Sempre que as democracias não respondem aos legítimos anseios e necessidades dos cidadãos e que as condutas das suas elites políticas não se regem por padrões éticos os populismos instalam-se e avolumam-se.

Existe um momento a partir do qual a racionalidade desaparece da escolha dos cidadãos porque se tornou persistente a ideia de que os Partidos tradicionais dos sistemas políticos não resolvem as situações, arrastam as tomadas de decisão e não avaliam com distanciamento as medidas herdadas, por outros implementadas.

As questões ideológicas sobrepõem-se à procura do Bem-Comum e isso favorece o populismo. Não que os populismos resolvam as situações, pois vivem apenas do elencar de problemas e não da apresentação de soluções. Mas tal é quanto basta ao populismo para fazer o seu caminho.

Compete aos decisores políticos inverter esta tendência, dando respostas concretas aos problemas com que os cidadãos se confrontam no seu quotidiano.

Vem isto a propósito, e concretizando no campo educativo, com o assunto que, pelo impacto negativo que provoca, neste momento mais preocupa todos os que têm responsabilidades na Educação.

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A falta de professores nas nossas escolas do Ensino Básico e Secundário.

Uma questão estrutural do Sistema Educativo.

Sendo a Educação uma questão de Estado a falta de consensos nesta matéria leva a que não nos possamos concentrar no desenvolvimento sustentável da qualidade do Sistema Educativo.

Todos sabemos que quando o objetivo é tornar o país mais competitivo, tal tem como força motriz a sólida qualificação dos cidadãos, aumentando a produtividade e atraindo investimento, permitindo a sustentabilidade da melhoria do nível de vida dos cidadãos.

Esse objetivo deve fazer parte dos consensos que devem prevalecer sobre as ideologias.

E os sinais têm de ser congruentes.

Não podemos defender que o aumento da produtividade se consegue promovendo o valor social da educação e criando condições para que cada vez mais os nossos alunos cheguem mais longe no Sistema Educativo e depois permitir que os mais qualificados sejam os mais esquecidos, sucessivamente, pelo próprio Estado na hora de os incentivar nas suas carreiras.

Para que este processo de melhoria qualitativa do desenvolvimento do Sistema Educativo seja sustentável não podemos baixar os braços e permitir que se instale, de forma permanente, a desqualificação do quadro docente, ao nível do seu recrutamento.

A autonomia das escolas, sendo o caminho a seguir para melhor se servirem os interesses dos cidadãos, não pode servir como porta de entrada para a desqualificação do corpo docente.

O que se está a passar, relativamente à falta de professores qualificados, problema cuja resolução se reveste de um enorme grau de emergência, poderia ter sido evitado se soubéssemos consensualizar o que é estrutural.

Se soubéssemos passar por cima das divergências ideológicas e se aqueles que, em cada momento, têm responsabilidades nas tomadas de decisão, bem como as suas equipas, refletissem sobre as decisões de quem passa o testemunho, poderíamos, certamente melhor defender o interesse nacional. As decisões tomadas no Sistema Educativo não podem ser consideradas adequadas, ou desadequadas, dos fins a que se destinam em função da sua proveniência.

Em Educação, fator incontornável de desenvolvimento sustentável de qualquer país, uma atitude conciliatória do interesse nacional deve ser exigida por todos, pois mais importante do que as questões ideológicas, é preparar o desenvolvimento do nosso futuro coletivo e salvaguardar o progresso social, fruto dos desempenhos das presentes e das futuras gerações.

E se tal deve ser salvaguardado como uma preocupação constante de todos, mais atenção requer quando os desempenhos dos nossos alunos saem fragilizados depois de uma pandemia e da consequente instabilidade que a mesma provocou, nesta matéria, junto da comunidade educativa.

Por força dos indicadores demográficos e dos dados estatísticos de que dispomos, sobre as idades dos docentes e a previsibilidade da sua aposentação, a falta de professores que se está a verificar era previsível.

Não podíamos ter deixado que este problema ganhasse o volume com que agora se nos apresenta. A nossa própria memória sobre a entrada de professores para os Quadros das escolas, em grande número, na década de oitenta do século passado, era um sinal de alerta de que esses docentes estariam a chegar, consequentemente, também em grande número, à idade de aposentação.

Mas, com este conhecimento, porque deixámos que a falta de professores se instalasse no Sistema Educativo?

Porque, conforme referido, não consensualizamos o que é estrutural. Porque em matérias decisivas para o desenvolvimento da nossa vida coletiva, onde se insere a Educação, não somos capazes de estabelecer um Pacto de Regime.

Porque se tal se verificasse as equipas decisoras em Educação não poderiam deixar de refletir sobre o que anteriormente fora feito, nomeadamente no que se refere aos critérios utilizados para a vinculação de docentes na carreira, tais como as necessidades permanentes do sistema educativo, a evolução demográfica e a previsibilidade de aposentações a curto e médio prazo.

Aqui chegados, e desconsiderando esses critérios, perante a estrutural falta de professores, implementaram-se medidas que se foram ajustadas ao passado, por força da massificação do ensino, não o são nos tempos atuais, pois configuram um retrocesso relativamente ao que se tinha já consolidado respeitante ao recrutamento de professores.

Todos desejamos que essas medidas sejam de emergência e que rapidamente sejam substituídas, por outras que se apresentem mais condicentes com a dignidade da docência e com o percurso continuado de afirmação da qualidade do nosso Sistema Educativo.

A desvalorização da função docente, por via da recuperação apenas parcial do tempo de serviço, fazendo tábua rasa da totalidade do tempo de serviço prestado sem progressão na carreira, quando o país se libertou da troika, em muito contribuiu para um acelerar das aposentações. Os diferentes intervenientes, com particular incidência sobre aqueles que tinham a responsabilidade da representatividade, não conseguiram explicar que essa recuperação do tempo de serviço docente na totalidade e foi criada uma ideia errada na opinião pública, que levou à desvalorização da classe docente. Por outro lado, criou-se ao mesmo tempo um país desigual para a classe docente, face à justa recuperação do tempo de serviço, assim considerada nas Regiões Autónomas.

Talvez se devesse pensar porque nos encontramos agora nesta situação. Porque tão poucos alunos, à entrada para o Ensino Superior, escolhem ser professores?

Não foi seguramente porque tudo o que fizemos até agora foi bem feito. Sabemos que não.

E sabemos que se por um lado houve um acelerar das aposentações, por outro a degradação da carreira docente é impeditiva da atratividade de professores mais novos, ou da sua retenção na carreira.

Face a esta situação, perguntamos até quando prevalecerá a cegueira ideológica que nos impedirá de nos sentarmos à mesma mesa e refletir sobre o que devemos fazer para inverter esta situação e dotar a carreira docente da dignidade e do reconhecimento que merece, valorizando o Sistema Educativo e o desenvolvimento económico, social e cultural do país.

E se o fizéssemos o país não ficaria a ganhar?

Não contribuiríamos, dessa forma, para estancar o populismo?

O populismo não se estanca em abstrato, mas sim com concretizações, para que a democracia se consolide. Se não formos capazes de implementar, nesta matéria, um Pacto de Regime, perde o país.