O rendimento social de inserção (doravante RSI) desempenha um papel crucial na sociedade portuguesa, ao prover um suporte financeiro para indivíduos em situações de vulnerabilidade. Nesse sentido, a importância do RSI transcende o aspeto puramente económico, contemplando o humanitário, o social e o desenvolvimento comunitário. Vai ao encontro de alguns dos objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU, como a erradicação da pobreza, destacando-se em situações de desemprego, doença, invalidez ou perda do provedor principal da família, através da satisfação de necessidades básicas (e.g., alimentação, habitação e saúde). O RSI proporciona a promoção da dignidade, redução da pobreza extrema, proteção contra crises económicas e mitigação da exclusão social de grupos vulneráveis. Esse rendimento contemplou, em janeiro de 2024, 180 923 beneficiários e 88 617 famílias. Sem o suporte oferecido pelo RSI, muitas famílias poderiam enfrentar uma queda ainda maior na pobreza, resultando num aumento das desigualdades socioeconómicas.

No entanto, o RSI apresenta diversas preocupações de justiça social, pontualmente evidenciadas em debates sobre políticas públicas, pelo que importa, neste artigo, identificar problemas e propor soluções.

Como é sabido, a simples assistência financeira não resolve as raízes que levaram os beneficiários a precisar do RSI, pelo que é estipulado pelo órgão de gestão a participação dos utentes em programas de inserção, conduzidos por trabalhadores sociais. Todavia, esses programas pautam-se, vastas vezes, pelo fraco estabelecimento e cumprimento de metas relevantes, objetivas, mensuráveis e personalizáveis e por ações formativas (nem sempre disponíveis) com conteúdo desapropriado ou até mesmo insignificante para que os utentes ultrapassem a sua fragilidade.

Por outro lado, o RSI, conjugado com outras prestações sociais, como o abono de família, pode, inadvertidamente, desencorajar a procura por empregos de baixa remuneração, considerando os benefícios acumulados serem superiores a esses trabalhos. Acrescem polémicas que põem em causa a legitimidade do RSI, como os gastos dos beneficiários em bens e serviços não essenciais (e.g., substâncias aditivas, como o tabaco, ou em estroinices) e omissões na alteração dos rendimentos / agregado familiar.

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Outro problema é que ao dependerem de subsídios, os pais podem criar um ciclo de pobreza intergeracional, com os filhos a poderem ser mais propensos a seguir o mesmo percurso de qualidade de vida reduzida, pautado pela desmotivação na procura de emprego, constantes dificuldades financeiras, ansiedade financeira, auto-depreciação, estigmatização e exclusão social.

Por último, a dependência de subsídios pode representar um fardo financeiro para o Estado, com os custos crescentes devido ao número de usufruidores e à falta de retorno económico associado, o que pode dificultar a alocação de recursos para outras áreas prioritárias (e.g., saúde, educação e cultura).

Diante desses problemas, urge implementar políticas públicas eficientes e respetiva fiscalização que promovam a participação ativa dos beneficiários no mercado de trabalho. Para o efeito, sob pena de cessação do RSI, os beneficiários devem participar em trabalho comunitário conjugado com programas de capacitação (que devem ser reformulados), conforme os níveis habilitacionais, como a aprendizagem continuada de cálculo, escrita, leitura, tecnologia, formação especializada, liderança, adaptação, resiliência e empreendedorismo, não esquecendo os domínios interpessoal e emocional. Todo esse processo deve ser feito através de um rigoroso planeamento, acompanhamento e controlo por equipas interdisciplinares responsáveis e dedicadas, também elas avaliadas por técnicos independentes, envolvendo sociólogos, assistentes sociais, psicólogos, economistas, gestores, educadores, políticos, entre outros. No plano macro, há que resolver o desemprego conjuntural, visando-se oportunidades de integração.

Assim, reconhece-se que o RSI é uma poderosa ferramenta na luta contra a pobreza. No entanto, há necessidade de se melhorar, continuamente, as políticas públicas a ele associadas, garantindo que se atenda, efetivamente, às necessidades dos mais vulneráveis e se contribua para uma sociedade mais justa.