, a pimenta e todas as especiarias, para que o futebol português seja competitivo e divertido.

Outra característica inovadora da gestão desportiva de Jorge Nuno Pinto da Costa foi sempre chamar para si a atenção quando as coisas correram mal. Hoje já é uma prática amplamente difundida, tanto cá dentro como lá fora: aliviar a pressão dos jogadores depois das derrotas, despertando críticas aos árbitros ou aos adversários. Quando o faz, os adeptos do próprio clube esquecem-se do jogo menos conseguido e ficam com a polémica na memória, tirando o peso de cima dos ombros dos desportistas. Acredito que tenha começado a fazer isto por ser uma alma generosa, mas a verdade é que fez escola e hoje é prática comum em todos os clubes, grandes e pequenos. Quando um presidente não tem o carisma ou coragem para dar o corpo às balas, normalmente é o diretor desportivo ou o treinador a assumir esse papel.

Lembro-me que, há mais de vinte anos, um amigo me disse: “foi um grande presidente e o clube deve-lhe muito, mas a idade não perdoa e deve dar lugar ao próximo.” Passado um ano o FC Porto ganhou a taça UEFA e depois a Liga dos Campeões. Evidentemente, o meu amigo engoliu as suas palavras, mas com gosto. Pinto da Costa teve sempre esta capacidade de se destacar quando muitos duvidaram das suas capacidades. Nunca desistiu, tal como um atleta deve fazer, lutando até ao último minuto. Também aqui é e sempre foi um farol para os jogadores do seu clube, um exemplo de como deve ser o caráter de um homem bem sucedido.

Da mesma forma, as modalidade ditas amadoras devem-lhe muito, desde o hóquei em patins ao andebol e a muitas outras. Fez campeões olímpicos e alavancou o desporto na cidade e no país. A minha desilusão pessoal é que nunca se tenha candidato a um lugar de gestão pública, como presidente da Câmara da minha cidade. Mas entendo as suas razões e compreendo que o foco se tenha mantido naquilo que gosta mais de fazer. Termino este texto como comecei: sou adepto de outro clube português, mas acima sou adepto da competência e da justiça. Por momentos esqueçamos as paixões exacerbadas do desporto e do futebol em particular. Jorge Nuno Pinto da Costa merece ser aplaudido por todos e reconhecido pela sua capacidade de gestão inovadora e o seu contributo para que, pelo menos durante uma hora e meia, nos esqueçamos dos problemas da vida real lá fora.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR