Futebol em dia de autárquicas não pode ser? Os resultados mostraram que uma coisa não tem mesmo nada a ver com a outra. E, entre as muitas pessoas que foram votar nos arredores de Alvalade e seguiram para o estádio, algumas equipadas a rigor com a camisola do seu clube, a única “queixa” foi mesmo dos poucos lugares para estacionar entre moradores, votantes e adeptos da bola. Terminado o jogo, a história foi outra e todos saíram a queixar-se de alguma coisa: o Sporting, de uma exibição desastrosa; o FC Porto, de uma péssima finalização; Marega, de falta de sorte; Battaglia, da lei de Murphy que caiu em si entre o jogo do Barcelona e o clássico.

Na abordagem ao encontro, na entrega a cada bola, na velocidade de transição, na maturidade para gerir tempos de jogo, na tática inicial e na capacidade técnica, os dragões foram superiores em tudo aos leões. E como esses são aspetos que decidem qualquer eleição sobre o vencedor de um jogo de futebol, a maioria absoluta estava garantida de caras. No entanto, houve (ou voltou a haver) um São Patrício que travou todas essas sondagens à boca de uma urna em forma de baliza que ficou selada durante os 90 minutos a qualquer tentativa de voto.

Ficha de jogo

Mostrar Esconder

Sporting-FC Porto, 0-0

8.ª jornada da Primeira Liga

Estádio José Alvalade, em Lisboa

Árbitro: Carlos Xistra (Castelo Branco)

Sporting: Rui Patrício; Piccini, Coates, Mathieu, Jonathan Silva; William Carvalho, Battaglia; Gelson Martins, Acuña (Podence, 90’), Bruno Fernandes (Bruno César, 62’) e Bas Dost

Suplentes não utilizados: Salin, Ristovski, André Pinto, Palhinha e Alan Ruíz

Treinador: Jorge Jesus

FC Porto: Casillas; Layún, Felipe, Marcano, Alex Telles; Danilo, Sérgio Oliveira, Herrera (Otávio, 74’); Marega, Brahimi (Corona, 88’) e Aboubakar (Soares, 86’)

Suplentes não utilizados: José Sá, Diego Reyes, Maxi Pereira e Óliver Torres

Treinador: Sérgio Conceição

Disciplina: cartão amarelo a William Carvalho (37’), Marega (67’), Layún (68’), Danilo (72’) e Jonathan Silva (79’)

Mas os adeptos do Sporting iam tendo paciência. Muita paciência. Mas estavam impacientes. Muito impacientes. Tudo o que os leões têm de bom tinha sido anulado pelo FC Porto ao longo de 45 minutos, mas também havia aquela parte onde nada sabia bem no plano pessoal a ninguém. E foi nessa altura, mesmo antes do descanso, que os dragões lançaram mais uma ofensiva com cruzamento da esquerda. Jonathan Silva, ao segundo poste e com Marega ainda distante, conseguiu fazer uma rosca que ainda deu a ilusão ótica de autogolo. Patrício atraiu a bola para si, que por acaso até vinha com pouca força. Mas esta foi uma das imagens que marcaram a primeira metade do clássico.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Com a manutenção de Sérgio Oliveira no onze (a única alteração foi na lateral direita, com a troca de Ricardo por Layún), o FC Porto ganhou algumas parecenças ao Sporting no plano tático. É óbvio que as características de unidades como Gelson Martins e Marega ou Bruno Fernandes e Herrera são distintas, mas em termos de jogo posicional eram muitas vezes fotocópias do mesmo plano com diferentes destinos para chegar à baliza. Caminhos que os dragões tiveram o mérito de encontrar para si e de esconder do adversário desta noite.

Sérgio Conceição, a obra, quis desafiar Jorge Jesus, o criador, num jogo sem bola. Por um lado, porque sabia bem o que fazer com ela; por outro, porque mantendo as linhas de pressão em zonas altas tal como faz em casa, com Herrera e Danilo (sobretudo estes) bem subidos no terreno, tirou-a ao Sporting. Houve lances daqueles que não lembram a ninguém: passes disparatados de Battaglia (o melhor em campo com o Barcelona), escorregadelas quase fatais de William Carvalho em zonas proibidas, desposicionamentos de Piccini e Jonathan Silva, muitas bolas perdidas de Gelson Martins. Houve isso tudo e algo mais: um FC Porto melhor em todos os capítulos.

Layún (10′) e Sérgio Oliveira (16′) fizeram os dois primeiros remates, muito fáceis para Rui Patrício. Seria a vez de brilhar o do costume, Aboubakar, mas o tiro saiu a rasar o poste após mais uma das investidas com sucesso de Brahimi, um perigo à solta pela esquerda (18′). E mais uma tentativa despropositada de Herrera muito por cima (19′). Em ataque organizado ou transições rápidas, só dava FC Porto, mas tudo parava ou pelos remates falhados ou pela intervenção da melhor unidade leonina, Rui Patrício, que fez a primeira grande defesa aos 22′ (Brahimi).

O guarda-redes ainda iria tirar o golo dos pés de Aboubakar (40′) antes da primeira oportunidade do Sporting, quando William Carvalho, após cruzamento da direita, cabeceou para defesa de Casillas para canto (43′). Mas até aí a coisa correu mal aos jogadores verde e brancos porque o remate, feito algures com o pescoço e com o ombro, saiu sem força. E já estava tudo preparado para o intervalo quando Marega, na sequência de um centro da esquerda, veio da direita para o centro para acertar com a bola na trave da baliza de Patrício (44′).

O segundo tempo foi diferente, mais equilibrado. E mudaram, fundamentalmente, duas coisas: o FC Porto perdeu profundidade ofensiva e o Sporting encontrou os espaços entre linhas que escassearam na primeira metade. Desgaste físico? Mudanças táticas? Talvez um pouco das duas. O certo é que houve outro jogo. E com menor qualidade, menor caudal atacante e menor número de oportunidades para ambos os conjuntos.

Bruno Fernandes, numa bola ganha após ressalto que o deixou sozinho na área em plena carreira de tiro, atirou muito por cima (59′); Aboubakar, no seguimento de um lance em que os jogadores leoninos ficaram a pedir um lançamento a seu favor, foi isolado por Brahimi mas viu novamente Rui Patrício levar a melhor (79′); Layún, mesmo a acabar, atirou de livre para mais uma defesa do guardião verde e branco (90′). Se tirarmos aqueles lances de cruzamento em que alguém chega atrasado na área, as oportunidades na segunda parte resumiram-se a isto. E, mesmo com uma notória quebra qualitativa na organização e na abordagem ofensiva, o FC Porto foi melhor.

O FC Porto sai satisfeito porque manteve a liderança da Primeira Liga e frustrado por não ter conseguido materializar a superioridade. O Sporting sai satisfeito por ter mantido a distância de dois pontos para o primeiro lugar e frustrado por ter feito das exibições menos conseguidas da temporada no primeiro jogo grande do Campeonato. Quem disse que amigo não empata amigo? Rui Patrício não foi, de certeza.