Foi sem surpresa que vi a notícia de que os “Escuteiros Católicos acolhem todas as orientações sexuais” no seio da sua Instituição. Digo sem surpresa pois em 17 anos de escuteiro no ativo nunca me recordo de algum colega ou amigo ter sido discriminado ou afastado do Movimento pela sua orientação sexual ou afetiva. Digo também sem surpresa, pois sendo os Escuteiros um Movimento Católico seguiriam à partida aquilo a que diz o Catecismo da Igreja quando exorta os fiéis a acolherem os homossexuais com “respeito, compaixão e delicadeza. Evitando para com eles todo o sinal de discriminação injusta” (CIC, 2357). Recorde-se que o Catecismo, como o temos hoje, é um Documento que já soma mais de 30 anos. Mas digo também sem surpresa, visto que já de há uns meses para cá que tenho acompanhado a tentativa de assalto, marcada pela agenda ideológica, que está a ser feita ao Corpo Nacional de Escutas.

Seria desonesto não dizer, que certamente, como em qualquer rasgo da sociedade, houve e há discriminação nos Escuteiros não só de índole afetiva e de orientação sexual, mas também de cor, de opção política, por deficiência, por escolhas pessoais dos seus elementos etc. Eu próprio, que tenho uma deficiência física, senti na pele, numa atividade na Islândia, a tentativa de boicotar a minha participação na subida a uma zona vulcânica, pois, imagine-se, o seguro não previa a participação de pessoas com deficiência. Claro está que os meus companheiros de clã (família – assim se chama no grupo dos mais velhos) pegaram em mim e me levaram em ombros, por mais de nove horas, numa fantástica aventura. Portanto, quero com isto dizer, que infelizmente a discriminação é uma realidade transversal a tantas áreas das quais o Escutismo toma parte e tem a obrigação e o dever de lutar para que sejam devidamente erradicadas.

Contudo, o que creio estar a acontecer no Corpo Nacional de Escutas não é de todo uma tentativa de implementar a visão cristã da não discriminação e do acolhimento, mas sim moldar o movimento à agenda ideológica hodierna que mais do que dar espaço e um bom acompanhamento às crianças e jovens para que cresçam e se descubram em natural liberdade, as expõe a campanhas ideológicas e doutrinárias, neste caso, claramente contrárias à visão cristã das relações humanas e do crescimento das crianças e jovens.

O facto de determinados membros e grupos da sociedade e da Igreja terem no passado e provavelmente ainda na presente, descurado e desobedecido infielmente à lógica da sã convivência humana, não nos deveria permitir dar espaço para fazermos um exercício muito semelhante, ainda que no polo aparentemente oposto da intencionalidade. O Documento sobre o “Posicionamento institucional – Afetividade e sexualidade no programa educativo do CNE” não é mais do que, na minha opinião, um lobo vestido de cordeiro. Para além dos vários erros antropológicos subjacentes nos conceitos apresentados no Documento, este, sobre a capa de um ímpeto inclusivo e acolhedor, demite os dirigentes do CNE daquilo que seria a sua verdadeira Missão – acompanhar as crianças e jovens no seu crescimento à luz da Lei Natural e da liberdade individual que dela provém. A oportunidade do Documento é tão paradoxal que parece não se dar conta de uma evidencia brutal: a maior parte dos participantes do movimento escutista são crianças e jovens em crescimento, que precisam do devido acompanhamento pastoral na descoberta da vida de Graça que inclui também a sua afetividade. O Documento parecendo ser um passo adiante, é a oficialização de uma demissão coletiva do movimento escutista no dever de acolher e acompanhar todos, abandonando-os aos seus sofrimentos e dúvidas, ao dar por natural que crianças e jovens daquelas idades tenham já definido o que quer que seja da sua afetividade. As crianças e os jovens estão a descobrir e não a definir, são coisas bem distintas e o pior é que o movimento não só está a ignorar essa diferença como a está a camuflar ou mesmo a abrir espaço, creio que intencionalmente, para experimentalismos doutrinários. Exemplo disso é o próprio movimento que surge dentro do CNE, o chamado “Entre linhas”. Ironicamente até o nome é sugestivo da intencionalidade do que está a acontecer, por entre linhas a cúpula do CNE está a sujeitar o movimento a uma separação da sua suposta coluna vertebral: o Evangelho e a proposta aos jovens do ideal do Homem Novo – Jesus Cristo.

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Recentemente um dos antigos Assistentes do CNE escreveu uma Carta Aberta ao Movimento onde alertava para este abismo para onde caminha o Corpo Nacional de Escutas. Carta essa que seria praticamente abafada pelas estruturas que infelizmente têm poder para o fazer.

Neste rumo o CNE prepara-se para sair do Corpo Místico a que pertence – a Igreja – e formar um corpo autónomo, com um programa educativo e doutrinal paralelo ao do Evangelho. Se essa é a vontade de alguns, então que o façam, mas não usem o CNE como incubadora para as suas ideias, que não são mais do que vontades próprias para ingressarem nas luzes da agenda ideológica atual.

O mais interessante disto tudo é que o criativo destas ideias no CNE parece seguir exatamente a mesma lógica do atual Prefeito para a Doutrina da Fé em Roma – Sinodalidade sim, mas só para aquilo que nos convém. Tanto os capatazes do CNE como o Cardeal “Tucho” ignoram a lógica sinodal de Francisco e antecipam-se à escuta da Igreja Universal e ao diálogo com os irmãos e particularmente com os irmãos bispos, a quem compete ensinar e zelar pela verdade. No caso do Cardeal “Tucho”, já são centenas os bispos que afirmam não aplicar os seus experimentalismos, no caso do CNE, dado que isto é Portugal, o mais certo é os bispos “verem a banda passar e continuarem a cantar coisas de amor”.

Pela gratidão e amor que tenho ao CNE termino apelando aos dirigentes de boa vontade que existem no movimento que não tenham medo de se rebelar contra esta perigosa destruição da missão e identidade dos Escuteiros Católicos Portugueses.