A emergência do Chega e do Iniciativa Liberal, a vitória de Rui Rio para a presidência do PSD e o próximo congresso do CDS conduzirão a uma nova configuração do espaço político do centro-direita em Portugal. O que é normal e desejável é que este espaço se reorganize traduzindo a realidade social presente, sob pena de continuar em crise de representação e em défice de legitimidade. O centro-direita só tem legitimidade e sentido se for a interpretação do pensamento e do sentimento de uma larga faixa da sociedade. Neste momento, é lícito dizer que a direita democrática, moderada e social está sem casa e sem conforto ideológico. Sim, há em Portugal uma enorme percentagem de pessoas que não se reveem no ideário da esquerda, que querem menos impostos, mas não abdicam das funções sociais do Estado, que querem mais segurança, mas dispensam o autoritarismo, que não desconfiam do privado, mas defendem a saúde e a educação públicas, que planeiam o seu futuro, mas não dispensam a segurança social, que querem viver melhor, mas privilegiam o combate à pobreza. Atrever-me-ia a dizer que são gente equilibrada e com muito bom senso.

Há um mundo fora das redes sociais que é de direita sem idolatrar o Bolsonaro e o Trump, que não se esfarrapa em desculpas mal amanhadas para justificar o fracasso catastrófico do neo-liberalismo, que não se rege por maniqueísmos de petit comité. Para estas opções, para estes nichos de eleitorado, já existe o Chega e a Iniciativa Liberal. O CDS é outra coisa, e não deve deixar de ser aquilo para que foi criado. Tendo havido da parte de uma das candidaturas à liderança do CDS, uma bipolarização entre o que chamavam de bolsonarismo e eles próprios, gente com percurso ideológico ultra-liberal, na sua maioria, a começar pelo próprio candidato, o desacerto é evidente e assustador. A disputa, a dita bipolarização entre o Chicão que dizem bolsonarista e o Almeida que sabem ultra-liberal, poderá de facto acontecer, mas será sempre pelos segundo e terceiro lugares.

O partido no seu todo, os seus militantes, compreenderam muitíssimo bem o que se passou nos últimos quatro anos. Conhecem muito bem o nome e a cara de cada um dos responsáveis pelo descalabro dos 4%. Viram-nos então, e vêem-nos agora a discursar na apresentação de João Almeida, a desfilar nos apoios ditos notáveis. Os mesmíssimos de sempre. Os que defenderam com entusiasmo o fim do salário mínimo, do RSI, da segurança social, da saúde pública e da escola do Estado. Os mesmíssimos que se perpetuam no poder que o partido vai proporcionando, como donos disto tudo, como um club, uma agremiação de entrada restrita, só para alguns. Todos estiveram na anterior direcção, todos apoiaram e encorajaram Assunção, todos são responsáveis sem excepção. Tristemente, de modo que me abstenho de qualificar, já todos abandonaram Assunção.

Ao contrário deste grupo, não acho que o Francisco Rodrigues dos Santos seja o Bolsonaro português. Reconheço-lhe talento e energia e acredito nas suas rectas intenções. Ainda assim, a sua linha ideológica, muito tradicionalista, muito de exaltação de um patriotismo exacerbado, a roçar o anti-europeismo típico das direitas populistas europeias, o exagerado culto da personalidade e a evidente toxicidade dos apoios que exibe, mostram que se deixou aproximar, pelo menos na aparência, e sabemos o que esta vale em política, do espectro mais radical da direita. Falta a Francisco a capacidade de afirmação externa, sairia caro ao CDS o erro de acreditar que discursos empolgantes, capazes, como alguém disse, de hipnotizar uma sala, seriam o suficiente para relançar o partido; não ajudaram a eleger o Francisco no Porto, não ajudaram a JP a afirmar-se externamente no país, por muita mobilização interna que tenha.

O debate desta semana na RTP, mostrou o que já tinha mostrado o debate interno do CDS. À parte desta contenda, de contornos por vezes pouco edificantes, entre Almeida e Rodrigues dos Santos, há um candidato a falar para o país e para o povo da direita moderada, o povo do CDS de sempre e o povo que deixou de ter casa no PSD há precisamente uma semana. O Filipe Lobo d’Ávila insiste em falar do CDS em diálogo com os seus eleitores naturais e com o país. O Filipe Lobo d’Ávila é o único elegível que nunca sufragou as contas que arruinaram a estrutura do partido. O Filipe é o único dos elegíveis que votou contra a colonização lisboeta das listas eleitorais, com os trágicos resultados conhecidos. O Filipe renunciou ao mandato de deputado por divergência política, em vez de fazer contorcionismo por dependência desse ou de um qualquer outro cargo. O Filipe recusou sempre o jogo dos ataques sem nome e nunca prescindiu da coragem que a lealdade exige. Tem um programa para o CDS e uma ideia para Portugal. Afirma-se tranquilamente pela coerência, pelo desprendimento, pela seriedade e pela moderação. Como o povo de direita gosta. Chegou a sua hora.

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