O número de vendedores com licença para ocupar lugares permanentes na Feira da Ladra, em Lisboa, tem aumentado desde 2005, quer por ter desenvolvido uma componente lúdica quer pela procura de estudantes, disse à Lusa fonte do município.

De acordo com a mesma fonte, o número de licenças passadas tem crescido gradualmente de “307 licenças para lugares permanentes e cerca de 200 licenças ocasionais [período de 1 a 3 meses]” em 2005 para, nos primeiros três meses deste ano, “386 licenças para lugares permanentes e 79 licenças ocasionais”.

No entanto, os processos por venda ilegal naquele espaço também parecem estar a aumentar já que, entre janeiro e março deste ano, foram instaurados metade do total registado no ano passado.

Segundo informação enviada à Lusa pela Câmara de Lisboa, durante o ano de 2014 foram instaurados 48 processos de contraordenação por incumprimento das regras de funcionamento da Feira da Ladra e de venda ilegal no recinto.

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Entre janeiro e março deste ano, “já foram instaurados 24 processos de contraordenação”, o que representa metade do total do ano anterior.

Gerida pela Câmara de Lisboa, a Feira da Ladra é “uma feira muito antiga e bastante consolidada, quer nas suas características, quer no que diz respeito às relações com o espaço urbano onde se insere”, continuando a realizar-se todas as terças-feiras e sábados, no Campo de Santa Clara.

De acordo com a autarquia, “a Feira da Ladra, para além de espaço comercial, tem desenvolvido uma componente lúdica e característica de ponto de encontro para os estudantes que aí vendem um pouco de tudo, o que explica o muito elevado número de licenças de venda ocasionais”.

Todos os lugares de venda na Feira estão “devidamente demarcados e os setores delimitados”, permitindo à autarquia “assegurar a gestão rigorosa de todos os lugares que se encontram ocupados e vagos”.

Quanto ao tipo de artigos vendidos, “são privilegiados os artigos usados, que estão na génese e tradição da feira” e “estão canceladas, desde 1990, as licenças para venda de artigos novos à exceção de artesanato, permanecendo atribuídas apenas aquelas que foram concedidas antes desta data”.

As taxas cobradas em 2015 para exercer atividade na Feira da Ladra são de 3,20 euros por metro quadrado por mês, para a ocupação permanente e venda de artigos usados e de 12,80 euros para artesanato. No caso da ocupação ocasional para venda de produtos usados, a taxa por metro quadrado é de 1,60 euros por dia e de 2,40 euros para venda de artesanato.

A fiscalização na Feira da Ladra, nomeadamente para verificar as vendas sem licença, fora dos espaços autorizados ou de produtos não autorizados, é assegurada pela Polícia Municipal, enquanto a PSP e a Polícia Judiciária são responsáveis pela verificação da proveniência dos produtos vendidos.

Ocupantes da Feira da Ladra tentam sobreviver à crise com artigos usados

Desde que ficou desempregada, há ano e meio, Conceição Parente, de 49 anos, desloca-se de Sintra, onde reside, para a Feira da Ladra, em Lisboa, para poder vender “um bocadinho de tudo, produtos que tinha em casa, coisas de trocas”.

Conceição Parente faz parte dos 465 vendedores que rentabilizam artigos usados, como peças de roupa, loiças, velharias ou antiguidades para “tentar sobreviver à crise”, como explicou à Lusa.

Tem uma banca fixa, atribuída pela Câmara de Lisboa em troca de uma mensalidade de 12 euros, para poder vender “um bocadinho de tudo: produtos que tinha em casa, coisas de trocas”, explicou.

“É daqui que vem o sustento”, contou a feirante, referindo que estes produtos são vendidos a “valores muito abaixo do justo”.

Apesar de serem usados, esses objetos estão, na maioria dos casos, “em bom estado e com valores bastante baixos”, defendeu a feirante veterana Maria Garcías, de 62 anos.

Para esta vendedora, “não é por causa da crise” que as pessoas ali vão comprar, mas “há muitas pessoas a venderem por causa da crise”.

“Há 20 anos fazia muito dinheiro na feira e já se comprava roupa, já se comprava tudo em segunda mão, não havia era tantas feiras de velharias, porque isto era um tabu, a pessoa que vinha comprar à feira tinha um certo receio que um vizinho visse”, contou Maria Garcías.

Também para António Lopes, de 61 anos, ter uma banca na Feira da Ladra é um negócio que “está pior” porque se vende “menos do que se vendia há uns anos atrás”.

“As pessoas já não procuram tanto e regateiam bastante, se pedimos 10 [euros], elas oferecem 5 [euros]”, explicou.

Natural de Évora, António Lopes, percorre cerca de 130 quilómetros há mais de 15 anos para fazer a feira, realizando a viagem de véspera para montar a banca por volta das 06:00, onde vende “cobres, loiças, ferragens, coisas antigas, coisas que praticamente já não se fabricam”.

Questionado sobre a origem dos produtos que comercializa, o feirante explicou que compra a particulares, mas por vezes há pessoas que aparecem a tentar vender-lhe alguns artigos e “se desconfiar que são roubados”, não compra.

Para não estar parado e “porque as reformas não são grandes”, Pedro Santos, de 72 anos, tem um espaço na feira onde vende reproduções de obras de arte de Almada Negreiros ou de José Malhoa, feitas por ele, assim como alguns bens de família que já não têm utilidade, como uma trotinete “que já passou para os netos e que agora já não dá para ninguém”.

A vender peças de artesanato, Maria Martins, de 69 anos, capta sobretudo a atenção dos turistas estrangeiros, que “ficam maravilhados” com os seus trabalhos feitos em croché, com cortiça, em tecidos ou em telas.

“Vendo bem, porque também apresento peças um bocado diferentes”, disse a artesã, que paga à autarquia “150 euros por mês para quatro metros” de espaço na Feira da Ladra, considerando ser “razoável”.

Por viver perto da Feira da Ladra, Maria Oliveira, de 78 anos, visita com frequência o recinto, não por estar à procura de algo em concreto, mas para ver o que vai aparecendo de novo e para estar a par dos preços.

“Aqui consegue-se comprar coisas muito jeitosas e muito baratas”, contou a lisboeta, referindo que há peças de roupa por 0,50 cêntimos que estão “praticamente novas”. “É uma questão de procurar, é preciso ter olho”, afirmou.